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O Tombo do Convento da Penha – Por Norbertino Bahiense

Convento da Penha, 1951

Muito se comenta sobre o primitivo Tombo do Convento da Penha, onde muita coisa interessante deve figurar. Dele poderíamos tirar grandes e preciosas contribuições históricas e mesmo de fé. Não me foi possível, entretanto, localizá-lo, pois todos são acordes em afirmar que tão precioso livro estava no Convento, mas dali desapareceu.

Houve até quem dissesse que o Dr. Artur da Silva Bernardes, quando Presidente da República o levou na ocasião em que visitou o Convento. Isto, entretanto, não foi confirmado, conforme declarações obtidas do ilustre brasileiro, por intermédio de Monsenhor Luís Cláudio de Freitas Rosa, então deputado federal pelo Espírito Santo e ao qual foi dirigida a seguinte carta: "Vitória 16 de novembro de 1946. Meu muito prezado amigo Mons. Luís Cláudio. Os meus sinceros votos pela sua preciosa saúde e perene felicidade. Desejo um grande obséquio do meu distinto amigo. Estou escrevendo um livro histórico sobre o nosso glorioso Convento da Penha — trabalho que entendi de fazer, embora sejam limitadas e insignificantes as minhas forças e pela simples razão de não ter alguém ainda feito com exatidão e detalhes requeridos. Nas minhas pesquisas, fui informado de pessoa que o ouviu do Padre José Ludwin — de que o TOMBO DO CONVENTO DA PENHA onde existem preciosíssimos registros, — foi de lá retirado por empréstimo ou doação, pelo Exmo. Sr. Dr. Artur Bernardes quando ali esteve na ocasião em que era Presidente da República. Não sei se a informação do citado Padre é real, mas se o for, talvez o meu prezado amigo pudesse conseguir a volta desse precioso documento para o patrimônio de nosso querido Estado, depois de um entendimento com o citado Dr. Artur Bernardes. Aguardando a fineza de sua resposta, abraça-o muito cordialmente o amigo sincero

(as) Norbertino Bahiense,".

A carta acima, apresentada por Monsenhor Luís Cláudio ao Dr. Artur Bernardes foi devolvida ao autor com a seguinte declaração do próprio punho de sua Excia.:

"Padre Luís: É falso o rebate. Artur Bernardes. Rio, 19-11-46."

Monsenhor Luís Cláudio teve a bondade de acrescentar, ainda no corpo da mesma carta:

"Meu caro Bahiense. Abraço cordial. Para aproveitar o tempo que urge, aqui mesmo lhe envio a declaração assinada pelo Dr. A. Bernardes. Respeitosos cumprimentos e saudares a toda Exma. Família. Ex-corde P. L. Cláudio. Rio 19-11-46."

Em maio de 1950 Vitória recebeu a visita do consagrado engenheiro Lauro Borba. Subiu ele à Penha acompanhado do autor. Lá procurou entrevistar o franciscano que estava presente e dele ouviu, ainda na presença do autor, a declaração formal de que "os livros tombos do Convento da Penha haviam desaparecido".

Lauro Borba que além de engenheiro é também festejado jornalista, lançou o seguinte magnífico artigo que foi transcrito na "A GAZETA" de Vitória, de 17 de maio de 1950:

"O livro Tombo Convento da Penha e o Cais de Minério de Vitória. Sob o título "O brasão de uma cidade", o Diário de Pernambuco publicou um interessante artigo do renomado engenheiro patrício Dr. Lauro Borba, fixando as impressões que colheu quando de sua recente estada nesta Capital, que transcrevemos com prazer, dado o interesse que, por certo, despertará entre os nossos leitores. "VI-TÓRIA — A cidade de Vitória, Capital do Estado do Espírito Santo, vivia outrora um tanto modorrenta e contemplativa, em frente a uma paisagem impressionantemente bela. Vai tomando agora, os ares de um ambiente movimentado, agitando problemas de economia de grande transcendência. No seu ancoradouro ergue-se uma obra de técnica portuária, das mais modernas existentes no mundo. É o chamado cais de minérios. A estrada de ferro lança por um processo automático o conteúdo de trens inteiros carregados da rica pedra negra e brilhante extraída das montanhas de Itabira, sobre uma rampa rochosa que a Natureza ofereceu e o engenheiro brasileiro adaptou com a sua técnica. Deste plano inclinado a valiosa carga desliza, até alcançar o mecanismo das esteiras sem fim, por onde lançada nos porões dos navios, carregando-os assim por um sistema mecânico e rápido. O trabalho que seria de oito dias pelo processo manual de estiva, realiza-se em oito horas, com todas as economias conseqüentes do tempo de custo. A conquista deste direito de promover a exportação do minério bruto, que forma montanhas em nosso país, faz voltar agora as vistas mais atentas, para o porto de Vitória, que tende a ser o escoadouro das riquezas latentes no Brasil central. Isto será alcançado em futuro não muito remoto, através do próprio Estado do Espírito Santo e de Minas Gerais até Goiás. Em todos eles essas riquezas estão apenas à espera de iniciativas como a da Cia. Vale do Rio Doce. Na moderna Vitória há também a feição cultural, a merecer que os brasileiros em trânsito para o norte e para o sul não passem por aqui alheiados e indiferentes. Do lado tradicional existem obras no gênero desse famoso Convento da Penha por exemplo. Nesta relíquia andaram tocando em tempos, mãos profanas montando um altar mor em novo estilo, destoante do tom singelo observado em todo o restante do edifício e na sua decoração interna. Felizmente que esse notável monumento, já passou ao tombo do Serviço do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional, que cuidará, de restaurar a exata fisionomia artística original, em seus detalhes, como vem fazendo em outros casos. Talvez sejam também encontrados, os documentos contendo a história daquele feito extraordinário do franciscano Pedro Palácios, aqui aportado, nos remotos dias de 1558. Desapareceram os volumes do chamado "livro de tombo" do convento. Quem os teria levado? Bem poucos o saberão, porém não é para perder a esperança de que um dia, sejam restituídos tais documentos originais que não podem ser do domínio privado porém coletivo. Certa vez, acusaram ao Dr. Artur Bernardes de ser o autor de tamanho sacrilégio. Por isso Norbertino Bahiense, intelectual e grande estudioso da história de sua terra, aventurou-se a escrever uma carta endereçada a um amigo comum, pedindo-lhe interrogar ao ex-presidente da República, a este respeito. O Dr. Artur Bernardes escreveu do próprio punho no original da carta do Bahiense, a feição de despacho, esta sentença: "É falsa a imputação." Bahiense guarda o original e pelo seu grande amor à terra natal, é de crer, prossiga na sua nobre tentativa de descobrir o esconderijo do precioso acervo. No dia em que o encontrar, de certo fará o que esteja ao seu alcance, para lhe dar o melhor destino que seria entregá-lo ao Serviço do Patrimônio, pondo-o assim em abrigo seguro, sob a guarda fiel de Rodrigo Melo Franco. Vale confiar em que o tempo, a pertinácia de Norbertino Bahiense e o reconhecimento de um elementar dever de brasilidade, por parte do detentor da documentação do convento da Penha, talvez realizem o milagre de sua restituição. Aquilo é o brasão da primitiva Vila Velha desdobrada em Vitória atual e não pode continuar oculto, segregado."

Mas, não descansei nas perquirições à procura do afamado TOMBO.

Relendo "PÁGINAS DE HISTÓRIA FRANCISCANA NO BRASIL", de Frei Basílio Rower, verifiquei, em diversas páginas citações sobre o Tombo e pressurosamente lhe dirigi a carta que se segue:

"Vitória, 20 de dezembro de 1950. Exmo. Sr. Frei Basílio Rower (Convento de Santo Antônio) Largo da Carioca — Rio de Janeiro — Não sei se o sr. se recorda de uma carta que lhe dirigi em 16 de janeiro de 1947 e da resposta gentil que teve a bondade de me mandar em sua carta de 29 do mesmo mês, sobre o CONVENTO DA PENHA. Sou membro do Instituto Histórico do Espírito Santo e de outras instituições congêneres e declino esta qualidade unicamente pelo fato de me justificar como pesquisador perseverante das cousas históricas, principalmente as que dizem respeito ao Espírito Santo. A história do Convento da Penha continua me interessando vivamente. Há umi ponto controverso e para o qual novamente recorro à sua bondade. Gira em torno do TOMBO DO CONVENTO. Em sua carta acima citada, o Sr. diz: "desejava muito saber onde pararam os Tombos tanto do Convento da Vitória como o da Penha." Acontece que, no seu magnífico livro "Páginas de História Franciscana no Brasil" o Sr. cita esse Tombo diversas vezes nas páginas 246 — nota 42 e nas páginas seguintes, notas 43, 57, 61, 68, 80, 82, 89, 94, 106 e 107 na página 274. — Diante de tais citações, concluí estar esse Tombo aí no Convento de Santo Antônio em face da sua seguinte afirmativa, à página 232 do referido livro: "É o que pretendemos fazer neste estudo, e para isto nos valemos não somente das publicações já feitas por outros, aproveitando o que parece histórico, mas principalmente do resultado das investigações que fizemos no arquivo da nossa antiga Província, conservado no Convento de St. Antônio do Rio de Janeiro. Demoradamente examinamos os seus livros manuscritos, documemtos avulsos e alfarrábios quase ilegíveis". Não vejo pois como explicar esse ponto controverso e por esse motivo lhe venho pedir a fineza de me esclarecer onde está o Tombo a que se refere nas mencionadas notas do seu livro ou pelo menos onde estava na ocasião em que as colheu. Sirvo-me do ensejo para lhe desejar um Feliz Natal e Ano Novo. Aguardando a fineza de sua resposta, proverbialmente fidalga e gentil, subscrevo-me atenciosamente (as) Norbertino Bahiense."

A resposta veio rápida, mas, infelizmente não nos levou à preciosa fonte que tanto procuramos:

Ei-la:

 "Rio de Janeiro, 2-1-51. Ilmo. Senhor Norbertino Bahiense voltando do interior, encontrei sua carta de 20 de dezembro . Quem me dera ter ainda o prazer de ver os Tombos dos Conventos de Vitória e Penha. Infelizmente nem vestígio até hoje. A resposta a sua pergunta é mui simples. Veja bem nas notas que cita. Todas se referem ao Tombo Geral da Província (Tombo G.) Confira pág. 9, onde indiquei o modo de citar. A sua carta me deu grande satisfação, porque vejo que ainda há outros que fazem pesquisas com relação ao Convento da Penha. Quem sabe se com o tempo descobrir alguma coisa nova. Sempre às ordens servo em N. Senhor (as) Frei Basílio, ofm."

Não sendo possível o autor manusear o antigo Livro Tombo onde muita cousa preciosa deve estar registrada, teve que se limitar aos próprios e restritos limites das raras fontes encontradas. Muitas delas foram pacientes e perseverantemente colhidas, em diversas visitas feitas, no próprio Convento e isto de há muito tempo. Não raramente, quando reiniciava suas notas, já não mais encontrava os primeiros originais das primeiras, principalmente quando as visitas eram mais espaçadas.

Mas.... o que conseguiu reunir, aí está. E como está, assim ficará. É modesta contribuição que deixa aos pósteros. Um ensaio do qual poderão partir historiadores outros que, dispondo de melhores fontes, e de maiores recursos, possam melhor desenvolver e ampliar essa palpitante e rica História que é a História do Convento da Penha.

 

Fonte: O Convento da Penha, um templo histórico, tradicional e famoso 1534 a 1951
Autor: Norbertino Bahiense
Compilação: Walter de Aguiar Filho, abril/2018

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