Morro do Moreno: Desde 1535
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Perlustrando a costa - Limites com a capitania de S. Tomé

Mapa do Cabo de S. Tomé até ao Morro do João Moreno

A costa, entretanto, era mais acessível e foi para ela que se voltaram, percorrendo-a de norte a sul. Deviam conhecê-la mais ou menos bem os homens de Vasco Coutinho, pois já em 1539 (catorze de agosto) este passará um assinado a Pero de Góis – donatário de São Tomé – demarcando limites entre as duas capitanias.

Por esse documento ficamos sabendo dos grandes auxílios em “escravos e outras boas obras” por ele trazidos a Fernandes Coutinho. Reconhecido a quem o ajudara e socorrera na hora do perigo, Vasco Coutinho não esqueceu de citar os favores, acrescentando que fora graças a eles que “depois de Deos a minha Capitania se sustivesse”.(3)

Atribuladíssimos os dias do primeiro donatário do Espírito Santo no Brasil. Tudo o que dele nos ficou recorda sacrifícios, renúncias, amarguras.

Algumas valiosas indicações estão contidas na carta régia de doze de março de 1543, em cujo texto foi inserto o assinado a Pero de Góis.

Assentaram os dois capitães em que o rio por eles batizado de Santa Catarina, e pelos índios denominado Tapinarym, fosse o limite entre as suas donatarias.

“Obra de duas legoas pouco mais ou menos” da foz, Vasco Coutinho possuía uma propriedade de nome Aguapé.(4) Seria uma das quatro ou cinco partes em que se deveriam dividir as dez léguas dadas pelo rei ao donatário “em propriedade plena, imediata e pessoal”.(5)

Detalhe “sui generis” das doações

É oportuno lembrar que, não obstante a carta de doação dizer: “hei por bem e me apraz de lhe fazer, como de feito por esta presente carta faço, mercê e irrevogavel doação entre vivos, valedoura deste dia para todo o sempre, de juro e de herdade, para elle e todos os seus filhos, netos, herdeiros e sucessores, que após elle vierem, assim descendentes como transversaes, e collateraes, de cincoenta leguas de terra na dita costa do Brasil”, o soberano não estava doando a terra e, sim, “o benefício, o usufruto dela somente”.(6) O monarca não doava a propriedade plena da terra; apenas aquelas dez léguas particularizadas na carta.

Delegado do rei, ocupante das terras, o donatário, no entanto, não era um funcionário da Coroa e nada tinha a ver com o andamento das ordens régias no Brasil.(7)

Vasco Coutinho e Pero de Góis 

O assinado, na sua linguagem rude e mal ataviada, é uma página que fala eloquentemente dos caracteres de Coutinho e Góis. São dois chefes desprendidos, dois amigos corretos que, naquele documento, se dirigem à posteridade, expondo seus sacrifícios, auxílios, gratidão, e por fim, como vassalos leais, pedem ao seu rei que “aja a dita demarcaçam por boa”. Embora subscrito apenas por Vasco Coutinho, o assinado é, de qualquer maneira, o resultado de entendimentos havidos entre ambos os donatários e assim deve ser compreendido.(8)

 

NOTAS

(3) - Carta de confirmação da demarcação das Capitanias de Pero de Góis e de Vasco Fernandes Coutinho – Arquivo da Torre do Tombo, Chancelaria de D. João III, liv. 6, p. 51-v. (apud MALHEIRO, Regimen Feudal, 264-5).

(4) - Ver foot-note n.º 3, deste capítulo.

(5) - LISBOA, Obras, II, 134.

– Comentando o emprego da expressão “propriedade pessoal”, ROCHA POMBO assim se expressou: “Entender-se-á no sentido de ligada à pessoa do donatário. Pois logo abaixo se diz que mesmo estas terras passarão sempre ao sucessor da capitania... É claro, portanto, que o donatário não podia alienar tais terras. Sendo assim, como eram propriedade plena? Não sendo propriedade plena – com que fim se discriminavam da capitania essas terras? A vinculação das mesmas aos herdeiros da capitania é contraditória com a disposição que estabelece a plenitude jurídica da propriedade. É evidente, afinal, que mesmo essas terras não ficavam pertencendo de pleno direito à pessoa do donatário: deve entender-se que só essas dez ou dezesseis léguas podiam ser lavradas de conta do capitão ou por ele aforadas em seu proveito, devendo distribuir as demais pelos colonos que as requeressem” (HB, III, 135, nota).

(6) - ROCHA POMBO, HB, III, 134-5.

(7) - MARCHANT, Do Escambo, 77-8.

(8) - Ver foot-note n.º 3, deste capítulo.

 

Fonte: História do Estado do Espírito Santo, 3ª edição, Vitória (APEES) - Arquivo Público do Estado do Espírito Santo – Secretaria de Cultura, 2008
Autor: José Teixeira de Oliveira
Compilação: Walter Aguiar Filho, julho/2018



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