Em busca do mar
Livro:
Retratos Coloridos
Autora: Eny Botelho Baptista
Chegar
à Praia da Costa lá pelos idos dos anos 40 e
50, saindo de Vila Velha, sede, teria que se enfrentar uma
longa caminhada difícil, ao mesmo tempo, prazerosa
e cheia de encanto.
No início, trilhas entre ricos manguezais. Depois as
passagens iam se alargando e se defrontava com extenso areal
branco, deixando para trás a umidade, o “habitat”
dos crustáceos e a vegetação característica
dos mangues. A paisagem mudava inesperadamente, e em meio
àquela aridez, cajueiros, araçazeiros e pitangueiras,
vicejando em terra seca, até chegar à beira
da praia e avistar o imenso mar azul.
Outra opção seria a estrada de barro, hoje Avenida
Champagnat. Esta se iniciava após a travessia de uma
bela ponte sobre o Rio da Costa, cujas águas corriam
próximas às terras dos Maristas, antigo Sítio
do Batalha. A fim de corrigir alagamentos, que aconteciam
na cidade, em ocasião de enchentes, o rio foi desviado
do seu curso normal perdendo seu aspecto natural, sua beleza
e, até mesmo, a sua identidade. Agora, a ponte, o rio,
só na lembrança, em fotos ou na história.
Todas essas caminhadas, em trilhas ou estrada eram feitas
em grupo, formado de adultos, crianças e, quase sempre,
de um cãozinho amigo que acompanhava o seu dono.
Pés descalços, muita alegria no coração
e em bando, qual pássaros migratórios, em busca
do oásis, o mar.
No caminho, o encontro com a boiada causava grande rebuliço.
Poucos eram acostumados com essas cenas rurais.
Ventania repentina, chuva de areia, chapéus voando,
correrias, pisadas de mau jeito, tudo superado com brincadeiras
e muitos risos.
Chegando à praia o entusiasmo e o ânimo aumentavam,
à medida que se dava continuidade aos inúmeros
folguedos.
Nos banhos de mar, usava-se bóias de cortiça,
atadas à cintura, para maior segurança. Câmaras
de ar de carro, preta ou vermelha, para mil e uma estripulias
na água.
O bronzeamento da pele, acontecia normalmente, sem muitos
cuidados de acordo com a ação da melanina de
cada um. Sem bronzeadores ou filtros solares.
Na falta de vendedores ambulantes, levava-se frutas, dos próprios
quintais ou colhidas ao longo do caminho. Também deliciosos
pãezinhos, com manteiga, torrados ao sol, bem apreciados
pela garotada.
A praia, na época, era cheia de conchas, de vários
formatos. Ariscos e velozes tatuís, berbigões
triangulares, em lindos tons rajados, apareciam no vaivém
das ondas, denunciando o seu esconderijo, fazendo furinhos
na areia molhada, facilitando, deste modo, a captura pelos
pescadores mirins.
Ao longe, no mar, via-se enormes botos cinzas, dando pulos
ritmados. Um espetáculo impressionante para os banhistas.
À beira da praia, a vegetação rasteira,
poucas casas de moradores fixos ou de veranistas; muitos terrenos
particulares cercados e transporte coletivo, bons momentos
e o tempo passava, sem se dar conta. Já era a hora
do retorno, após tantas travessuras.
Uma longa estrada pela frente. Parecia interminável...
Bastavam os primeiros passos para se sentir novamente a mesma
coragem, o mesmo ânimo e a mesma alegria.
E no final da jornada, quase chegando em Vila Velha (centro),
ainda se podia apreciar meninos afoitos e levados, saltando
da ponte sobre o Rio da Costa. Mergulhando ou nadando a fim
de tirar o sal do mar, na água doce daquele rio.
Em casa, depois de saborear um delicioso almoço, só
restavam a tarde, a noite, o amanhecer de um novo dia e repetir
a mesma dose até que as férias e o verão
terminassem.
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