Vitória em 1700
Fonte:
A GAZETA
Com
a sua vocação marítima sufocada, já
que navios de grande porte não paravam mais aqui segundo
ordens da coroa portuguesa, chegou a vez de a Companhia de
Jesus abandonar a cidade, criando um vácuo no sistema
educacional. Em 1759, o Marquês de Pombal decide expulsar
todos os jesuítas de Portugal e de suas colônias.
O Colégio dos Jesuítas e a Igreja de São
Tiago (futuro Palácio Anchieta) são abandonados
pelos religiosos e passam a pertencer à Coroa, assim
como toda a estrutura construída por esses padres ao
longo do Espírito Santo, incluindo fazendas, engenhos
de açúcar, colégios e aldeamentos indígenas.
O século XVIII não foi um período próspero
nem para o Espírito Santo, nem para a cidade de Vitória.
As crônicas da época registram até um
terremoto: foi no dia 1º de agosto de 1767, às
oito horas da noite. Todavia, não causou prejuízo.
Somente um grande susto.
Caminhar pela Vitória setecentista significava se deparar
com ruas tortuosas, estreitas, sem pavimentação.
Esgoto e tratamento sanitário eram algo impensável,
inimaginável. Além disso, uma profusão
de animais domésticos viviam soltos.
O abastecimento de água nas casas era feito no ombro
dos escravos. Fonte Grande e Fonte Capixaba eram as maiores
fontes abastecedoras. O Convento de São Francisco tinha
água corrente por causa de um aqueduto, que trazia
o líquido da Fonte Grande. Era a única construção
da cidade com esse privilégio. As demais casas contavam
com poços em seus quintais.
Quem cainhasse à noite, contava com a iluminação
da lua e das estrelas ou com a luz fraca de lâmpadas
a óleo de mamona ou azeite de peixe. As lamparinas
ficavam em lugares estratégicos: pórticos de
conventos e igrejas, nichos de imagens de santos (feitos por
devotos) ou nos portões do forte à beira-mar.
Nesse cenário de estagnação econômica,
a população cresce. Chegamos a 1790 com 7.225
habitantes, dos quais 4.898 escravos negros. A força
negra se fez sentir quando em 1765 eles se organizaram numa
Irmandade e reivindicaram ao bispo da Bahia (a quem o Espírito
Santo devia obediência) licença para construir
a Igreja de Nossa Senhora do Rosário. Além de
Nossa Senhora, queriam um local para louvar São Benedito,
o santo negro.
O fervor do povo da época em torno do santo promove
uma “guerra santa” entre dois grupos de religiosos
e fiéis: os caramurus e os peroás. Isso já
em 1832. A disputa acontecia porque a imagem de São
Benedito estava no Convento de São Francisco, local
de preferência dos ditos caramurus. Os peroás,
formados na sua maioria por escravos e mestiços, queriam
o santo na Igreja do Rosário. Das provocações
partiram para a ação. Certo dia, São
Benedito sumiu do convento e apareceu na igrejinha branca.
A imagem foi recebida com festas e grandes procissões.
Os devotos do São Francisco não ficaram atrás.
Conseguiram outra imagem e faziam demonstrações
de fé com mais festividades do que os do Rosário.
A disputa passava pelos enfeites usados nas respectivas missas,
chegando aos cânticos que cada grupo fazia em homenagem
a São Benedito e até mesmo nas procissões.
A Ilha teve duas procissões diferentes para o mesmo
santo.
Enfim,
um acontecimento para distrair a população numa
cidade em que a Coroa Portuguesa fazia questão que
fosse esquecida e deixada de lado.
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