Panela de Barro
Fonte:
www.ceramicanorio.com
Texto e Fotos: Renato Wandeck
Paneleiras
de Goiabeiras
As
Paneleiras de Goiabeiras, assim chamadas por ser a maioria
das artesãs mulheres, residem no bairro de Goiabeiras,
em Vitória, capital do Estado do Espírito Santo.
Com
competência confeccionam, em barro, panelas, potes,
travessas, bules, caldeirões, frigideiras etc, de diversas
formas e tamanhos. O processo de fabricação
é praticamente o mesmo que os índios usavam
quando aqui aportaram os portugueses na época do descobrimento.
O
ensinamento, transmitido de pais para filhos, permite que
a identidade cultural desta atividade seja mantida com muito
poucas alterações, há várias gerações.
São avós, mães, filhas e netas exercendo
o mesmo ofício.
Anteriormente,
as Paneleiras trabalhavam individualmente em suas próprias
casas. Atualmente, mais organizadas, estão agrupadas
na Associação das Paneleiras de Goiabeiras,
uma espécie de cooperativa.
Trata-se de um galpão onde cada uma, independentemente,
produz e comercializa suas próprias peças. Sob
o aspecto econômico, a renda que auferem, é significativa
no contexto da manutenção de suas famílias.
A
Associação já se tornou um dos pontos
turísticos da cidade, sendo visitada, regularmente,
por turistas interessados em adquirir as peças e ver
como as mesmas são confeccionadas.
No futuro pretendem as Paneleiras expandir as instalações
montando, inclusive, um restaurante de pratos típicos
capixabas.
A
principal matéria prima, o barro, é extraído
na própria região, em jazidas do Vale do Mulembá.
A argila, antes de ser usada, passa por um processo para "limpar"
denominado "escolha", que consiste na retirada de
impurezas, como pedras e restos de vegetais. Em seguida, devidamente
envolta em plástico para manter a umidade, fica armazenada,
descansando, por uns tempos antes de ser usada.
Esta
pesada tarefa, que antes era feita pelas mulheres, é
atualmente mais realizada pelos homens, que o fazem amassando
o barro com os pés, pisando repetidas vezes, até
torná-lo uniforme, consistente e com a plasticidade
adequada.
A
modelagem das panelas é feita manualmente, sem o uso
do torno de oleiro. A parede vai sendo levantada, com a forma
desejada, usando-se a técnica de roletes ou diretamente,
escavando a "bola" de argila, "puxando a panela",
como dizem, através de movimentos com as mãos,
tanto circulares como verticais, abaulando, arredondando,
definindo o formato da peça com a ajuda de rudimentares
ferramentas-pedras lisas, cascas de coco, coité (pedaço
de cabaça), e objetos similares.
Certamente
a característica mais marcante das panelas é
a sua coloração escura. Isto é obtido
por meio da impregnação da peça com tanino,
existente na árvore do mangue-vermelho-"rhizophora
mangle". Usa-se sua casca que é retirada do tronco
batendo-se fortemente com um porrete de madeira. As lascas
assim obtidas são picadas e colocadas de molho, em
água doce, para curtir por três dias, no mínimo.
Salientamos que esta prática na região não
é predatória, havendo uma clara consciência
de preservação por parte dos "casqueiros".
Neste sentido só retiram a casca de um dos lados do
tronco, em pouca quantidade, procedimento que não prejudica
a árvore e o ecossistema do manguezal.
A
aplicação do tanino nas panelas é feita
batendo-se, vigorosamente, com uma vassourinha embebida com
o mesmo, na peça ainda quente, imediatamente após
ter saído do fogo. Este processo de impregnação
é conhecido como "açoite". Como resultado,
o tanino penetra nos poros da cerâmica, cobrindo fissuras
e tornando-a impermeável, servindo também para
impedir a proliferação de fungos, que, com o
correr do tempo, esfarelam o barro. Observe-se
que a coloração escura da panela permite uma
melhor concentração do calor, facilitando o
cozimento e a conservação dos alimentos.
As
panelas, depois de modeladas, ficam em lugar ventilado e protegido
do sol até secarem completamente. Só após
é efetuada a queima, não em forno, mas em fogueiras
a céu aberto. (método bastante primitivo adotado
por tribos indígenas).
O
processo consiste em empilhar as panelas sobre grossas toras
de madeiras, formando o que chamam de "cama", para
permitir, deste modo, a circulação do ar pela
parte inferior. Nas laterais e em cima, são colocados
pedaços menores de madeira.
O fogo é ateado em uma das extremidades, na "cabeceira
da cama", que com a ajuda da ventilação
natural se expande por todo o conjunto.
Dependendo do número de peças, o cozimento pode
durar uma ou muito mais horas.
Digno
de nota é o fato da queima ser ecologicamente correta,
já que não desmata árvores da região.
Para fazer o fogo usam-se restos de madeiras, principalmente
da construção civil. Apesar deste tipo de madeira
nem sempre possuir o melhor poder calorífico, o resultado
final é satisfatório desde que o calor produzido
seja intenso, uniforme e dure o tempo necessário.
Para
facilitar o armazenamento, são feitas panelas grandes,
que são chamadas de mães, e pequenas, de filhas.
Acondicionam as pequenas, dentro das grandes, formando uma
"casada". Alguns modelos possuem asas, chamadas
de "orelhas", que facilitam o manuseio entre o fogão
e a mesa. Usa-se também apoiar as panelas em armações
de ferro, quando levadas à mesa.
O
mais famoso prato da cozinha capixaba é a moqueca,
de peixe e camarão, que sempre é servida com
o acompanhamento de arroz, pirão e molho. Dentre os
ingredientes, não podem faltar, além do pescado,
o coentro, a cebola, cebolinha, pimenta, limão, alho,
azeite de oliva, óleo, e urucum (colorau).
Outro
prato muito apreciado é a torta feita com caranguejo
e siri picado, ostra, sururu, peixe, camarão, ovo,
palmito natural, tudo temperado com coentro, alho, cebola,
tomate, pimenta, sal e azeite.
A
culinária capixaba é fruto da miscigenação,
indígena/africana/portuguesa, principais etnias que
ocuparam a região. É uma cozinha com perfil
bem brasileiro.
É
voz corrente que a moqueca e a torta capixaba ficam com melhor
sabor quando feitas e servidas em panelas de barro. Costuma-se
dizer: "moqueca, só capixaba, o resto é
peixada". De fato é maravilhoso ver as postas
de peixe assentadas no caldo, borbulhante, de cor vermelho-alaranjada,
com pedaços de tomate e cebola, salpicado de coentro.
As
panelas, caldeirões, frigideiras, feitas em Goiabeiras,
vão direto ao fogo. No entanto, antes do primeiro uso,
devem ser untadas com óleo e deixadas queimar até
secar. Após esta preparação, estarão
prontas para o uso.
Para
se ter a exata dimensão da importância desta
atividade cultural, foi aprovado pelo IPHAN (Instituto do
Patrimônio Histórico e Artístico Nacional),
em reunião de 21/11/02, o
registro do ofício das Paneleiras de Goiabeiras
para ser inscrito no Livro de Registro dos Saberes e declarado
Patrimônio Cultural do Brasil.
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O
telefone da Associação das Paneleiras de Goiabeiras
é:
(27) 3327-0519.
Endereço:
Rua das Paneleiras 55-Goiabeiras
Vitória-ES
CEP 29075-105
Email: paneleirasdegoiabeiras@hotmail.com
Comprando-se
diretamente das artesãs garante-se a qualidade e a
autenticidade do produto.
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