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A difícil arte de escrever fácil

Rubem Braga na FEB, 1944

Rubem Braga tinha um estilo simples e coloquial. A prosa era concisa e poética, acima de tudo. Com apenas 22 anos, Rubem Braga publicou o seu primeiro livro. O ano era 1936. A obra de estreia, “O Conde e o Passarinho”, revela um amadurecimento precoce do cronista e características que norteariam sua produção literária ao longo dos próximos 50 anos: o humor cáustico e o lirismo na abordagem de temas cotidianos.

O cachoeirense tornou-se, então, o único escritor a conquistar um lugar de destaque na literatura, exclusivamente como cronista. Escreveu para diversos jornais e revistas, abordando assuntos do dia-a-dia, tratando de si mesmo e de seu vasto repertório memorialístico de Cachoeiro de Itapemirim, incluindo aí histórias da infância, os primeiros amores, observações sobre a natureza.

Rubem Braga escrevia de forma simples, coloquial. O que não quer dizer fácil e banal. Pelo contrário, sua prosa é elaborada, concisa e poética acima de tudo.

A fluidez de seus textos é resultado de um agudo senso de observação, habilidade essencial ao jornalista que sempre foi. E traço particular de um ser humano que via o mundo com muita clareza e autenticidade.

Quem o conheceu atesta que a sinceridade era uma marca pessoal, assim como o temperamento introspectivo. Uma franqueza típica de gente simples, pouco afeita a hipocrisias. De acordo com o crítico Afrânio Coutinho, a marca registrada dos textos de Rubem Braga é a “crônica poética, na qual alia um estilo próprio a um intenso lirismo, provocado pelos acontecimentos cotidianos, pelas paisagens, pelos estados de alma, pelas pessoas, pela natureza.”

Rubem Braga não gostava de discussões teóricas sobre literatura. Sabe-se que na juventude leu Anatole France, Eça de Queiroz e Machado de Assis.

Numa descrição de si mesmo, feita a pedido do amigo Fernando Sabino, disse o seguinte: “Sempre escrevi para ser publicado no dia seguinte. Como o marido que tem que dormir com a esposa: pode estar achando gostoso, mas é uma obrigação. Sou uma máquina de escrever com algum uso, mas em bom estado de funcionamento”.

A obra de Rubem Braga é constituída de coletâneas de crônicas, primeiramente publicadas em jornais e revistas de grande circulação e, posteriormente, reunidas em livros. São mais de 15 mil textos que falam de lembranças da infância, dos tempos da guerra, da natureza e com muita frequência de mulheres, uma de suas paixões.

Ainda no início da carreira, cobriu a Revolução Constitucionalista de 1932, em Belho Horizonte. Doze anos depois voltou a um campo de batalha, mas dessa vez na Europa. Rubem Braga foi correspondente de guerra, acompanhando a Força Expedicionária Brasileira (FEB) em luta contra as tropas fascistas na Itália. “Guerra é coisa triste”, concluiu. E com uma pitada de humor, acrescentou: “Brincadeira de homem. Só tem homem lá”.

Muito antes de a palavra ecologia virar moda ou da onda do politicamente correto, Rubem Braga já externava preocupação com o meio ambiente, em especial com o risco de redução da oferta de água. Não por acaso cultivou sólida amizade com o também capixaba Augusto Ruschi, outro precursor da causa ambiental.

Além de tratar do assunto com frequência em suas crônicas, Rubem Braga adotou uma atitude prática. Transformou a cobertura em que vivia, em Ipanema, no Rio de Janeiro, numa espécie de quintal suspenso.

Na famosa cobertura da Rua Barão da Torre, além de jardim e horta, cultivava um pomar. Havia lá goiabeiras, jabuticabeiras, amoreiras, pitangueiras. Vez por outra dividia a colheita com os amigos. Ganhou do poeta e cronista Paulo Mendes Campos o apelido de “fazendeiro do ar”.

Numa crônica de 1958, Rubem Braga relata que andou lendo livros sobre pavões e neles descobriu que “aquelas cores todas não existem na pena do pavão. Não há pigmentos. O que há são minúsculas bolhas d’água em que a luz se fragmenta, como em um prisma. O pavão é um arco-íris de plumas”.

E conclui: “Eu considerei que esse é o luxo de grande artista, atingir o máximo de matizes com o mínimo de elementos. De água e luz ele faz seu esplendor; seu grande mistério é a simplicidade”.

Para a professora de Literatura Brasileira do Centro Universitário São Camilo-ES, em Cachoeiro de Itapemirim, esse é o mais belo texto de Rubem Braga, no qual é conciso e poético, na medida exata. “Atinge, portanto, a essência da crônica, a poetização do instante”, diz.

 

Fonte: Caderno especial de A Gazeta: Bienal Rubem Braga, de 27/05/2006
Compilação: Walter de Aguiar Filho, agosto/2012 

 

Literatura e Crônicas

Ainda há sol, ainda há mar - Por Rubem Braga

Ainda há sol, ainda há mar - Por Rubem Braga

Dezembro, 1999 (um ano antes da morte do cronista). Publicado no livro “Um Cartão de Paris”

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