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A natureza na corda bamba - Parque Estadual Paulo Cesar Vinha

Com criação do parque estadual de Setiba, o Governo do Estado garantirá à população da Grande Vitória, Guarapari e do Espírito Santo de uma forma geral, usufruir de um patrimônio natural incomparável cujo valor transcende uma avaliação meramente imediatis

“O Parque Estadual é uma área de domínio público estadual, delimitada por atributos excepcionais da Natureza a serem preservados permanentemente, que está submetida a regime jurídico de inalienabilidade e indisponibilidade em seus limites, de modo a conciliar harmonicamente os usos científico, educativo em recreativo, com a preservação integral, e perene do patrimônio natural". Cadernos Feema, 1978.

A questão do meio ambiente, assunto que até há bem pouco tempo não preocupava a administração pública, os setores produtivos e a população brasileira de um modo geral, vem, nos últimos anos, sendo cada vez mais discutida por todos os setores da sociedade, devido à situação de precariedade em que se encontra a qualidade de vida das populações urbana e a devastação assustadoramente crescentes das nossas florestas primitivas, conseqüência de um péssimo planejamento e usos de nossos recursos naturais.

Nos países desenvolvidos não há perspectiva de crescimento econômico sem antes se considerar as possíveis consequências ao meio ambiente, e todas as florestas são entendidas como patrimônio, devendo primeiro servir de suporte básico ao equilíbrio do meio ambiente e não como empecilho ao uso e ocupação das terras, que é o que vem acontecendo no Brasil.

No Espírito Santo, onde nos últimos anos foi acelerado o processo de devastação, encontramos pouco mais de 3% da área total do estado coberto por florestas primitivas.

Ao longo do litoral capixaba, área de irresistível vocação turística, devido à expansão das áreas urbanas provocados pelo boom da especulação imobiliária, em meados da década de setenta principalmente, restam pequenos testemunhos dos vários tipos de florestas nativas que originalmente dominavam a paisagem.

As florestas de restinga existentes na bacia hidrográfica da lagoa de Setiba, localizada entre Ponta da Fruta, no município de Vila Velha e Setiba, no município de Guarapari, constituem-se juntamente com as Dunas do Ulé e as Lagoas Vermelha e Feia, o patrimônio natural litorâneo mais representativo num raio de 100km de Vitória, e talvez de todo o estado, devido às excepcionais condições em que se encontram praticamente toda a vegetação natural da área da bacia. De fato, analizando-se a faixa litorânea de quase 200 Km onde se insere a capital do estado, limitada pelo monte Aghá ao sul e Reserva de Comboios ao norte, verificamos o seu comprometimento quase total na forma de loteamento, implantados ou não. Além disso não se encontram mais remanescentes florestais, de expressividade comparável às florestas de restinga existentes entre Ponta da Fruta e Setiba.

Faz-se, hoje, necessário e urgente o entendimento por parte dos órgãos públicos competentes e da comunidade capixaba em geral da importância da preservação da área. Isto, porque nos últimos meses as florestas e planícies de inundação vêm sofrendo intervenção tais como: implantação de estradas de acesso à praia, desmatamentos, queimadas, implantação de loteamento etc..., que podem comprometer o delicado equilíbrio natural existente entre os ambientes que compõem o universo da bacia hidrográfica, que se configura como a última área de grande porte onde são suficientemente representativas as diferentes formas de florestas de restingas.

Além do que, as lagoas de Setiba, Vermelha e Feia são muito procuradas pela população nos fins de serrana, desempenhando já um papel importante como opção de lazer, devendo ser melhor explorado todo o potencial do restante da área da bacia como os passeios às florestas e às dunas.

A bacia hidrográfica, a interligação das lagoas Vermelha, Feia e de Setiba através da planície de inundação, as dunas, as florestas ... - A bacia hidrográfica da lagoa de Setiba apresenta as seguintes dimensões aproximadas: extensão de 11 km no sentido norte-sul e largura média de 1,5 Km, ao longo da costa, limitada a leste pelo cordão natural de dunas junto a praia e a oeste pela Rodovia do Sol, que foi implantada, aproximadamente, sobre os divisores naturais que separam as águas da bacia da lagoa de Setiba das águas da bacia vizinha do rio Una. Ao norte é limitada pela urbanização parcial do loteamento Cidade do Sol e ao sul pelos pequenos morros e afloramentos rochosos já próximos a praia de Setiba. A área da bacia pode ser visualizada na figura abaixo, bem como a área ocupada pela planície de inundação e as diversas formas de florestas de restingas existentes. Trata-se de uma pequena bacia litorânea de aproximadamente 1480 ha, onde os divisores de águas não são topograficamente marcantes ou acidentados, pois se situam sobre terrenos de relevo plano ou suave ondulado, característicos dos solos altos de restinga.

As dunas e os solos altos de restinga interiores circundam uma grande planície de inundação, onde ocorrem solos de turfeiras, solos arenosos alagados e alagáveis e também as lagoas Vermelha, Feia e de Setiba. Essa planície, com seus diversos tipos de vegetação, constitui-se, na realidade, num grande afloramento do lençol freático, onde despontam as lagoas Vermelha e Feia nas cabeceiras norte, que juntamente com as águas vindas das áreas alagadas e alagáveis ao sul, alimentam continuamente as águas da lagoa de Setiba. Todo o escoamento na área da planície de inundação é superficial, só assumindo um leito bem definido nas proximidade da lagoa. Periodicamente as águas da lagoa de Setiba são invadidas pelas águas do mar nas preamares mais altas, demonstrando delicado equilíbrio hídrico existente entre o mar e a lagoa, e proporcionando a existência da grande diversidade da flora e fauna locais.

O conjunto de áreas alagáveis e alagadas que integram a planície de inundação, juntamente com as lagoas, representam 50% da área da bacia sendo fundamental a preservação de todos os diferentes tipo de vegetação que lá habitam para que seja mantido o notável equilíbrio natural da região.

O assédio frequente da lagoa de Setiba pelas águas do mar faz com que suas águas sejam salobras e o grau de salinidade, varie conforme o nível da lagoa e amplitude das marés. A lagoa ocupa uma área aproximada de 16ha quando cheia, deixando à mostra nas ocasiões em que está vazia, pequena: ilhas, bancos de areia e também suas margens, rasas e planas. As águas, de cor vermelha, se assemelham às águas das lagoa: Vermelha e Feia, devido à natureza dos depósitos de matéria orgânica que caracterizam os solos de turfeiras, predominantes na planície de inundação. As lagoas Vermelha e Feia são mais profundas, de água doce, e os espelhos d'água medem: 2,8 ha e 2,4 ha respectivamente. Juntamente como as dunas de Itaúnas distantes 270 km ao norte de Vitória, as dunas de Ulé constituem-se nos últimos testemunhos desse tipo de formação no litoral capixaba. As dunas se estendem por aproximadamente 2 Km de extensão, ao longo da faixa de restinga litorânea de 200 m de largura média, protegendo toda a planície da inundação anteriormente descrita. Situam-se nos limites norte da área da bacia e apresentam-se como elevações alongadas contínuas de até 15m de altura, onde habita a vegetação típica de ação fixadora e estabilizadora. De uma forma geral, na face leste, são desprovidas de vegetação ou parcialmente cobertas por gramíneas nativas. Na face oeste habita uma vegetação densa, arbustiva, até encontrar os solos de relevo plano, onde se encontra a vegetação de restinga de porte arbóreo. Indo-se em direção ao sul, as dunas apresentam menor porte com vegetação semelhante, como protegendo as áreas interiores da ação do mar e do vento diminuindo de tamanho até chegar a forma quase imperceptível na pedra de Setiba, onde se abriga a lagoa de mesmo nome.

Caminhando pela estrada que liga a Rodovia do Sol à praia de Setiba, ao sul da lagoa de Setiba, pode-se observar os diferentes tipos de florestas e matas de restinga, que apresentam características específicas conforme a distância em relação à praia ou profundidade do lençol freático. Indo-se da praia em direção à Rodovia do Sol, encontra-se uma faixa de largura variável entre 20 e 60m habitada por gramíneas, guriris e pitangueiras, evoluindo para uma vegetação de restinga de porte arbustivo, imediatamente vizinha a mata alta de restinga, que se consolida a partir de 100 m, com a presença de árvores de até 12 m de altura, mais frequentes à medida em que se afasta da praia em direção ao interior. Distante 700 m da praia, iniciam-se os terrenos arenosos alagadiços, de cota, 4 ou 5 m abaixo dos terrenos altos onde habita a floresta úmida de restinga, sendo frequente a presença de árvores de mais de 20 m de altura. Logo após a faixa úmida, que nesse caso tem apenas 200 m, encontram-se novamente os terrenos altos de restinga onde habita um tipo de vegetação conhecida como restinga em mosaico, que pode ser apreciada ao longo de toda Rodovia do Sol.

As intervenções ocorridas na área da bacia - praticamente toda a vegetação da área da bacia encontra-se sob sua forma primitiva, ainda intocada. As poucas intervenções que ocorreram até os dias de hoje não comprometem a preservação da área como um todo. Dentre as mais significativas estão:

• Rodovia do Sol - Por ter seu traçado quase que acompanhando os divisores naturais de águas dos limites oeste da bacia, sua implantação não representou prejuízo às condições naturais da bacia, a não ser nas proximidades da lagoa Vermelha, onde foi isolada uma pequena área de contribuição, já aterrada e integrada à nova bacia vizinha.

• A urbanização parcial do loteamento Cidade do Sol - A implantação das ruas modificou os limites naturais norte da área da bacia, assim como alertou os limites municipais entre Vila Velha e Guarapari, definidos sobre o Riacho Doce, que foi modificado. Também as manchas de áreas alagadas e alagáveis naturais existentes nos arredores foram drenadas por mais duas valas. Mais precisamente, a pequena bacia da lagoa do Café, que se situava entre as bacias do Riacho Doce e da lagoa de Setiba, foi desfigurada pela implantação das ruas do loteamento Cidade do Sol e abertura das valas, que drenam hoje as áreas alagáveis e alagadas adjacentes.

• A implantação de vias de acesso à praia - Existem quatro vias de acesso à praia, que cortam perpendicularmente a planície de inundação. A implantação dessas estradas, que aparentemente não causariam maiores consequências, na realidade, representam o represamento das águas pluviais, cujo estoamento original se dava sobre toda a superfície de inundação. Apesar da realização de obras de drenagem na forma de manilhamento, fica alterado o fluxo das águas superficiais, pois as estradas, aterradas com material argiloso, funcionam com diques, impedindo o escoamento lento e contínuo através da planície de inundação, concentrando-o nos locais onde foi colocado o manilhamento.

As duas estradas de acesso a Setiba, implantadas em meados da década de setenta, provocaram a morte das florestas úmidas de restinga localizadas água acima, transformando-as num extenso brejal, onde habita outro tipo de vegetação, exemplificando as graves consequências que podem ocorrer a esses ambientes naturais. As outras duas vias, mais recentes, ainda não provocaram danos visíveis ao equilíbrio do sistema natural de drenagem, mas o seu comprometimento se dá lentamente, devendo as consequências aparecerem no decorrer dos anos. Outras intervenções, tais como desatamentos, queimadas e extração de areia, constituem uma ameaça constante à manutenção do equilíbrio da bacia hidrográfica.

Pode-se prever as graves consequências que a implantação dos loteamentos aprovados poderão causar à área da bacia, sob forma de aterros sobre turfeiras, totalmente desaconselhados, bem como a impossibilidade de soluções razoáveis para os problemas de esgotos sanitários e drenagem de águas pluviais. Soma-se a este fato a disponibilidade de grandes áreas já parceladas e não ocupadas, suficientes para a expansão urbana prevista para as próximas décadas dos municípios envolvidos. Em Vila Velha, no distrito de Jucu, que vai até Ponta da Fruta, existem aproximadamente 33 mil lotes vagos, que podem abrigar uma população de 165 mil habitantes.

A criação de um parque estadual - Levando em consideração todos os aspectos abordados, entende-se que a área da bacia hidrográfica da lagoa de Setiba, preservada como está hoje em sua forma primitiva, justifica a criação de um parque estadual que, por definição, é um patrimônio para uso comum do povo, onde se concilia a utilização científica, educativa e recreativa, de modo a garantir uma preservação que possibilite a transmissão desse patrimônio natural a gerações futuras. Um parque estadual é criado por ato do governo, através de legislação específica, devendo ser realizado o estudo da atuação das propriedades, objetivando urgente regularização fundiária para retomada do domínio pelo Governo.

De uma forma geral, num parque estadual é proibida qualquer utilização direta dos recursos naturais, tais como: extração dos recursos do solo, dos recurso hídricos, corte ou retirada de vegetação para quaisquer fins, captura de anima silvestres, atividades agrícolas ou pastoral, pesca, ocupação residencial ou indústria, implantação de novas vias etc.

A implantação efetiva de um parque estadual constará da construção de: centro de visitantes, estacionamento, sanitários, vestiários, restaurantes, bares, mirante, placas informativas, abrigos, áreas para piquenique e camping, cestas de lixo, trilhas para observação da natureza. Com criação do parque estadual de Setiba, o Governo do Estado garantirá à população da Grande Vitória, Guarapari e do Espírito Santo de uma forma geral, usufruir de um patrimônio natural incomparável cujo valor transcende uma avaliação meramente imediatista e econômica de aproveitamento da área.

Por ora é fundamental a aplicação da legislação federal e estadual em toda a sua abrangência, no que diz respeito às intervenções que vêm ocorrendo na bacia, forma a garantir o equilíbrio natural existente, que não se encontra em nenhuma outra área tão próxima à Grande Vitória e provavelmente ao longo de todo o litoral capixaba.

Reservas Ecológicas

Boa parte da área da bacia hidrográfica já é protegida por legislação federal e estadual. Na resolução nº 04/85 do Conama (Conselho Nacional do Meio Ambiente) são consideradas Reservas Ecológicas, todas as florestas e demais formas de vegetação situadas: nas restingas, em faixa mínima de 300 metros a contar da linha de preamar máxima; nas nascentes permanentes ou temporárias, incluindo os olhos d'água e veredas, seja qual for a sua situação topográfica, com uma faixa mínima de 50 metros a partir da sua margem, de tal forma que proteja, em cada caso, a bacia de drenagem contribuinte como vegetação fixadora, e nas dunas. A legislação estadual também protege a área da bacia. Neste sentido, o Decreto nº 2299-n/86 considera degradação do meio ambiente: as atividades que impliquem movimentação ou descaracterização paisagística ou das biotas naturais; edificações residenciais ou não, em áreas praianas ou de vocação turística que causem degradação da paisagem ou alterem o meio ambiente; barragens, açudes e quaisquer atividades que modifiquem a caracterização física, química ou biológica das águas lacustres ou fluentes, superficiais e subterrâneas.

 

Fonte: Revista do Instituto Jones dos Santos Neves Vitória, Vol. 6 Nº 1 – 1987
Texto: Sérgio Martins Filho
Compilação: Walter de Aguiar Filho, setembro/2018

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