Doutrinação de brancos e índios
Os trabalhos das edificações não preteriam, contudo, a obra de doutrinação. O missionário a ela se reporta com o entusiasmo e o otimismo de um moço preocupado em dar boa conta da primeira empreitada que lhe confiaram: “Grande es el fruto, que por la misericordia del Señor se ha hecho y haze entre los christianos, él sea por todo alabado. Porque unos se apartan de sus mancebas, y otros las dexan y se casan, y determinam de se emendar y ser buenos en adelante; quiera el Señor conservarlos en sus Buenos propósitos. Los jugadores permanecían mucho en estas tres Capitanias, y eran los peores de arrancar de sus vicios y malos costumbres. Ya agora por gracia del Señor están muy emendados, y tengo tomados muchos naipes y dados. De lo qual los que aún están obstinados murmuran y hablan, mas yo mirando El provecho que de ay sucede, no descanso de los perseguir. Hazemos cada dia La doctrina a los esclavos desta villa que son muchos”.(7)
Depois de externar receio em proporcionar o batismo aos gentios, devido a “su inconstancia e poca firmeza”, diz o padre que “tienese acá muy poca confiança en ellos, porque son muy mudables”. Alguns, após terem recebido o primeiro sacramento, haviam fugido para os matos e “andan después allá peores que dantes, y tórnanse a meter em sus vicios y a comer carne humana”.
Assombrado com a quantidade de índios, o jesuíta construiu esta frase sugestiva: “Son tantos, y es la tierra tan grande, y van en tanto crecimiento, que si no tuviessen continua guerra, y si se no comiessen los unos a los otros no poderían caber.”
Antes de pôr ponto final à sua missiva, galanteou a colônia com uma frase de efeito: “Es esta tierra donde al presente estoy, la mejor y más fertil de todo el Brasil”.(8)
Quase quatro séculos depois desta carta iluminada pelas esperanças de quem iniciou a catequese no Espírito Santo, um seu irmão de hábito, historiando a vida e a obra da Companhia de Jesus no Brasil, pôde, com justiça, escrever que a colônia de Vasco Coutinho, “pelo que toca ao trabalho da conversão do gentio”, não decepcionou, pois, “na verdade”, acrescentou – endossando as palavras de Fernão Cardim – “recebeu mais gente do sertão do que nenhuma outra Capitania”.(9)
NOTAS
(7) - BRÁS, Cartas, I, 274.
(8) - BRÁS, Cartas, I, 275. O depoimento coincide com o seguinte trecho da carta escrita em Pernambuco, a dois de agosto de 1551, pelo padre Antônio Pires, referindo-se ao Espírito Santo: “es la tierra la mas abastada y mejor de toda esta costa, según dizen todos” (PIRES, Cartas, I, 260).
Aliás, na carta de dez de março de 1553, “um irmão do Brasil” escrevia que o governador “dió muy gruessa limosna” para o Colégio de Vitória e para a Casa de Porto Seguro (Cartas, I, 428), o que prova que a situação era, pelo menos, de relativa folga.
(9) - LEITE, HCJB, I, 214.
Fonte: História do Estado do Espírito Santo, 3ª edição, Vitória (APEES) - Arquivo Público do Estado do Espírito Santo – Secretaria de Cultura, 2008
Autor: José Teixeira de Oliveira
Compilação: Walter Aguiar Filho, julho/2018
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