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Instituto Histórico e Geográfico do ES - 80 anos

Monumento a Domingos Martins

O Instituto Histórico e Geográfico se desloca de sua sede para o auditório de A Gazeta para comemorar com mais solenidade os 80 anos de fundação. Foi no dia 12 de junho de 1916 que um grupo de intelectuais, entre os mais ilustres da época, movido pelo mais puro idealismo, fundou o Instituto Histórico e Geográfico do Espírito Santo, tomando com seu patrono, o herói Domingos José Martins.

A humanidade cultua os heróis e os santos; os santos e os heróis, conservada a diferença dos planos em que se colocam, se identificam – neles prevalece a tendência para o bem, sabido que a natureza humana traz em si duas potencialidades – a potencialidade para o bem e a potencialidade para o mal. A potencialidade para o bem podemos definir como virtude, essência divina que se desenvolve em uns para os valores espirituais propriamente ditos e em outros para os valores cívicos, os quais, em ambos os casos, elevam o homem e o distinguem dos demais.

Domingos José Martins teria passado pela vida sem certidão, como passam multidões de anônimos, se não houvesse brilhado em sua fronte a auréola do autêntico herói e mártir e o Instituto não seria patrono tão eminente.

Ele não foi, portanto, um simples herói como, por vezes, acontece com os heróis de circunstância. O herói pode sobreviver aos acontecimentos, o mártir, entretanto, é aquele que leva à última consequência o seu ideal.

A palavra ideal não poderia aplicar-se melhor, porque ela nos dá exatamente a noção de algo que se põe acima das ambições pequenas, acima dos interesses imediatos. O ideal é algo sagrado, que brota no recôndito de nosso ser e se desenvolve na medida em que recebe o calor, a força do sentido de justiça, que o anima. E aqui me parece ter conseguido a moldura em que buscarei enquadrar o nosso homenageado - o ideal de justiça que o impelia, que alimentava os seus anseios e o inquietava.

Ele não foi um aventureiro; o aventureiro nada tem a perder. Ele, ao contrário, deixou tudo, as mais promissoras condições de um prosperidade, que logo cedo o envolveu; deixou-se levar e se empolgou pelo ideal, que o abrasava.

Ponho-me diante de sua história e vejo não a comum figura humana; nele vejo o homem e vejo Deus, abrindo o caminho da história, pois esta só é mestra da vida, quando traz em seu curso as pegadas de Deus. E qual é a pegada de Deus neste lance em que é protagonista Domingos José Martins?

A liberdade.

O homem nunca entendeu suficientemente bem a transcedentalidade do dom da liberdade; o homem não avalia a sua responsabilidade por ser livre - a liberdade de agir, de pensar; a liberdade de consciência, esse indevassável foro íntimo, onde Deus, somente Deus é testemunha. Eu digo testemunha e não digo juiz, porque entendo que cada um de nós será juiz de si mesmo, tal a majestade de Deus.

Hoje, no mundo, prevalece a mentalidade de uma liberdade, que já atinge os limites do inconveniente.  Apagaram-se as luzes da consciência e usa-se a liberdade como quem joga papéis picados ao vento, sem alvo e sem direção, sem a mínima responsabilidade. A liberdade deve respeitar não só o direito, mas a sensibilidade alheia.

Depois da vida, que é dom por excelência como a maior manifestação do amor, a liberdade é o mais importante atributo da dignidade do homem e atente-se para o fato de que é a liberdade um bem inalienável e dom gratuito, todo feito de generosidade. Ora, um bem dessa ordem, recebido gratuitamente, não pode ser usado para o mal – será a mais grave malversação.

E não será este o grande pecado de nossos dias?

Imagino que Deus, ao conceber o homem, ao infundir-lhe a vida, há de ter-lhe dito: Olhe. Vou dar-lhe uma faculdade decisiva com a qual você irá orientar a sua vida. Cuidado!

A liberdade é uma faculdade de tal modo pessoal que o próprio Deus a respeita e entre a liberdade de uma pessoa e a liberdade de um povo, há um espaço imensurável. A vida de uma pessoa pode significar uma perda para a história, mas a falta de liberdade para um povo interrompe os desígnios de Deus e nesta hora, prevalece uma força maior, que faz surgir, que suscita os heróis, como látegos na mão de Deus para ferir os que a usurpam.

Meus senhores e minhas senhoras, busquei, nesta síntese, avivar os traços do esboço inicial e revelar a imagem do nosso homenageado, modelo perfeito e acabado de mártir.

Domingos José Martins, para honra deste Estado, nasceu ali na localidade de Caxangá, próxima à cidade de Itapemirim. Era filho de Joaquim José Martins e dona Joana Luiza de Santa Clara Martins.

Assim, no ano de 1781, em um berço do solo espírito-santense, choraminga e por certo ri uma criança, como todos os recém-nascidos choram e riem. O choro é a defesa natural da luta pela vida, que se inicia e o riso é a paga com que compensam as mães do trabalho e das preocupações. Só que, no caso desta criança, o choro e o riso podem ter uma projeção, que não custa nada à nossa fantasia – ela chora pela Pátria, que não gozava de liberdade, ria com a esperança de um dia poder levantar a voz e lutar até o extremo de derramar por ela o seu sangue.

Domingos José Martins iniciou seus estudos em Vitória e os continuou em Portugal. Dali foi para Londres, onde se empregou na firma Dourado Dias & Carvalho, de que logo se fez sócio. A sua passagem pela Europa (Londres e Paris) não poderia ter sido mais propícia para um jovem de sua têmpera.

Retornando a Pernambuco, onde já havia deixado plantada a semente de suas idéias de revolucionário, arregimentou as forças de que dispunha e deu curso aos seus planos e se tornou incontestavelmente o chefe da revolução de 1817.

Os seus historiadores, em páginas esparsas, foram tecendo o documentário de sua vida, mas coube a Norbertino Bahiense reuni-las num livro em que se consubstancia criteriosamente a verdade sobre esse extraordinário vulto da história do Espírito Santo.

Eis com que palavras, o historiador capixaba, Norbertino Bahiense, narra o final trágico desta vida: “Vinde executar as ordens de vosso sultão. Eu morro pela liber...” Um monge ao seu lado, não o deixou terminar a frase, ao se abrirem os pesados gonzos da cadeia da Bahia e formar-se o tétrico cortejo até o campo da Pólvora.

Quem é esse destemido brasileiro, continua Norbertino Bahiense, que descalço e algemado, caminhava impávido e sereno para ser arcabuzado pelos espingardeiros do déspota, que governava a terra de Nosso Senhor do Bonfim?.

Todos o sabem. Era Domingos José Martins, o glorioso espírito-santense que, instantes depois, cairia varado pelos arcabuzes do sanguinário Conde de Arcos, justamente com dois valentes companheiros.  Miguel Joaquim de Almeida e Castro, ou seja, o Padre Miguelzinho e José Luiz de Mendonça, a 12 de junho de 1817.

Este o nosso insigne patrono, cuja memória o Instituto se orgulha de cultivar. Todo ano, neste dia, a Casa de Domingos Martins se engalana para homenageá-lo e, no ensejo, receber festivamente nossos consócios.

Hoje, a par do respeito de que desfruta como instituição octogenária, a Casa de Domingos Martins não sofre a ação do tempo e se mostra cada vez mais jovem e vigorosa.  Pode-se afirmar que vive a melhor fase como instituição cultural ativa. Os novi-consócios que hoje se diplomam e assumem por certo o compromisso do seu maior engrandecimento, representam um contingente da maior expressão intelectual – magistrados, professores, historiadores, homens de letras, que poderão contribuir para que se alargue o campo de atividades, a que o Instituto se propõe, de acordo com sua natureza específica. Cumpre destacar que, entre os diplomados de hoje, para honra desta Casa, encontra-se o Presidente do Tribunal de Justiça, o desembargador Dr. Ewerly Grandi Ribeiro, o orador da turma.

Srs. Novi-consórcios, a vós me dirijo em nome da diretoria para apresentar-vos as boas vindas com a certeza de que poreis a serviço do Instituto toda a vossa capacidade disponível de trabalho e que todos vos sintais bem neste convívio.

Meus senhores e minhas senhoras, nem tudo são alegrias.

No meio de tanta festa, há uma nota de tristeza, que nos cumpre registrar. É praxe neste dia lembrar os consócios falecidos.

No dia 15 de maio deste ano, faleceu o nosso consócio Hermógenes Lima Fonseca. Hermógenes Lima Fonseca nasceu em Conceição da Barra, a 12 de dezembro de 1916. Poeta, escritor, notabilizou-se como homem dedicado à pesquisa do folclore do seu Estado.

Há um pensamento, que escolhi como sendo seu, que o define. Disse ele: “Quando penso no macrocosmos, no cosmo e no infinitamente pequeno, sinto-me um verme petulante”.

Por aí se vê que Hermógenes não era arrogante, era humilde.  Ele tinha noção da sua infinitésima condição humana. O pensamento continua: “Voltaire esmagaria uma formiguinha, mas lamentava ser incapaz de dar-lhe novamente a auto-locomoção. A biologia e não a teologia é a ciência de Deus. “Aqui, se a afirmativa é de Voltaire, discordo firmemente. A biologia é biologia, é a ciência da vida. Teologia é a busca do conhecimento de Deus. As ciências gravitam em torno da Teologia. As ciências são o limite da inteligência humana, a Teologia transcende esse limite.

Hermógenes era um homem inteligente. Vivia como se deve viver – desprendido de interesses materiais, despido de vaidades. Hermógenes, não direi que foi um anjo, mas era um espírito superior.

 

Fonte: Revista do Instituto Histórico e Geográfico do Espírito Santo. N 47, ano 1996
Autor: José Garajau da Silva
Compilação: Walter de Aguiar Filho, abril /2013 

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