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No Centenário de Afonso Cláudio - Nelson Abel de Almeida

Afonso Cláudio de Freitas Rosa

Foi ali, no Município de Santa Leopoldina, na Fazenda de Mangará, à beira do rio Santa Maria, sempre evocado pelo Mestre, com uma saudade e uma ternura imensas.

E sua ilustre filha, também sua biógrafa — a Professora Judith Freitas de Almeida Mello, com simplicidade, mas com amor filial, descreve o sítio onde Afonso Claudio abriu os olhos, para a vida. E diz-nos:

“a casa grande avarandada, ficava numa elevação do terreno, dominando as cercanias. Na planície, destacava-se a extensa lavoura de cana e, do um lado e outro da casa, havia fruteiras, pejadas de goiabas, araçás, jenipapos, perinhos, ingás... Além, estava a mata cheirosa, onde figuravam belos exemplares de preciosa madeira, destinada aos mais variados fins. Longe, fora do alcance visual ficava a plantação de café, também à beira rio, de cultivo, incipiente, na região".

Em um ambiente assim, impregnado daquela paz que emana da natureza simples, viu Afonso Cláudio transcorrer a sua meninice. E então, de quando em quando,

"na senzala, conversava com os escravos, e tinha os seus preferidos, que lhe contavam histórias sem fim, e que vinham de outras gerações, desde as famosas pescarias dos índios, primitivos habitantes da região, os quais usavam como chumbada, nas linhas de pesca, pedaços de ouro! Eram histórias mescladas de realidade e fantasia, que povoavam seus sonhos de rapazinho, pelo que de fabuloso encerravam".

Sem dúvida, dessas conversas com a mãe preta e com o pai João, foi Afonso Cláudio haurir o gosto, que sempre o empolgou, pelos estudos das nossas tradições, dos nossos costumes, contribuindo para que mais tarde publicasse ele, em 1923, TROVAS E CANTARES CAPICHABAS, livro escrito «ao correr da pena», com o qual «pretendeu, apenas, focalizar o assunto em sua terra natal».

Hoje, sabe-se teve a intenção de reeditar TROVAS E CANTARES CAPICHABAS, «Imprimindo-lhe mais vigor, como estudo literário, mas não lhe sobrou tempo para reunir os preciosos apontamentos que deixou. Os livros didáticos destinados ao ensino superior (Direito) absorveram-no, por fim», privando-nos, a nós outros, da felicidade de vermos realizado, para orientação dos estudos folclóricos espírito-santenses, trabalho de tanta magnitude.

Filho do Coronel José Cláudio de Freitas Rosa e de D. Rosa Cláudio de Freitas Rosa, Afonso Cláudio concluiu o curso de primeiras letras na província pobre, e humilde; parte do curso secundário foi estudado no Colégio das Neves, tendo como preceptor o eminente latinista capixaba Manoel Ferreira das Neves. Com catorze anos de idade está ele, neste Estado, cursando o Ateneu Provincial, tendo sido aluno do Professor Aristides Freire, renomado educador espírito-santense.

Curso de Humanidades em ordem, pretendeu o moço Afonso Cláudio ingressar na Escola de Marinha. Não concordou, com a pretensão do filho, o Coronel José Cláudio.

Estava-se, então, no tempo em que a vontade dos filhos se curvava ante a vontade dos pais; e Afonso Cláudio, que poderia, hoje, ter o seu nome inscrito na galeria dos mais notáveis comandantes da nossa gloriosa Marinha de Guerra, atende ao velho fazendeiro, e vai estudar Direito, tendo já 19 anos de idade, seguindo em 1877 para Pernambuco, a fim de matricular-se na Faculdade de Direito do Recife.

Ali, na maravilhosa terra recifense, iria Afonso Cláudio assistir aulas, tendo como condiscípulos Benilde Romero (irmão de Sílvio Romero), Isaac Reis, Martins Júnior, Cavalcante Melo, Tito de Lemos, Aristides de Morais, Clóvis Beviláqua, Teófilo Câmara e outros, num total de quarenta. Frequentavam o primeiro ano de Direito, residiam no velho Convento de São Francisco, ocupando as celas que, em tempos idos, teriam sentido o dedilhar das contas dos terços de velhos monges, e penitentes e que, agora, estremeciam, escandalizadas, ante as irreverências acadêmicas.

E estes quarenta estudantes, do primeiro ano, na Faculdade de Direito do Recife, em 1878, eram todos músicos.

Não faziam, entretanto, bulha ou algazarra com as suas serenatas; não faziam vibrar as flautas e os flautins, nem faziam chorar violinos ou clarinetes.

E eram todos músicos... Sim, eram músicos, pois informa Afonso Cláudio, que «na gíria recifense, os rapazes por não terem todos os preparatórios ouviam as aulas do primeiro ano jurídico como simples assistentes, eram chamados músicos».

O nosso eminente terrantês, por algum tempo, foi também aluno da Faculdade de Direito de São Paulo, onde esteve por dois anos. É que São Paulo era mais próximo do Espírito Santo; Recife, entretanto, não fora esquecida de todo e, um dia, regressa ele à Capital pernambucana, concluindo na velha Faculdade o seu Curso Jurídico.

Mudado fôra, pelo austero Coronel José Cláudio, o destino do jovem Afonso Cláudio; o Brasil perderia um bravo homem do mar; as letras jurídicas nacionais e espírito-santenses iriam experimentar toda a pujança de uma inteligência privilegiada; ilustrados e engrandecidos seriam, pelo talento invulgar, de Afonso Cláudio, agora bacharel em Ciências Jurídicas e Sociais, os mais diversos ramos do conhecimento humano.

Hoje seriam a História e a Sociologia, amanhã seria a Etnografia, logo mais seriam o Direito Internacional Privado, o Direito Romano e o Direito Processual, daqui a pouco seriam o Direito Civil e Constitucional, a Filosofia do Direito, a Crítica Literária.

E, pode-se agora afirmar — abençoada foi a oposição feita, pelo Coronel José Cláudio, à vocação militar de Afonso Cláudio.

E teria, realmente, Afonso Cláudio, vocação militar?

 

Fonte: Torta Capixaba (Ensaios, Crônicas, Poesias...) 1962 - Editora Âncora S.A. Vitória - ES
Autor: Nelson Abel de Almeida
Compilação: Walter de Aguiar Filho, abril/2022

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