Personalidades de Vitória – Por Wanda Camargo
Contam na Austrália que, no início, o céu era pegado à terra e que o homem andava curvado entre ambos, até que inventou o bumerangue e, com um lance, separou a terra do céu.
A vida se assemelha ao movimento do bumerangue: quando a enviamos na direção dos nossos sonhos, esperamos a sua volta em nossas mãos. Porém, às vezes, sua partida é sem retorno.
Escolho, para falar aos Escritos de Vitória, uma personalidade essencial. Muitos a conheceram e poucos, como eu, tiveram oportunidade de vivenciá-la. Falo de um mineiro, nascido em Itaúna, a 9 de fevereiro de 1909. Filho das montanhas — das Alterosas — ele se tornou filho do mar, fez-se capixaba desde que chegou aqui, acompanhado de sua mãe, Maria Moreira Camargo (viúva de Procópio Moreira Camargo) e de seus seis irmãos: Clóvis, Gumercinda, Dahlia, Leny, Maria (Marita) e Rita (Lilita). Falo do Dr. Manuel Moreira Camargo, que nos deixou no ano passado, a 16 de fevereiro de 1995, sete dias após ter completado os seus 86 anos.
Chegou pequeno em Vitória. Contava-me que, muitas vezes, caminhava na infância descalço. O sapato ficava guardado em casa, novo, na caixa, esperando ocasião importante para ser usado. Assim, calçado e descalço, o menino Manuel caminhou o seu caminho de homem.
Político de largo prestígio e orador-feito — como diziam os antigos — o Dr. Camargo aliava sua inteligência privilegiada à palavra, oral ou escrita, que fluía fácil de sua boca ou de sua mão, deixando entrever uma grande cultura, uma erudição, uma sabedoria acumulada. Vereador e deputado estadual por duas legislaturas, advogado militante que possuía as linhas da lei na palma da mão, ele criou — durante o governo Élcio Álvares — a Lei da Defensoria Pública. Foi um dos fundadores da OAB-ES e seu presidente por vários anos. Também foi sócio da AEI e membro do Instituto Histórico e Geográfico do Espírito Santo. Nos últimos anos, últimas de suas causas, o Dr. Camargo venceu, judicialmente, perante o Estado do Espírito Santo, a questão que ficou conhecida como "das 800 professoras" no Fórum e na cidade de Vitória. Defendendo as professoras, ele defendia o ensino e se voltava para esta infância do Brasil, ainda hoje sem sapatos.
Sem dúvida que não caberia só a mim, neste espaço, falar do tempo desse homem público. Muitos foram os seus companheiros de idéias e ideais. Devo falar apenas do homem-humano, de quem a vida se encarregou de me aproximar, através da convivência assídua, nos momentos e eventos intelectuais, e, mais ainda, dentro da própria relação familiar. Sempre que nos encontrávamos — e nos encontrávamos sempre — os seus braços se abriam em minha direção e um sorriso tomava conta de todo o seu ser. São esses momentos, são essas lembranças, são essas recordações que chamamos, em nossa língua, de saudade.
Dr. Manoel Moreira Camargo fechou os olhos, mas nos deixou a luz de sua visão. "Missão cumprida e comprida" — ele deve ter percebido na hora final. Homem fácil de ser compreendido, porque sabia compreender, ele me fazia sentir o que verdadeiramente eu sou: poeta. Sim, me fazia sentir o que ele era, o que ele foi com a própria vida. Não me despedi dele antes. Não me despeço agora nem depois. O seu sangue corre nas veias dos meus filhos — os seus netos — sangue forte, sangue de determinação.
Agradeço a Deus por ele e agradeço a Deus por mim, por ele ter existido e por eu poder confirmar sua existência. Viemos do mesmo Estado, das mesmas Minas Gerais para esta ilha de Vitória.
O bumerangue regressa às minhas mãos. O céu, onde está o Dr. Camargo, de novo volta a ficar próximo, pegado terra. Estou, entre céu e terra, curvada sob a sua saudade.
Fonte: ESCRITOS DE VITÓRIA — Personalidades de Vitória – Volume 15 – Uma publicação da Secretaria de Cultura e Turismo da Prefeitura Municipal de Vitória-ES, 1996.
Prefeito Municipal - Paulo Hartung
Secretário Municipal de Cultura e Turismo - Jorge Alencar
Sub-secretário Municipal de Cultura e Turismo - Sidnei Louback Rohr
Diretor do Departamento de Cultura - Rogério Borges de Oliveira
Diretora do Departamento de Turismo - Rosemay Bebber Grigatto
Coordenadora do Projeto - Silvia Helena Selvátici
Chefe da Biblioteca Adelpho Poli Monjardim - Lígia Maria Mello Nagato
Bibliotecárias - Elizete Terezinha Caser Rocha e Lourdes Badke Ferreira
Conselho Editorial - Álvaro José Silva, José Valporto Tatagiba, Maria Helena Hees Alves, Renato Pacheco
Revisão - Reinaldo Santos Neves e Miguel Marvilla
Capa - Vitória Propaganda
Editoração Eletrônica - Edson Maltez Heringer
Impressão - Gráfica e Encadernadora Sodré
Autor do texto: Wanda Camargo
Compilação: Walter de Aguiar Filho, janeiro/2018
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