Mercados de Vitória
Iah!...
Logo eu!... Eu que me considero tão vitoriense, habitante
do fundo da ilha, capixaba brotado da roça de milho,
desembarcado no Cais Schmidt da galeota de Duarte Lemos!?...
Pois não é que me pedem uma memória dos
antigos mercados de Vitória e me vejo meio distante
do pulsar desses pedaços urbanos.
Na realidade, guardo velha lembrança do então
acanhado mercado da Vila Rubim, um colorido amontoado de barraquinhas,
labirinto oriental decorado com verduras e frutas, vozerio
confuso, rude aroma de terra viva, raízes e folhas
frescas enevoando de fragrância agreste o tosco ambiente.
Mas, de fato, não entendo muito dos mercados municipais.
Eu li as notícias do “Hidrolitol”, vi Darly
Santos fazendo poesia (Tito Azevedo), jornalismo (Mickey)
e jogando futebol (Darly). Festejei Harry e Arruela. Fui ao
Estádio Governador Bley ver o América do Salomão
contra o Santo Antônio de “Seu” Cruz.
Outra visão que tenho dos mercados coloca em cena a
figura marcante do Dr. Belesa, de roupa impecável,
caminhando entre as bancas, portando frutas e verduras, no
curso de um ritual que cumpria desde sua juventude.
Sou da terceira turma do Salesiano, vizinho de carteira de
José Alfredo Cabral, do tempo de Guilherme Ayres, Cariê
e Tidinho, filho do interventor. Beijei a mão de D.
Luiz Scortegagna, cantei no Congresso Eucarístico,
andei de táxi com Marinho Delmaestro, assiti às
brigas de Delphim Borgo, presenciei Getúlio Vargas
falando da sacada do Hotel Tabajara, assisti à consagração
eleitoral do vereador Hermógenes.
Está ancorando em minahs vagas lembranças uma
lanchinha verde, vindo dos lados de Santana (?), trazendo
carne de boi para o mercado da Capixaba. É muito pouca
memória para quem freqüentou as matinês
do Politeama, admirou as vitrinas da Madame Prado, freqüentou
a Vagalume, não saía da boate do Clube Vitória,
dançou ao som de Mundico, aplaudiu os brotos do Hélio
Dórea, foi citado pelo colunista Ronaldo Nascimento,
trabalhou com Mesquita Neto, César Vieira Bastos, Fernando
Costa; no governo, com Armando Rabelo, Milton Caldeira e Bolívar
de Abreu.
O mercado de Jucutuquara, junto à Delegacia do comissário
Gentil Flores da Purificação, era mais limpinho
e organizado.
Como vereador, virei na Câmara a noite de 31 de março,
junto com José Ignácio, Beraldo, os Raulinos
e outros, conheci os coronéis Newton Reis, Bandeira,
Vinícius e major Romão. Vi a renúncia
de Chiquinho, acompanhei a escolha de Christinao, fui quase
na indicação de Arthur para o governo.
Em matéria de mercado é que estou a pé.
Conheci as gafieiras América e Está Cruel, contemplei
o esplendor de Caratoíra e o nascimento do Areal. Quando
José Dias Lopes promoveu a transmigração
do alegre sistema para os altos de Carapina, eu não
mais acompanhava esses deslocamentos.
Ouvi o Paraíso Infantil, de Bertino Borges, aplaudi
Sílvio Roberto, conheci Newman, li Ciro Vieira da Cunha,
estudei com o professor Ceciliano e Clóvis Rabelo,
comovi-me com a “Vida de Cristo” de Clodoaldo
Viana, fundei o Bob’s, freqüentei o Avenida, bebi
com Carmélia e Maysa (separadas), tomei dinheiro emprestado
com “Seu” Valls, consultei-me com o Dr. Schwab,
abri a boca para o Dr. Hildebrando, fiz roupa com Júlio
Lima, comprei sapatos na Indígena, dormi no Hotel Europa,
comi no Esplanada, comprei camisa no Braido, conheci Meio-Fio
e Grapuá.
Não será pela força do mercado que dirão
que sou menos ilhéu.
Mas, confesso que fico espantado em não conseguir garimpar
meia dúzia de sentimentos que possa traduzir. Desculpe-me
pela insuficiência...
Autor:
José Costa – Jornalista e cronista nascido em
São José do Calçado (ES)
Livro: Escritos de Vitória – Mercados e feiras
– 1995
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