Lembranças de Victoria
Lendo a história de "Victoria", estão vindo na minha lembrança gradativamente, muitos fatos que provavelmente muitos que residem em Vitória de hoje, não sabem.
Vou relatar fatos de minha infância, até 8 anos aproximadamente, que aconteceram e ficaram guardadas na minha cabeça até hoje.
Leiam, e vejam que fatos interessantes:
Eu morei desde que nasci (em 15 de abril de 1938), até os 8 anos, no final da Rua Padre Nóbrega, número 529, no centro de Vitória, após os 8 anos mudamos para final da Rua 7 de Setembro número 526, próximo a "Convertidora". Chamava-se convertidora, pois recebia a luz elétrica na forma "corrente alternada" e "transformava" para "corrente contínua" para alimentar a linha dos bondes e onde havia também a garagem/oficina de todos os bondes.
Depois destas informações, vamos às outras lembranças:
Durante a segunda guerra mundial, na Convertidora, tocavam à noite uma possante sirene e todos da cidade tinham que apagar todas as luzes das casas, para que possíveis aviões alemães não vissem a nossa cidade e a bombardeasse. Era um exercício feito sem hora, mas sempre à noite, e quando a sirene tocava, meus pais e todos da casa apagavam todas as luzes pois se alguma autoridade visse uma luz em uma casa, estariam todos com sérios problemas com a polícia local.
Meu pai tendo conhecimento em eletrônica, consertava rádios e mais rádios das pessoas de Vitória, e nossa casa tinha no interior uma "fila" de rádios para serem sanados os defeitos. Uma vez, um senhor muito conhecido e de posição financeira boa, levou para o meu pai um rádio pois o mesmo não "falava", e disse para meu pai: "Balbino, meu rádio não está falando, me disseram que você tem que "trocar uma peça" para o rádio falar nosso idioma..." ( ? ? ?, eu tinha uns 4 anos por aí ...)
Meu pai era rádio-amador, (PY-1UH >o "última hora") e ficava permanentemente em contato com o mundo, com o pequeno transmissor que ele mesmo tinha montado, me lembro, cor verde, com cantoneiras de alumínio, um baita microfone. Sabia de notícias mais rápido que muitos meios de comunicação.
Uma vez, ouvi meu pai dizendo: "Aumente o volume do rádio, está dando uma notícia que os Russos se juntaram aos aliados". Era a esperança de que desta vez a segunda guerra mundial, teria um término, e teve mesmo, graças a Deus. Quando foi jogada a bomba atômica em Hiroshima, eu tinha por volta de 7 anos... parece que foi ontem ! ! ! hoje tenho 67 . . .e com saúde... repito, graças a Deus.
Outro fato interessante: Durante a segunda guerra mundial, o combustível sumiu, então os carros das pessoas mais ricas passaram a ter DOIS ENORMES CILINDROS VERTICAIS OU INCLINADOS, NA TRASEIRA DOS CARROS. Eram movidos a "gasogênio" (vide as fotos e as propagandas de vendas dos volumes enormes que eram colocados nos veículos...e anunciavam "...sem tirar a estética..." (veja que "coisa linda" o carro da propaganda nas fotos ao lado).
Olha só o trabalho para ia sair de casa com o veículo movido a gasogênio:
Dentro dos tubos tinha um carvão que era aceso, depois de acesso a fumaça era levada para o carburador para então o motor funcionar movido ao "gasogênio". Ai houve um problema: o carro quando ia subir uma ladeira, perdia a força, então o motorista tinha que ir lá atrás do carro e com um "abanador", aumentar o fogo para assim aumentar a produção do "gasogênio". O carro teria mais força e subiria a ladeira.
Foi então que tiveram uma idéia: colocaram do lado do motorista uma "ventoinha" movida a mão (essas de fornalhas pequenas), o motorista quando percebia que o seu carro estava perdendo força, girava a ventoinha para produzir mais vento nas brasas...teria mais gás e o carro teria mais força...
O gasogênio era usado em ônibus, lanchas, caminhões etc...claro, gasolina tinha desaparecido do mercado...era a única solução.
Me lembro de um enorme "zepelim", um grande dirigível passando por cima da Baía de Vitória, tive muito medo, pois ouvíamos dizer que vários navios tinham sido torpedeados na nossa costa... e o mundo em guerra tudo era possível.
Me lembro da carrocinha de leite, parando na rua 7 de Setembro e uma fila enorme de pessoas com seus litros e panelas na fila comprando o leite. O leiteiro, me lembro do nome dele, "seu Paulo", sentado no banquinho de madeira vendendo o leite, que muitas vezes azedavam e no dia seguinte era aquela bronca, mas ele fazia a reposição de todo leite azedado sem o "Copom".
Me lembro da paz, sem assalto, quase todas as pessoas se conheciam, passeios no Parque Moscoso, com vários jacarés nos lagos, tomando sol..., gansos, etc, a Praça Costa Pereira, as mocinhas girando em um sentido e os rapazes no outro sentido. Homem que andasse no sentido contrário era considerado "suspeito" .... tudo em paz, que coisa linda.
Meu avô fazendo diariamente antes de ir para o trabalho, uma caminhada até o final da Avenida Capixaba, o Adelpho Poli Monjardin (grande atleta do remo), caminhando pelas calçadas com o seu "andar empinado", passadas largas, balançando para a direita e para a esquerda, sempre sério mas muito admirado por todos. Após essa caminhada meu avô ia para o trabalho, na Prefeitura de Vitória, colocava o seu chapéu na "chapeleira" e iniciava a rotina diária do seu trabalho como tesoureiro.
Tinha um funcionário chamado Gilberto Espíndula, (teria tido meningite quando criança e tinha pequenos problemas) e quando chegava na Prefeitura, colocava o chapéu na chapeleira e ia para o trabalho. No final do dia ele pegava o chapéu rapidamente e saía bem depressa.
Foi então que alguém colocou no lugar onde ele pendurava o chapéu, "cola". Já viram no que deu...quando terminou o horário de trabalho, o Gilberto pegou o chapéu bem rápido e puxou, mas O FORRO FICOU GRUDADO NA PONTA DA MADEIRA do chapeleiro.....foi uma baita confusão que no final acabou em paz...
Estes e outros fatos, deixaram uma boa lembrança que tenho de "Victoria".
Dando "um pulo" para o futuro, nas décadas de 50, 60, 70, 80 eu como músico, ah, tocando durante 33 anos nas noites do Espírito Santo, interior de Minas Gerais, Rio de Janeiro e algumas vezes fazendo testes de equipamentos (órgão e sintetizador), em "inferninhos" de São Paulo... quantas cenas, quantas lembranças até cômicas dentro de clubes...me lembro e fico rindo de muitas cenas... muitas me levando a risos, outras que deixavam lágrimas nos olhos, como uma Bodas de Diamante no Cerimonial Itamaraty, não me esqueço, um casal bem velhinho, e o padre que realizava a cerimônia, me informaram que era neto deles. As palavras de sacerdote aos avós, foram tão belas que me lembro ainda: até os garçons estavam com lágrimas nos olhos sensibilizados com a cena... linda não seria a palavra, foi algo sobrenatural.
Em outra ocasião uma festa da Carmélia M. de Souza, no Iate Clube, a festa "Humor negro". Era mais ou menos assim: O salão todo ornamentado com "coroas de flores", no meio do salão um caixão de defunto e com um "defunto de mentira" dentro do dito caixão. Aí acontecia o seguinte: Uma pessoa passando-se por um religioso, "encomendava a alma do defunto" e no final jogava um copo de bebida no rosto de dito defunto. Nesse momento o "defunto" ficava em pé, olhava para todos, dava "uma banana" e eu com o meu conjunto iniciávamos o baile... que terminava lá pelas 4 da madrugada !
Uma vez eu saí do funeral de meu sogro, e fui para o Iate Clube tocar o baile "Humor Negro"... que situação atípica heim? Coisas da vida ! ! ! Vida de músico.
Agradeço a Deus, tudo valeu.
Hoje estou com meus 67 anos e olhando para trás, vejo que "Ele" foi muito bom para mim, obrigado.
Talvez um dia, escreva mais sobre nossa querida "Victoria", cidade presépio do Brasil. De Vila Velha, faço fotos das belas imagens.
Autor: Edson Quintaes
Data: 08 de agosto de 2005
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