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Telefonia na era do bonde em Vitória

Telefone Antigo de Parede

Os atrasos de bondes ou lanchas permitiam que os seus usuários testemunhassem, nesse tempo, como funcionava a telefonia entre Vila Velha e Vitória, haja vista que ao lado do bar, em Paul, funcionava a estação de recebimento e transmissão das chamadas telefônicas entre as duas cidades.

As telefonistas, ao atender e completar ligações pedidas ou recebidas, o faziam em voz alta e a conversação era ouvida por quem estivesse na pequena plataforma aguardando o bonde. O timbre das suas vozes ditava a boa ou má qualidade das chamadas. Se elas falavam alto e repetiam a recepção ou a retransmissão, isso significava que havia irregularidades numa das pontas dessa linha ou mesmo nas duas, quiçá em todo o sistema, o que não raro acontecia.

Telefonar de Vila Velha para Vitória era como fazer uma ligação interurbana, não comparável às de hoje, mas àquelas em que as ligações nem sempre se completavam ou acabavam não acontecendo. Em certas ocasiões seria preferível mandar um recado a falar de Vila Velha para Vitória e vice-versa por causa da demora. Segundo os entendidos, toda essa complicação era causada pela sobrecarga das linhas, ocupadas pelos usuários, embora o número de aparelhos nas duas cidades fosse pouco mais de duas centenas.

Em Vitória ficava a central, que polarizava todas as chamadas. Vila Velha e Paul eram subestações. Além do aparelho, a telefonista era peça chave desse sistema. Com um fone colado ao ouvido, o aparelho transmissor fixo à sua frente, uma manivela para acionamento e fios de conexão, estava preparada essa operadora para entrar em atividade.

Para comunicar-se com Vitória o usuário, do seu telefone residencial ou comercial, acionava o posto telefônico de Vila Velha, estabelecendo com a funcionária de plantão mais ou menos o seguinte diálogo:

— Telefonista, por favor, quero uma ligação para Vitória.

— Um momento, — era a resposta da telefonista, que em seguida acionava a manivela junto ao aparelho retransmissor conectado à subestação de Paul, dizendo:

— Paul, telefonista de Vila Velha chamando.

— Estou ouvindo, fala Vila Velha.

Não sendo a resposta compreensível, a telefonista instada voltava a se manifestar:

— Vila Velha, Paul falando! Fale mais alto, não estou ouvindo. O bonde acaba de chegar. O barulho do pessoal descendo e o motor do bonde ligado não me deixam ouvir direito. Favor repetir.

Caprichando na voz, Vila Velha respondia:

— Paul, quero uma ligação para Vitória, para o telefone 85 (poderia ser um outro qualquer).

E tome manivela.

— Entendido, Vila Velha! Aguarde um momento, por favor, vou chamar a central.

— Vitória central, Vitória central, Paul chamando! Por favor, Vila Velha quer falar com Vitória.

— O número do telefone, por favor!

— 85, central!

E a resposta vinha de lá, a toque de manivela:

— Paul, aguarde. Vou verificar se a linha está disponível.

— Entendido, central.

E Paul aguardava o retorno. Se fosse favorável, Vitória voltava ao circuito dizendo:

— Paul, central chamando! Central chamando, Paul!

— Pode falar, Central.

— Linha 85 à sua disposição! Linha 85 à sua disposição!

— Obrigada, central.

E a telefonista entrava em contato com o telefone 85, dizendo:

— Aguarde um momento, por favor. Vou passar a sua ligação para Vila Velha.

Conectando Vila Velha, acionando a manivela, falava:

— Vila Velha, Paul chamando! Alô, Vila Velha, Paul chamando! Linha 85 disponível.

— Obrigada, Paul!

Mas se a linha estivesse ocupada, tudo voltaria a se repetir e tome tempo de espera.

Com a linha aberta para Vitória, a telefonista de Vila Velha mais que depressa transferia a ligação:

— Alô, minha senhora ou meu senhor, a sua chamada para o telefone 85 foi completada. Favor falar.

Se a telefonista já houvesse identificado o dono ou a dona do telefone ou a sua voz, não dizia senhor ou senhora. Declinava o nome do cliente, o que era muito comum. A fala dele ou dela, sendo familiar, tornava fácil a identificação. Se o assunto interessava à telefonista, no correr da conversa ela metia o bedelho arriscando um palpite entre os interlocutores, fosse chamada ou não a fazê-lo.

Rechaçada ou dispensada da participação, ninguém poderia impedi-la de continuar ouvindo o diálogo estabelecido, a menos que por livre e espontânea vontade tirasse o fone do ouvido. Por isso as telefonistas eram consideradas como as pessoas mais bem informadas da praça e, embora apresentassem ares de discrição, novidade era com elas mesmas. Pelo visto, a conversação múltipla que hoje é usada também usavam-na as nossas telefonistas do passado, como precursoras que bisbilhotavam a vida alheia.

 

Fonte: ECOS DE VILA VELHA, 2002
Autor: José Anchieta de Setúbal
Compilação: Walter de Aguiar Filho

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