Santificado
seja o vosso nome, Benemérito Frei Palácios!
Trecho
transcrito do: Jornal
A Tribuna
Autor:
MIGUEL M. AGUIAR
No convento da Penha, um dos mais belos, dos mais notáveis
monumentos de Fé Católica do Brasil, em todos
os tempos o de maior veneração do povo espiritosantense,
acaba de realizar-se a tradicional festividade em homenagem
à Excelsa Padroeira da Diocese do Estado – Nossa
Senhora da Penha.
Essa festa, que é, indubitavelmente, a mais concorrida
de quantas se realizam no Espírito Santo há
quatro séculos aproximadamente, vem sendo celebrada
dentro dos dez dias seguintes ao da Ascenção
de Nosso Senhor Jesus Cristo.
A
Capelinha do antigo mosteiro, em boa hora confiada à
direção de monges franciscanos, ainda obedece
ao ritual da sua primeira celebração efetuada
pelo grande apóstolo Frei Pedro Palácios, a
quem devemos essa dádiva maravilhosa (que é
o mosteiro da Penha) de que muito se orgulham o nosso Estado
e o seu povo, notadamente os filhos da gloriosa Cidade do
Espírito Santo.
Como o taumaturgo José de Anchieta, o fundador da Ermida
da Penha tem a sua vida ligada a inúmeras lendas singulares,
todas rememoradas anualmente, em rútilas consagrações
de Amor e de Fé, no decorrer dos atos que se celebram
no Santuário do majestoso templo, onde nasceu e cresceu
opulentamente a religião católica do Espírito
Santo.
Contam os cronistas e oradores sobre a vida do valoroso anacoreta,
que vindo ele de além mar, depois de acidentada viagem
de longos dias ou meses, embarcado numa das atrevidas, mas
sempre beneméritas caravelas lusas, aportou à
remansosa enseada de Vila Velha cerca de cinco lustros depois
da instalação da Donataria.
Animava-o, reza a História, desejo ardente, irreprimível
de auxiliar a quantos servindo a Jesus na difusão (“mistério
verde a dentro”) dos sábios ensinamentos do Evangelho
– “trabalhando e morrendo” – fincaram
em terra de Santa Cruz o Marco Sagrado da Civilização
Cristã.
Há quem afirme, baseado sem dúvida em elementos
colhidos na torre do Tombo,
em Portugal, que o santo Frei Pedro Palácios, possuído
de inexplicável e irresistível força
de atração, sem conhecer previamente o roteiro
de sua árdua e arriscada peregrinação,
fez-se ao mar rumo às terras reveladas por Cabral.
Em meio à longa viagem, o santo arrábido, absorto
em orações e preces efusivas diante do painel
de Nossa Senhora da Penha de Paris – provavelmente uma
das grandes obras de Arte atribuídas ao gênio
de Rafael
Sanzio – surpreendeu-se em dado momento com o toque
a reboque do nauta que tomara a responsabilidade o comando
do navio.
E logo depois a frágil embarcação mergulha
em espesso nevoeiro, o vento raivoso faz crescer assustadoramente
as vagas. Desencandea-se a tempestade. Vagalhões impetuosos,
violentos quebram-se no costado da nau, já desarvorada
e quase a desconjuntar-se aos fortes abalos, aos tremendos
solavancos.
Na iminência de um naufrágio, o virtuoso servo
de Maria Santíssima deixa o seu camarote em socorro
aos que, em gritos alucinantes, presos de terror pânico
ante o pavoroso espetáculo de um vendaval, subiam as
escotilhas para pedir graças ao Deus Todo Poderoso.
E quando aguardavam ajoelhados, a sentença da sorte,
eis que Palácios, impávido, sereno e forte,
assoma ao convés e ali entre os seus desesperados companheiros
de viagem, ergue os olhos para o alto e balbucia humildemente
uma fervorosa prece à Rainha do Céu, finda a
qual atira sobre as ondas encapeladas o seu manto.
Assim, pela força de sua fé, de sua devoção,
conseguiu o guapo sacerdote aplacar a cólera de Netuno
e, conjurando o desastre iminente, restabelecer a paz nos
corações de quantos, entre lágrimas e
soluços, aos seus pés se reverenciavam, beijando-lhe
carinhosamente as mãos.
Volta o piedoso Frei Palácios ao seu genuflexório
e todos os passageiros, refeitos dos grandes sobressaltos,
beneficiados pelo milagre da salvação de suas
vidas, tributam-lhe respeitosas homenagens entre preces e
agradecimentos a Bondade infinita de Deus.
E então, serenados os ânimos, o navio perdido
na imensidão dos mares, velas rizadas, prossegue a
sua viagem em rumo desconhecido, escrevendo sobre o verde
glauco das águas o roteiro desejado pelo Santo Mensageiro
de Maria Santíssima.
Frei Palácios, nas suas discretas manifestações
à intrépida tripulação (constituída
de verdadeiros fenícios na habilidade e na bravura)
da caravela, já então resguardada da catástrofe,
revela confiança absoluta no sucesso feliz dos seus
desinios, fossem quais fossem os perigos, os sacrifícios
a enfrentar.
E sabia com firme certeza de que não muito distante
estava o dia em que os seus olhos, maravilhados, sob as benções
cariciosas do Cruzeiro do Sul, alcançariam a Terra
predestinada!
O virtuoso filho da Península Ibérica trazia
das plagas lusitanas uma missão muito elevada (que
se atribuía Divina), tão humanitária
quanto perigosa, que era então a propagação
das doutrinas cristãs nas selvas do novo Continente
abençoado por Deus.
O milagre operado em alto mar sobre ondas furibundas exaltou
as suas grandes virtudes, a serenidade do seu espírito,
o seu devotamento à causa santa, tornou-o digno do
respeito, do carinho e da veneração de quantos
o acompanhavam na atribulada viagem. E por isso, o levita
da paz e da caridade passou a ser tratado a bordo como um
santo.
A sua crença em Deus não lhe permitia o menor
desânimo no exercício do seu apostolado.
Jamais tergiversou, nem mesmo quando as rajadas enfurecidas
e arrasadoras ameaçavam transformar o mar em leito
fúnebre do seu corpo, em sarcófago impenetrável
das relíquias de sua profunda Devoção.
A grandiosa singradura da arca sagrada em que o valoroso mensageiro
de Maria Santíssima se transportou ao Novo Mundo, ficou
mareada na História como um dos fatos que constituem
verdadeira lição de Fé, Abnegação,
Altruísmo e Perseverança, com a qual muito se
exalta a alma católica do povo desse abençoado
Espírito Santo.
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