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Ano de 1552 e 1553– Por Basílio Daemon

Vista do Colégio de Santigo, 1860

1552. Achando-se apaziguados os índios que infestavam as matas da capitania, e que, como vimos, não deixavam de incomodar os povoadores, tendo Vasco Fernandes Coutinho dado certas providências a satisfazer as necessidades de sua donataria, mas reconhecendo a precisão de mais colonos para povoar as terras do Espírito Santo, resolveu-se a partir para Portugal, a fim de angariar recursos e prover-se de outros objetos necessários. Assim decidido, entrega o governo da capitania a D. Jorge de Menezes, para que como seu lugar-tenente ficasse encarregado de acudir às necessidades dela durante a sua ausência tendo-se neste mesmo ano embarcado pela segunda vez para Portugal.(51)

1553. Em janeiro deste ano parte da Bahia o governador Tomé de Souza a visitar as capitanias e costas do sul do Brasil, vindo em sua companhia o padre Manoel da Nóbrega, provincial dos jesuítas, acompanhado do padre Antônio Pires, o qual vinha também a visitar as colegiadas, trazendo consigo quatro órfãos para agregar a um dos seminários.(52) Chegaram a Porto Seguro, onde se achava o padre José de Aspilcueta Navarro, e dali vieram aportar nesta capitania do Espírito Santo, onde se demoraram alguns dias, tendo encontrado funcionando o seminário de meninos que era presidido pelo padre Afonso Brás, instituindo nessa ocasião a Confraria do Menino Jesus, em virtude de bulas pontificais que lhe concediam essa faculdade.(53) Essa confraria persistiu por muitos anos até que, afinal, desapareceu. Daqui prosseguiu o governador Tomé de Souza e o padre Nóbrega sua viagem para o sul, ao Rio de Janeiro e São Vicente, demorando-se este em Piratininga algum tempo, onde entranhou-se pelas matas a catequizar os índios mandando antes à Bahia o padre Leonardo Nunes a buscar outros companheiros para o ajudar.

Idem. Chega ao Brasil a 13 de julho deste ano, aportando à Bahia, uma frota trazendo o novo governador do Brasil, D. Álvaro da Costa, e os jesuítas padre Luís da Grã, que mais tarde foi provincial e aqui esteve,(54) o padre Brás Lourenço,(55) que pouco depois para aqui veio a substituir Afonso Brás, o padre Ambrósio Pires e mais quatro irmãos – Antônio Blasques, João Gonçalves, Gregório Serrão e o grande José de Anchieta, célebre taumaturgo a quem esta província e o Brasil tanto devem pela catequese e civilização dos índios.

Idem. Em cumprimento às ordens recebidas do vice-provincial dos jesuítas padre Manoel da Nóbrega, que se achava em Piratininga na capitania de São Vicente, sai da Bahia no mês de outubro uma embarcação acompanhada de outra menor, trazendo a seu bordo o padre Leonardo Nunes, imediato ao padre Nóbrega, trazendo consigo os padres Brás Lourenço, Vicente Rodrigues e mais outros quatro irmãos, entre eles José de Anchieta. Chegando as embarcações aos Abrolhos sofreram tal temporal, a ponto de serem quebrados os mastros, rasgadas as velas, perdidas as âncoras e batéis, e depois de muitos trabalhos e perdida uma embarcação, mas todos salvos, foram dar a Caravelas, onde a embarcação subsistente, depois de consertada das avarias que sofrera, dali partiu e veio aportar a esta capitania no mês de dezembro, trazendo os ditos sacerdotes. Demoraram-se aqui alguns dias, ficando nesta capitania o padre Brás Lourenço em lugar do padre Afonso Brás,(56) a fim de continuar na catequese, ensinamento dos meninos, levantamento do convento e exercícios espirituais. Partiu, pois, a embarcação com o padre Afonso Brás em direitura a São Vicente, onde chegou a 24 de dezembro do mesmo ano. Há aqui um fato importante a notar e este é a confusão que existe em nossos escritores e historiadores a respeito dos dois padres jesuítas Afonso Brás e Brás Lourenço, visto o padre Afonso Brás só ter estado aqui dois anos e tanto, desde 1551 a 1553, unicamente dando princípio a uma capela e dirigindo um seminário, partindo para a capitania de São Vicente com o padre Leonardo Nunes onde dedicou-se à construção de um colégio, pedindo esmolas para esse fim, trabalhando de carpinteiro, e até em fazer taipas; pois dele e do irmão Mateus Nogueira, que daqui partira e ali morrera em 1559, é que introduziu-se na ordem o costume de serem aproveitados os diversos ofícios e artes que os mesmos padres sabiam e até os aperfeiçoando em seus trabalhos. Afonso Brás nunca mais de lá saiu nem aqui voltou, e tendo ali falecido, foi enterrado no Colégio de São Tiago que ele como outros fundaram, assim como também criado a Confraria da Caridade (Casa de Misericórdia), que tinha como imposição certa quantia àqueles que cometessem certos delitos, para o fim de ser aplicada ao dote de órfãs pobres para assim poderem se casar.

 NOTAS

51 Teixeira de Oliveira discorda de Daemon citando Capistrano, para o qual Coutinho teria partido para Portugal ainda em 1550. [Prolegômenos, 79, apud Oliveira, HEES, p. 71].

52 (a) “Tomé de Souza e o padre Manoel da Nóbrega passam pela vila de Vitória e visitam o Colégio São Tiago. Janeiro de 1553.” [Leite, HCJB, I, p. 221] (b) D. João Nery menciona o padre Francisco Pires e não Antônio Pires: “...veio em visita à nova missão da capitania, trazendo consigo o padre Francisco Pires e quatro órfãos vindos de Portugal.” [Carta pastoral, p. 78]

53 “Quanto ao colégio, passando Nóbrega pelo Espírito Santo, no último trimestre de 1552, já encontrou a funcionar uma Confraria dos Meninos de Jesus, à semelhança da Bahia e S. Vicente. Frequentavam-no crianças mamelucas e índias, sob a direção de Afonso Brás.” [Leite, HCJB, I, p. 223]

54 Segundo Teixeira, Luís da Grã teria vindo para o Espírito Santo no ano de 1573. [HEES, p. 116] 55 “Chega na capitania do Espírito Santo vindo da Bahia, o padre Brás Lourenço junto a outros clérigos.” [Leite, HCJB, I, p. 217]

56 “Padre Leonardo Nunes, [...], levou consigo o padre Afonso Brás, deixando à frente da casa do Espírito Santo o padre Brás Lourenço.” [Nery, Carta pastoral, p. 78] 

 

Nota: 1ª edição do livro foi publicada em 1879
Fonte: Província do Espírito Santo - 2ª edição, SECULT/2010
Autor: Basílio Carvalho Daemon
Compilação: Walter de Aguiar Filho, maio/2019

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