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Carta Foral a Vasco Fernandes Coutinho - de 07 de outubro de 1534

Primeiro Donatário da Capitania do ES - Vasco Fernandes Coutinho

APRESENTAÇÃO

Já disseram que a carta de Pero Vaz de Caminha é a certidão de nascimento do Brasil. Em relação ao Espírito Santo, podemos considerar como sua certidão, a Carta Foral do Rei Dom João III ao fidalgo Vasco Fernandes Coutinho donatário da Capitania do Espírito Santo. E é essa Carta Foral, que estamos divulgando neste 3.° número da Coleção "Documentos" do Arquivo Municipal, imbuídos pela mesma preocupação e pelo mesmo espírito, que nos levaram a destacar, por ocasião dos festejos relativos ao sesquicentenário da independência pátria, a participação de Vila Velha no reconhecimento de nossa independência e posteriormente, a "Pequena História Administrativa do Município de Vila Velha".

A carta data de 7 de outubro de 1534 e foi redigida por Pero de Mesquita. Agora, no aniversário do Município, voltamos a torná-la pública, para que as novas gerações cada vez mais se conscientizem da necessidade de preservar o nosso patrimônio histórico.

Vila Velha, 23 de maio de 1974

Solon Borges Marques PREFEITO MUNICIPAL

 

 

CARTA FORAL A VASCO FERNANDES COUTINHO - DE 07 DE OUTUBRO DE 1534  

 

Dom João...  a quantos esta minha carta virem faço saber que eu fiz doação e mercê a Vasco Fernandes Coutinho, Fidalgo de minha casa, da Capitania de cincoenta léguas de terra na minha costa do Brasil para ele e todos os seus filhos, netos e herdeiros e sucessores, de juro e de herdade para sempre segundo mais inteiramente é contido é declarado na carta de doação que da dita terra lhe tenho passada; e  por ser muito necessária haver ali jornal dos ditos foros e tributos e coisas que se na dita terra hão de pagar, assim do que a mim e a coroa de meus Reinos, pertence, como as que pertencem ao dito capitão, por bem da dita doação. Eu... houve por bem de mandar ordenar e fazer o dito foral na forma e maneira seguinte:

Item primeiro - SESMARIAS - o capitão da dita capitania e seus sucessores darão e repartirão todas as terras dela, de Sesmaria a qualquer pessoa de qualquer qualidade e condição que, sejam (contanto que sejam cristãos), livremente, sem fora nem tributo algum, somente o dízimo que serão obrigados de pagar a Ordem do Mestrado do Nosso Senhor Jesus Cristo, de tudo o que nas ditas terras houver, as quais sesmarias darão na forma e maneira que se contém em minhas ordenações e não poderão tomar terra alguma de sesmarias, para si, nem para sua mulher, nem para o filho do herdeiro da dita capitania, e, porém pode la-ão dar aos outros filhos, se os tiver, que não forem herdeiros da dita capitania e assim aos seus parentes como em sua doação contêm (carta de doação). E se algum dos filhos não for herdeiro da dita capitania ou qualquer outra pessoa tiver alguma sesmaria, por qualquer maneira que a tenha, que vier a herdar a dita capitania, será obrigado, do dia que nela suceder, a um ano primeiro seguinte, de alargar e trespassar (transferir) a tal sesmaria a outra pessoa; e não a trespassando no dito tempo, perderá para mim a dita sesmaria com mais outro tanto preço quanto ela valer; e, por esta mando ao meu feitor ou almoxarife que na dita capitania por mim estiver, que em tal caso lance mão pela dita terra por mim e faça assentar nos livros dos meus próprios e faça execução pela avalia dela e não fazendo assim, hei por bem que perca seu ofício e lhe pague de sua fazenda, outro tanto quanto montar na avalia da dita terra.

Item Segundo - DO QUINTO - havendo nas terras da dita capitania, costa, mares, rios e baias, qualquer sorte de pedrarias (pé olas, ouro, prata, cobre, coral, estanho, chumbo ou outra qualquer sorte de metal) pagar-se-ão a mim o quinto, do qual haverá o capitão a sua dizima, como se contém em sua doação e ser lhe-á entregue a parte que na dita dizima montar, ao tempo que se o dito quinto por meus oficiais, para mim arrecadar.

Item Terceiro - ESPECIARIAS - o pau de Brasil da dita Capitania e assim qualquer especiaria ou drogaria de qualquer qualidade, que seja que nela houver pertencerá a mim e será sempre meu e de meus sucessores sem o dito capitão nem outra alguma pessoa poder tratar nas ditas cousas nem em alguma delas lá na terra, nem as poderão vender nem tirar para meus reinos e senhorios, nem para fora deles, e sobre penas de quem o contrário fizer perder por isso toda sua fazenda para a coroa do Reino e ser degredado para a Ilha de São Tomé para sempre, e, porém, quanto ao Brasil (pau Brasil) hei por bem que o dito capitão e assim os moradores da dita capitania se possam aproveitar dele no que lhe ai na terra for necessário, não sendo em o queimar, porque queimando incorrerão nas sobreditas penas.

Item Quarto - PESCADO - de todo pescado que se na dita capitania pescar, não sendo a cana, se pagará a dizima à ordem (de Cristo), que é de dez peixes, um e além da dita dizima hei por bem que se pague mais meia dizima que é de vinte peixes, um, a qual meia dizima o capitão da dita capitania haverá e arrecadará para si por quanto lhe tendo dela feito mercê.

Item Quinto - EXPORTAÇÃO - querendo o dito capitão e moradores povoadores da dita capitania trazer ou mandar para si ou poroutrem a meus Reinos ou senhorios quaisquer sorte de mercadorias que na dita terra e partes dela houver tirando escravos e as cousas que atrás são defesas podê-lo-ão fazer recolhidos ou agasalhados em quaisquer portos cidades, vila ou lugares dos ditos meus Reinos e senhorios em que vierem aportar, e não serão constrangidos descarregas suas mercadorias nem as vender em alguns dos ditos portos, cidades, vilas contra suas vontades se para outras partes antes quiserem ir fazer seus proveitos, e por digo querendo as vender-nos, ditos lugares de meus Reinos ou senhorios não pagarão delas direitos alguns, somente a coisa o que venderem posto que pelos forais Regimentos ou costumes dos tais lugares, fossem obrigados a pagar outros direitos ou tributos, e poderão os sobreditos vender suas mercadorias a quem quiserem e levá-las para fora do Reino se lhes bem vier sem embargo dos ditos forais, Regimentos ou costumes que e contrário haja.

Item Sexto - COMÉRCIO- Todos os navios de meus Reinos e senhorios que a dita terra forem com mercadorias de que já tenham pagos os direitos em minhas alfândegas mostrarem disso certidão dos meus oficiais dela não pagarão na dita terra do Brasil direito algum, e se lá carregarem mercadorias da dita terra para fora Reino, pagarão de saída, dizima e o capitão haverá sua redizima,  como se contém em sua doação; e porém trazendo as tais mercadorias para meus Reinos ou senhorios, não pagarão da saída cousa alguma e estes que trouxerem as ditas mercadorias para meus Reinos ou senhorios, serão obrigados dentro de um ano, levarem ou enviar, à dita capitania, certidão dos oficiais de minha alfândega, do lugar onde descarregaram de como descarregaram em meus Reino e as qualidades das mercadorias que descarregaram e quantas eram e não mostrando a dita certidão dentro do dito tempo pagarão a dizima das ditas mercadorias ou daquela parte delas que nos ditos meus Reinos ou senhorios não descarregarem, assim, e da maneira que hão de pagar a dita dizima na dita capitania dará lá fiança ao que montar na dita dízima, para dentro ao dito tempo de um ano, mandar certidão de como veio descarregar nos meus Reinos ou Senhorios e não mostrando a dita certidão de como veio descarregar nos meus Reinos ou Senhorios no dito tempo, se arrecadará e se haverá para mim as ditas dízimas pela dita fiança.

Item Sétimo - COMÉRCIO - quaisquer pessoas estrangeiras que não forem naturais de meus Reinos ou Senhorios que na dita terra levarem ou mandarem levar quaisquer mercadorias, posto que as levem de meus Reinos ou senhorios, e que cá tenham pago a dizima pagarão lá da entrada dizima a mim das mercadorias que assim levarem, e carregando na dita capitania mercadorias da terra para fora, pagarão assim mesmo dízima da saída das tais mercadorias das quiais dizimas o capitão haverá sua redízima segundo se contém em sua doação e ser-lhe há a dita redízima entregue por seus oficiais ao tempo que as ditas dízimas para mim arrecadarem.

Item oitavo - MUNIÇÕES - de mantimentos, armas, artilharias, pólvora, salitre, enxofre, chumbo e quaisquer outras coisas de munição de guerra que a dita capitania levarem ou mandarem levar o capitão e os moradores dela ou quaisquer outras pessoas, assim naturais como estrangeiros hei por bem que se não paguem direitos alguns e que os sobreditos possam livremente vender todas as ditas cousas e cada uma delas na dita capitania ao capitão e moradores dela que forem cristãos e meus súditos.

Item nono - COMERCIO COM ÍNDIOS - todas as pessoas assim de meus Reinos e Senhorios como de fora deles, que a dita capitania forem não poderão tratar nem comprar nem vender cousa alguma com os gentios da terra e tratando somente com o capitão e povoadores dela, comprando e vendendo e resgatando com eles, tudo o que puder haver, e quem o contrário fizer hei por bem que perca em dobro toda a mercadoria e cousas que com os ditos contratarem de que será a terça parte para minha câmara e a outra terça parte para quem os acusar e a terça, para o espiritual (religioso) que na dita terra houver; e, não o havendo aí será para a fábrica da igreja dela.

Item décimo - CARREGAMENTO - quaisquer pessoas que na dita capitania carregarem seus navios serão obrigados antes que comecem a carregar e antes que saiam fora da dita capitania, de o fazerem saber ao capitão dela para prover e ver se não tirem mercadorias defesas, nem partirão assim mesmo da dita capitania sem licença do dito capitão; e não o fazendo assim ou partindo sem a dita licença, perder-se-ão, em dobro para mim todas as mercadorias que carregarem, posto que (ainda que) não sejam defesas - e isto porem se entenderá em quanto na dita capitania não houver feitor ou oficial meu, deputado para isso porque havendo ai, a ele se fará saber o que dito está, e a ele pertencerá fazer a dita diligência e dar as ditas licenças.

Item décimo primeiro - COMÉRCIO ENTRE AS CAPITANIAS: O capitão da dita capitania e os moradores e povoadores dela, poderão livremente tratar, comprar, vender suas mercadorias, com os capitães das outras capitanias, que tenho providos na dita costa do Brasil, e com os moradores e povoadores delas, a saber, de umas capitanias para as outras das quais mercadorias e compras e vendas não pagarão uns nem outros direitos alguns.

Item décimo segundo - COMÉRCIO COM OS INDIOS: Todo vizinho e morador que vier na dita capitania e for feitor ou tiver companhia com alguma pessoa que viva fora dos meus Reinos e Senhorios não poderá tratar com os brasis da terra, posto que sejam cristãos, e tratando com eles, hei por bem que percam toda a fazenda em que tratar, da qual será um terço para quem o acusar e os dois terços para as obras dos muros de dita capitania.

Item décimo terceiro - ALCAIDES - Os alcaides-mores da dita capitania e das vilas e povoações dela, havendo e arrecadarão por si, todo os foros, direitos e tributos que meus Reinos e Senhorios, por bem de minhas ordenações, pertencem e não concedidos aos alcaides-mores.

Item décimo quarto - BARCAGEM - Nos rios da dita capitania em que houver necessidade de por barca para a passagem deles, o capitão as porá e levará delas tributo...

Item décimo quinto - TABELIÃES - Cada um dos tabeliães do público e judicial que nas vilas e povoados da dita capitania em que houver será obrigado de pagar ao dito capitão, quinhentos réis de pensão em cada ano.

Item décimo sexto - SERVIÇO MILITAR - Os povoadores e moradores e povo da dita capitania serão obrigados em tempo de guerra de servir nela com o capitão se lhe for necessário - Notifico ao capitão da dita capitania que hora lhe (existe) e ao diante for e a meu feitor almoxarife e oficiais dela e aos juízes e justiças da dita capitania e a todas as outras justiças oficiais de meus Reinos e senhorios assim da justiça como da fazenda, e mando a todos em geral a cada um em especial que cumprem e façam inteiramente cumprir e guardar esta minha carta foral, assim e da maneira que sem nela contém sem lhe nisso ser posto dúvidas nem embargo algum, porque assim é a minha mercê e, por firmeza disso, mandei passar esta carta por mim assinada e selada do meu selo pendente, a qual mando que se registre no livro dos meus registros de minha alfândega de Lisboa e assim aos livros de minha feitoria da dita capitania, e pela mesma maneira se registrará nos livros das câmaras das vilas e povoações da dita capitania, para que a todos seja notório e contido neste foral e se cumpra inteiramente. Dada em a cidade de Évora, aos sete dias do mês de outubro do nascimento de Nosso Senhor Jesus Cristo de mil quinhentos e trinta e quatro. Pero de Mesquita a fêz.

 

Fonte: Prefeitura Municipal de Vila Velha, Arquivo Municipal – Coleção Documentos nº 3
Pequenas Histórias do Município de Vila Velha ou Breves Notícias sobre os Prefeitos do Município
Organização: Marlene Paula Venturim, 1974
Compilação: Walter de Aguiar Filho, maio/2014 

Vasco Fernandes Coutinho

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