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Em 1639, Frei Paulo de Santo Antônio empreendeu melhoramentos na Penha

Foto da Ladeira da Penitência, 2015 - Calçada pelo guardião Frei Paulo de Santo Antônio (eleito em 1639)

Indispensável continuava uma visita a Nossa Senhora da Penha, para todos os viajantes, em trânsito pela Capital do Espírito Santo, costume aliás perpetuado até os nossos dias. Dentre os registros antigos dessas romagens de Fé, distingue-se, além de a dos jesuítas, já mencionada, a de Dom Luís de Céspedes Xeria, quando vinha da Europa, a fim de assumir o Governo do Paraguai, na segunda quinzena de Janeiro de 1628. Cumpria um voto de subir, descalço, a ladeira da Penha. Foi agradecer à Virgem Maria ter salvo a sua vida, na acidentada viagem durante a qual, nos Abrolhos, na costa baiana, quase naufragara a possante canoa, em que se arriscara a bordejar até o Rio de Janeiro.

De certo, sua Relacion de Viage não representa o mais antigo documento sobre a Ermida das Palmeiras; precederam-no os relatos de Fernão Cardim, Anchieta e Simão de Vasconcelos, embora de publicação póstuma.

Eleito; em 1639, Guardião do Convento de São Francisco, em Vitória, Frei Paulo de Santo Antônio empreendeu melhoramentos na Penha: — reformou a Ermida das Palmeiras, transformando-a, então, em capela-mor, porque levantou a nave ou corpo da igreja, com barra de azulejos e ampliou a sacristia.

Ainda sob a direção do mesmo sacerdote, calçou-se a ladeira, que foi dividida em lances, entremeados de vãos, já referidos.

Que trabalho insano e magnífico! Até hoje, se tivermos o fervor de renunciar ao conforto de um automóvel e, mesmo, à vantagem da nova estrada de rodagem, poderemos calcular o sacrifício arrostado pelos empresários dessa obra secular, para o transporte e o nivelamento dos blocos, polidos, agora, pelo desfile constante dos piedosos romeiros!

E o povo imaginou: —

Na ladeira do Convento,

tem um cravo,

pra se abrir; eu quisera ser sereno,

para; no cravo, cair.

 

Multiplicam-se as variantes: — Na calçada do Convento, Na subida do Convento, etc.

Outras vezes, é o desânimo, conseqüente do sacrifício da escalada, que inspira uma súplica: —

 

Fui ao Convento da Penha,

todos subiram, eu fiquei;

dai-me a mão, Nossa Senhora,

que eu também subirei.

 

E qualquer indireta a um gracejo desagradável: —

 

Lá vem a Lua saindo,

redonda como um vintém;

Nossa Senhora da Penha

dai vergonha a quem não tem.

 

A 3 de Maio de 1643, Frei Paulo iniciou a construção da nave, conforme registramos atrás, melhoramento concluído, em 1645, após sua transferência da guardiania de São Francisco para outra casa da Ordem. Colocou-se então a imagem de Nossa Senhora da Penha no altar-mor, no dia 25 de Abril, talvez para a festa que, anualmente, atraía já os devotos da Virgem Santíssima.

Resultou, de certo, essa construção da necessidade inadiável de aparelhar-se o templo, de modo a corresponder ao Decreto de S. S. Padre Urbano VIII, em data de 23 de Março de 1630, constituindo a SS. Virgem Maria, sob o título da Penha, a primeira Protetora da Capitania do Espírito Santo.

Uma das conseqüências mais proveitosas da viagem singular, verdadeira epopéia, do Custódio Frei João Batista, que, a pé excursionou da Bahia até Santos, em visita às residências da Ordem (1649), foi a inspeção realizada no Espírito Santo. Verificou, de certo, o desenvolvimento da Capitania, em todos os sentidos, e o vulto crescente das romarias à Penha. Resolveu, então acatar o desejo dos seus confrades, relativamente a um convento, no Outeiro. Autorizou lhes, por isso, providências quanto aos materiais necessários a essa construção.

Cumpriu-se tudo, com o maior contentamento, mormente pelo Irmão leigo Frei Francisco da Madre de Deus o mesmo religioso que teria de assistir ao saque da capelinha pelos holandeses, fato já referido. (1653)

Com o falecimento de Frei João Batista, a 13 de janeiro de 1650, no Convento de Santos, seu substituto Frei Sebastião do Espírito Santo, Guardião, no Rio de Janeiro tendo de ir à Bahia de Todos os Santos, para celebrar a primeira Junta, passou pela Capitania do Espírito Santo. Investigou, na Penha, a configuração do rochedo, para a construção planejada. No Salvador, a 21 de Novembro do mesmo ano, a Congregação, ou Junta, resolveu aprovar a planta do cenóbio, com nove quartos, ou celas, para os religiosos, e duas, para hóspedes, corredores, cozinha, dispensa, etc., de acordo com a topografia do lugar. Simultaneamente, nomeou Frei Francisco da Madre de Deus, Superior da casa recém-instituída.

Segundo o novo Custódio, os alicerces do Convento deviam ser firmados como os de uma fortaleza, ou castelo, sobre as anfractuosidades do rochedo, aproveitando-se todas as cavidades. Foi ao Rio de Janeiro, pedir ao Governador uma subvenção, para essa obra cuja planta teve o cuidado de levar-lhe. Salvador Corrêa de Sá garantiu-lhe uma ordinária anual, conforme veremos, adiante.

Frei Francisco da Madre de Deus era o Enfermeiro das Contas Brancas, figura que se tornaria lendária, em virtude do seu piedoso costume: — dedilhar um rosário branco, orando, orando sempre, nas caminhadas pelas ruas de Vitória. Depois de muito trabalhar pelo então Convento da Penha, cuja pedra fundamental foi lançada, em 1651, pelo mesmo Custódio, Frei Sebastião do Espírito Santo, em 1653, Frei Madre de Deus passou o cargo de Superior ao seu confrade Frei Nicolau de São Tomé. Faleceu, em Vitória, no ano seguinte. (1654)

Sua vida religiosa, em Vitória, está ligada à seguinte lenda capixaba: —

"Extasiado pela majestade dos cenários, atônito, pela divergência entre o viço da Natureza, a poesia dos sítios e a miséria moral dos povoadores; exausto de pregar a virtude e combater o vício, tomava do seu rosário de contas brancas e percorria os caminhos da Vila, a passos vagarosos, dedilhando-o, enquanto murmurava as palavras da Ave Maria.

Caía a tarde.

O franciscano, perseverante no seu apostolado, descia a encosta do São Francisco, passava o rosário branco à guisa de colar e badalava, pelos caminhos ainda primitivos, uma campânula enorme de metal precioso, anunciando aos habitantes a hora do Angelus.

A campânula era "o sino de ouro" de Frei Francisco da Madre de Deus.

Certa vez, desapareceu o instrumento magnífico. Frei Francisco não descia do Convento.

Procuraram-no.

— Eu? Para que badalar o sino de ouro, no meio de corações de ferro? Basta que a voz do campanário da matriz ecoe nas selvas e suba às estrelas. O sino de ouro jaz sepultado, no solo de Vitória. E será encontrado somente, quando, no Espírito Santo, todos souberem ler os livros que louvam a Deus e ensinam aos homens os preceitos da Honra, da Lealdade e da Justiça.

 

Fonte: O Relicário de um povo – O Santuário de Nossa Senhora da Penha, 2ª edição, 1958
Autora: Maria Stella de Novaes
Compilação: Walter de Aguiar Filho, janeiro/2017

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