Jerônimo Monteiro - Capítulo XII
A Escola Complementar, anexa à Escola Normal, tinha a finalidade de preparar os alunos para o ingresso no Curso Normal, independente de exame vestibular, exigido apenas, para os candidatos que não tivessem aquele curso.
Repetimos com o Dr. Jerônimo: — Não pararam aí os esforços do Governo, empenhado em impulsionar o desenvolvimento de instrução pública.
O Ginásio Espírito-Santense, criado em Lei n° 460 de 24 de outubro de 1906 pelo Presidente Henrique da Silva Coutinho, recebeu a melhor atenção do Dr. Jerônimo, coadjuvado, aliás, pelo irmão, o Bispo Diocesano. A 9 de outubro de 1908, chegou-lhe a notícia de sua equiparação, por ato do Governo Federal, assinado no dia 8, para o que muito concorreram o interesse do Presidente do Estado e os esforços do Senador João Luís Alves.
O Colégio Nossa Senhora Auxiliadora muito deve ao Dr. Jerônimo, que, pelo Decreto n° 335, de 24 de abril de 1909, o equiparou à Escola Normal do Estado, sujeito ao seu regulamento e aos mesmos programas de estudo, sob a fiscalização do Inspetor Geral do Ensino. O Decreto de 24 de abril teve sua confirmação na Lei n° 642, de 21 de dezembro do mesmo ano, em atenção a um requerimento firmado pelo Sr. Bispo Diocesano.
Já estava o Colégio sob a direção da Irmã Maria Horta, que substituíra a Irmã Filomena Desteillou, sua fundadora, e que viajara a 19 de fevereiro do mesmo ano, transferida para o Hospital Central do Exército.
A equiparação do Colégio Nossa Senhora Auxiliadora à Escola Normal veio trazer um surto de desenvolvimento ao querido educandário da juventude feminina espírito-santense, porque, de todos os recantos do Estado afluíram alunas para o seu internato. E, assim, necessário tomou-se a ampliação do velho prédio, ex-convento de Carmelitas. Antes, porém, que se empreendesse as obras e, mesmo se festejasse a Lei de 21 de dezembro, dura provação caiu sobre o pequeno mundo que ali edificava uma obra de virtude e cultura, em benefício da sociedade espírito-santense. Baseado em que o vetusto edifício pertencia à União, porque servira de alojamento à Força de Linha, no século XIX, o Ministro da Guerra, a 9 ou 10 de maio de 1909, exigia que as Irmãs desocupassem o prédio em 10 dias! Calculemos o terror e a tristeza das religiosas!... Na cidade, o clamor abalava o povo: — Querem tomar o Carmo! E a sociedade deu a melhor assistência às Irmãs.
Estava Dom Fernando em Missões na paróquia de Santa Isabel, quando recebeu o telegrama que reclamava sua presença imediata na Vitória. Mas o único transporte era a Estrada de Ferro Leopoldina, que se tomava na Estação Germânia, atualmente Domingos Martins. O tempo corria! Felizmente, porém, o encarregado da ingrata medida só podia viajar de navio, pois naquela época não existiam aviões, e assim Dom Fernando, que chegara no dia 13, empenhou-se com o Presidente do Estado, recorreu ao Sr. Núncio Apostólico e, pelo advogado Thiers Veloso, recorreu à Justiça, contra o Governo Federal. Desse modo, quando o emissário chegou a Vitória, nada pôde fazer, senão esperar a decisão suprema, quanto ao direito da Igreja, pois se tratava de um imóvel da Diocese.
E o caso foi entregue ao Dr. André Faria Pereira, para resolvê-lo, no Rio de Janeiro, pois o Sr. Bispo e o Dr. Jerônimo haviam conseguido dilação do prazo e permissão para que as Irmãs prosseguissem na sua tarefa educativa. É certo que o Dr. Jerônimo prestou toda a assistência às Irmãs; visitava-as, sempre que possível. E, numa dessas visitas, encontrou-se ali com o irmão, Cel. Antônio, mas em atitude compatível com o decoro social. Não é exato que estivesse de revólver em punho. Jamais um Monteiro, mesmo na Fazenda Monte Líbano, em meio de trabalhadores e longe de recurso policial, empunhara uma arma de fogo.
Aliás, o Cel. Antônio não era então Presidente do Congresso Legislativo, nem mesmo Deputado Estadual; exercia apenas, interinamente, o cargo de Oficial de Gabinete do Presidente do Estado, em substituição ao Dr. José Bernardino Alves Junior, em férias regulamentares.
Resolvida a questão do Carmo, entrou o prédio em reforma e ampliação, para receber as numerosas internas e abrigar as órfãs do Asilo Coração de Jesus, fundado pelo Sr. Bispo e a Irmã Maria Horta, de acordo com as normas das congregações religiosas. Uma subscrição popular foi a primeira fonte de recursos, a partir de 2 de novembro de 1909. As alunas da Escola Normal promoveram uma tômbola em benefício do Asilo, e a sociedade espírito-santense provou, mais uma vez, seu coração aberto às obras sociais de assistência aos que sofrem. Mas, se Dom Fernando se desvelara pelos pobres e órfãos, o coração do grande Presidente voltava-se, de igual, às criancinhas que na Santa Casa abriam os olhos à vida, privadas de carinho materno, ou viviam aos cuidados das Irmãs, daquela inesquecível Irmã Luísa Pirnay e, no Carmo, teriam o Asilo Coração de Jesus.
Daquelas trataremos quando chegarmos ao capítulo sobre a Santa Casa, ao passo que, agora, registraremos a providência tomada pelo Dr. Jerônimo para a manutenção do novo Instituto de Assistência. A Lei n° 646, de 22 de dezembro de 1909, dizia: "Fica o Governo do Estado autorizado a conceder 80.000$000 (oitenta contos de réis), em apólices de 5% ao ano, para o patrimônio do Asilo Coração de Jesus, sendo as ditas apólices inalienáveis, e revertendo ao Estado, em caso de extinção ou transformação do Asilo em outro qualquer estabelecimento, embora de caráter filantrópico". Assegurava, assim, uma renda anual de 4:000$000 ao novo instituto de caridade, depois de haver colaborado na reforma e ampliação do prédio.
A reconstrução do Carmo foi confiada ao jovem arquiteto André Carloni, que lhe acrescentou mais um andar e a varanda interna.
Finalmente, a 27 de novembro de 1910, num belíssimo dia, com a presença do Dr. Jerônimo e da sociedade vitoriense que, jubilosa, compareceu ao Carmo, Dom Fernando benzia o prédio reformado. Em seguida, festejados foram dois expressivos acontecimentos: a equiparação do curso normal ao instituto do Estado e a inauguração do Asilo Coração de Jesus.
A Irmã Horta chorava!...
Dom Fernando e Dr. Jerônimo abraçavam as orfãzinhas...
Elas cantaram o Hino a Dom Fernando e o Hino
AO DR. JERÔNIMO
I
Nossas almas estremecem.
De real contentamento,
Nesta hora, neste dia.
Neste ditoso momento.
Filho do Espírito Santo,
É glória sua, também. Salve, oh, nosso Protetor,
Da paz amigo e do bem! CORO
II
Dois sóis, hoje contemplamos,
Um dos Céus, no puro anil.
Outro, dentro desta casa.
Mais brilhante, mais gentil.
Filho do Espírito Santo, etc.. CORO
III
Mais brilhante e mais gentil.
Pela áurea inteligência
Peregrina e criadora,
Que lhe deu a Providência. CORO
IV
Do Governo seu à sombra.
Vai sereno e vai seguro,
O belo Estado marchando
Para o mais belo futuro. CORO
V
Adorável mão, que rege
Mundos sem fim, nos espaços,
Encha-lhe a vida de bênçãos.
De flores lhe cubra os passos. CORO
VI
O seu nome, que os fulgores
Do astro-rei ofusca e vence,
Brilha, como ouro nas páginas
Da História espírito-santense. CORO
VII
Ao festejado estadista,
A tão nobre cidadão,
Nossa homenagem sincera,
Nossa humilde gratidão.
CORO
Os dois hinos foram musicados pelo maestro Colombo Guárdia, professor de música do Colégio, que os acompanhou, ao piano. A letra era do Dr. J. J. Bernardes Sobrinho.
Notas:
A presente obra da emérita historiadora Maria Stella de Novaes teve sua primeira edição publicada pelo Arquivo Público do Estado do Espírito Santo -APEES, em 1979, quando então se celebrava o centenário de nascimento de Jerônimo Monteiro, um dos mais reconhecidos homens públicos da história do Espírito Santo.
Esta nova edição, bastante melhorada, também sob os cuidados do APEES, contém a reprodução de uma seleção interessantíssima de fotografias da época — acervo de inestimável valor estético-histórico, encomendado pelo próprio Jerônimo Monteiro e produzido durante o seu governo — que por si só, já justificaria a reimpressão, além do extraordinário conteúdo histórico que relata.
Autora: Maria Stella de Novaes
Fonte: Jerônimo Monteiro - Sua vida e sua obra
2a edição Vitória, 2017 - Arquivo Público do Estado do Espírito Santo (Coleção Canaã Vol. 24)
Compilação: Walter de Aguiar Filho, julho/2019
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