Reminiscência 1ª Parte – Memória da cidade de Nossa Senhora da Vitória (1936 -1956)
1 – 1936 A. D.
O chique era andar de bonde Circular à tarde. Em frente à Assembléia o bondinho virava os bancos e ia para o Parque Moscoso. Nos fundos da Casa Verde (Armarinhos, tecidos e miudezas) eu apanhava pequenos caranguejos que guardava numa caixa de fósforo. Íamos à Praia de Santa Helena, casa de uma tia, e quando voltávamos, à noite, na reta do Constantino, o bonde fingia ser um túnel de luz em meio à escuridão; dos mangues de Bento Ferreira voavam maruins e um chiclete ficou preso no bolso de meu capote.
Na Feira do IV Centenário da Colonização meu pai expunha Sal do Mossoró, e dava-o, ao visitante, em pequenos saquinhos carimbados. “Seu” Campos Pinha mostrava os últimos avanços dos anúncios de gás neon e dizia entusiasmado: - No Rio há uma garrafa de água Caxambu que enche um copo de luz e sonho!”
João Horta Aguirre era o melhor aluno de D. Izaltina Paolielo, e na escola do Filgueiras Dona Nenzinha dava reguadas nos relapsos. Argentina, minha tia, me ensinou a ler e escrever e eu ingressei no mundo maravilhoso da palavra impressa.
Navios davam notícias do mundo e as velhas casas das ruas Duque de Caxias e General Osório abrigavam prostitutas. No Parque Moscoso moravam as famílias ricas. No Morro Moscoso moravam as famílias pobres. Na Pedra da Cotia havia fios de alta tensão e uma caveira na lata avisava:
- Perigo!
“Seu Antônio Jacob da Libanesa vendia tecidos. Comprávamos cadernos e lápis na Tipografia Gentil e remédios na Farmácia Popular. Os secos e molhados no armazém de “Seu” João Pinheiro, que pegou fogo. As cervejas Teotônia e o vinho único vinham do Bar e Café Estrela. As bananas e a fezinha no bicho eram feitas na Quitanda de “Seu” Alípio.
No Carnaval fantasiaram-me de Conquistador de Corações e fiquei furioso quando me passaram rouge e baton. A enchente trouxe, da Fonte Grande, penicos e troncos de bananeiras e um gato morto. Rogério, meu irmão, conhecia todo o Morro e todas as jaqueiras e um dia desceu da casa da Nana com a língua pendurada. Comíamos Torta Capixaba, na Semana Santa, e Muxá nas tardes de domingo.
Meu pai me levava às regatas e torcia para o Álvares Cabral. Secretamente éramos saldanhistas. Natal, as invejas recíprocas se espalhavam pela Rua Sete, e os brinquedos alemães de pilha – carrinhos, orquestras, e até um palhaço que virava cambalhotas – ganhavam a liça. Minha mãe fazia bordados matizados que encantavam a vizinhança e relembrava o pai dela. Dr. José Horácio Costa, magistrado, abolicionista e republicano, que morreu tão cedo. Vitória sem ônibus e com poucos carros, respirávamos a brisa do mar e não sabíamos.
Nota do Site: O Termo A.D. juridicamente significa: A.D. perpetuam rei memoriam - Diligências requeridas e promovidas com caráter perpétuo, quando haja receio de que a prova possa desaparecer; para a perpétua memória da coisa.
Autor: Renato Pacheco
Fonte: Escritos de Vitória, 1- Crônicas, Vitória-ES, 1993
Compilação: Walter de Aguiar Filho,junho/2011
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