Apresentação do Livro do Gabriel Bittencourt - Por José Honório Rodrigues
O professor Gabriel Augusto de Mello Bittencourt foi meu aluno no Mestrado de História da Universidade Federal Fluminense, e, entre os muitos bons alunos que lá tive, ele se distinguiu pela paixão por saber mais, pelo entusiasmo com que se dedicava às tarefas, pela inteligência aguda nos debates, pela seriedade com que encarava os problemas da pesquisa histórica.
É um prazer apresentar este seu trabalho Alguns Aspectos da Independência no Espírito Santo, no qual traz uma significativa contribuição ao estudo da Independência nas antigas capitanias, depois províncias e estados.
Quando escrevi a minha Independência: Revolução e Contra Revolução (Francisco Alves, 1976, 5 vols.), fiz um capítulo especial sobre "A Evolução política provincial" (1° vol., p. 301-336), no qual só estudei a relação da política provincial com a nacional e não a história da Independência em cada província. Achava, em primeiro lugar, que esta tarefa cabia aos estudiosos estaduais, e em segundo lugar ser-me-ia difícil encarar o problema pela deficiência bibliográfica.
A bibliografia provincial sobre a independência em cada província é reduzida e pouco cuidada. Este trabalho contribui e muito bem para o esclarecimento da Independência no Espírito Santo.
O estudo se concentra sobre o Espírito Santo entre 1820 e 1824, tentando revelar a estrutura e a conjuntura da província na hora mesma da construção da sua autonomia.
O Espírito Santo quando foi descoberto e se iniciou sua colonização era considerado pelos primeiros cronistas como um dos que ofereciam as melhores promessas mas com o tempo, tal como a Bolívia, foi sofrendo cortes territoriais dos seus vizinhos mais poderosos, pois pela carta de doação de Vasco Fernandes Coutinho seriam capixabas Ouro Preto, São João del-Rey, Sabará e outras vilas mineiras, e Campos da antiga capitania da Paraíba ou de São Tomé estava a ele ligado à época da Independência e ficou na província do Rio de Janeiro.
A economia de sobrevivência que a dominou, muito bem caracterizada pelo autor é de uma Província isolada, pobre e sem maiores atrativos.
O trabalho, como síntese nova, baseada em fontes primárias e na bibliografia conhecida, merece ser publicado e estudado pelos estudiosos capixabas e brasileiros em geral.
Vejo o Estado tentando realizar aquilo que os primeiros cronistas viram, tal qual Gândavo, que escreveu a primeira História da Província de Santa Cruz em 1575 e dela disse: "E assim he está a mais fértil capitania e melhor provida de todos os mantimentos da terra que outra alguma que haja na costa" (ed. Annuario do Brasil, Rio de Janeiro. s. d.. 90).
Fernão Cardin, na sua Narrativa Epistolar de uma Viagem e Missão Jesuítica (ed. Brasiliana. vol. 168. 1939, 268-275) descreveu-a com muita simpatia pela sua gente e pela hospitalidade, e foi nela que ele viu e descreveu a saudação lacrimosa, que seria objeto de tanta atenção dos antropólogos. Considerou os índios "candíssimos, e vivem com muito menos pecados que os portugueses", por isso dava-lhes penitência leve e depois de absolvê-los, dizia-lhes, na língua: "xe rair tupã toçô de hirunamo" (filho, Deus vá contigo).
Gabriel Soares, a enciclopédia do século XVI, dedicou ao Espírito Santo um belo capítulo sobre as dificuldades de Vasco Fernandes Coutinho e de seu filho donatários da capitania, e escreveu que esta tinha logo ao princípio quatro engenhos, o gentio era quieto e a capitania ia avante, em termos de florescer bem, mas sua ida a Portugal e a governança de D. Jorge de Menezes travaram esse desenvolvimento inicial, pois tupiniquins e guaitacazes fizeram crua guerra, queimando-lhes os engenhos, e fazenda, e desde então a guerra impediu o seu desenvolvimento (Tratado Descriptivo do Brasil em 1587, 3a ed., vol. 117 da Brasiliana, 1938, p. 75-80).
Capixabas, como se apelidaram os seus habitantes, significa em tupi a lavoura, a roçada o que lembra os inícios prometedores.
Os anexos foram bem escolhidos com textos significativos da história daquela época, e sua bibliografia é excelente, sobretudo as fontes primárias, que somente as novas gerações de historiadores capixabas vêm consultando e valorizando suas pesquisas.
O Estado como a Universidade, e um grupo de jovens historiadores, desde Renato Pacheco a Gabriel Augusto de Mello Bittencourt, prometem fazer muito pela historiografia capixaba. Diga-se que este último apresentou em Franca, na primeira Semana de História em 1979, um "Levantamento das fontes primárias da História do Espírito Santo".
Esta historiografia que se inicia não com Francisco Alberto Rubim em 1818, mas com a "Informação que Francisco Manoel da Cunha deu sobre a capitania do Espírito Santo, & 1811" (Revista do Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro, 1842, 240) e teve a sorte de possuir contribuições importantes, como a de Ernst Wagemans, economista alemão de grande envergadura, A Colonização Alemã no Espírito Santo (Rio de Janeiro, 1949), resultado de uma viagem feita em 1939 e a de Jean Roche, professor da Universidade de Toulouse. A Colonização Alemã no Espirito Santo (Difusão Europeia, São Paulo. 1968) deve crescer e se desenvolver, com grande proveito para a história do Espírito Santo e nacional, com este pequeno ensaio que Gabriel Bittencourt revela.
Dezembro de 1980
José Honório Rodrigues
Introdução do Livro - Por Gabriel Bittencourt (autor)
Alguns aspectos da Independência no Espírito Santo foi o tema escolhido para um trabalho escrito objetivando a consecução de parte dos créditos necessários para finalização do primeiro semestre do Curso de Pós-Graduação em História, na Universidade Federal Fluminense. Como resultado de uma pesquisa feita por um iniciante em Curso de Mestrado, evidentemente, traz algumas falhas, bem como não foi nossa intenção apresentar um trabalho que esgotasse o tema, em prazo tão exíguo de pesquisa. Apenas à guisa de uma contribuição e devido à escassez de trabalhos na área é que decidimos pela publicação deste estudo.
Nosso objetivo ao propormos o presente texto baseou-se na deficiência da historiografia local e na consequente necessidade de obras para melhor interpretação da formação da sociedade capixaba, que já não mais aceita estudos concentrados nas áreas políticas e atrofiados aos setores socioeconômico.
Tal proposta assume maior proporção se atentarmos para uma das tendências atuais da historiografia brasileira que privilegia a micro história, objetivando reconstruir o próprio quadro da nossa formação, tão completo quanto possível, questionando o passado ao nível exigido pela sociedade atual.
Logo, a concepção do nosso trabalho é um estudo sobre o Espírito Santo durante o período 1820-1824, da importância significativa do processo da Independência no Espírito Santo, em uma abordagem transcendental aos limites regionais, procurando detectar-se a conjuntura e estrutura que o gerou.
Muitas pessoas ajudaram a tornar possível este estudo e/ou contribuíram para sua realização. Particularmente gostaria de agradecer ao Dr. Ron L. Seckinger, Professor de História da Universidade de North Carolina, USA, a orientação da pesquisa de fontes primárias e do trabalho monográfico, a Elmo Elton pela revisão do texto, e a Marcello e Cybelle de Ipanema pelo incentivo e apoio.
O auxílio financeiro veio do Programa Institucional da Capacitação de Docentes (PICD), convênio UFES/CAPES, que me possibilitou realizar no Estado do Rio de Janeiro o Curso de Pós-graduação em História, a nível de Mestrado.
BIBLIOGRAFIA PESQUISADA
1. Fontes primárias.
1.1. Manuscritas.
- ARQUIVO NACIONAL — RIO DE JANEIRO. Correspondência do Presidente da Província. Ministério do Reino-Espírito Santo. v. 1 1808-1820. IJJ9 356.
- AN.RJ. Id. v. 2. 1821-1823. IJJ9 357.
- ARQUIVO PÚBLICO ESTADUAL DO ESPÍRITO SANTO. Livro 21 Registro de correspondência expedida pelo Governador da Capitania a diversos. 1818-1820. Seção Governadoria.
- APE. ES. Livro 22. Registro de correspondência expedido pelo Governo da Província a diversos. 1824-1825. SG.
- APE, ES. Livro de Registro de correspondência dos Presidentes de Província. 1822-1825. SG.
1.2. Impressas.
- ARMITAGE, John, História do Brasil, notas e prefácio de Eugênio Egas. São Paulo. Martins, 1972.
- RIO DE JANEIRO (Cidade) ARQUIVO NACIONAL. As juntas governativas e a Independência. Rio de Janeiro. Arquivo Nacional Conselho Federal de Cultura, 1973 3. v.
— Id. As câmaras municipais e a Independência. Rio de Janeiro, AN/CFC, 1973 1 v.
2. Fontes secundárias.
2.1. Sobre o Espírito Santo.
- DAEMON. B. C., Província do Espírito Santo, sua descoberta, história cronológica, sinopse e estatística. Vitória, Tipografia do Espírito-santense, 1879.
- MARQUES, C. A., Dicionário histórico, geográfico e estatístico da Província do Espírito Santo. Rio de Janeiro. Tipografia Nacional, 1879.
- NOVAES, M. S. — História do Espírito Santo. Vitória. FEES, (s/d).
- OLIVEIRA, J. T. — História do Estado do Espírito Santo. 2 ed. Vitória. FCES. 1975.
2.2. Gerais.
- HOLANDA, S.B. (dir.) História geral da civilização brasileira. 3 ed. São Paulo, DIFEL, 1970.
- MOTA, C.G. (org.) 1822: Dimensões. São Paulo, Perspectiva, 1972.
- FURTADO, Celso - Formação econômica do Brasil. 14 ed. São Paulo, Nacional, 1976.
- PRADO JÚNIOR, C. - História econômica do Brasil. 19 ed. São Paulo, Brasiliense, 1976.
- RODRIGUES, José Honório, - Independência: revolução e contra-revolução. Rio de Janeiro, F. Alves, 1975.
- CALMON, Pedro, História do Brasil. 7 v. Rio de Janeiro, José Olympio, 161.
- SODRÉ, N. W. - Formação histórica do Brasil. 9 ed. Rio de Janeiro, Civilização Brasileira, 1976.
- ROCHA POMBO, História do Brasil. São Paulo, Melhoramentos, 1948.
- RODRIGUES, José Honório, Teoria da História do Brasil. Introdução metodológica, São Paulo, Companhia Editora Nacional, 1969.
- Id. A pesquisa histórica no Brasil.
VIANNA, Hélio, História do Brasil. São Paulo, Melhoramentos, 1967. 3 ed. 2 v.
Fonte: Espírito Santo - Alguns Aspectos da Independência 1820/1824 - 2ª Edição - Instituto Histórico e Geográfico do Espírito Santo,1985
Autor: Gabriel Bittencourt
Compilação: Walter de Aguiar Filho, maio/2022
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