Arquitetos, Pintores e Artistas – Por Serafim Derenzi
Dois erros foram cometidos pelos responsáveis dos "Melhoramentos de Vitória": falta de plano diretor e ausência de arquiteto, para delineamento morfológico do projeto propriamente a se cumprir. Os engenheiros patrícios, até a terceira década desta centúria, tinham, na maioria, mentalidade ferroviária. Era o ramo de maior aplicação no Brasil. Quando chamados para intervir em serviços urbanos, sua preocupação se voltava para os alinhamentos, circulação e economia.
A distribuição das massas a construir, o aproveitamento dos valores naturais, o sentido verdadeiramente estético do conjunto, muitas vezes, escapavam aos projetistas. No estudo dos traçados de melhoria e expansão das cidades, o orçamento deve ser considerado em relação ao maior benefício resultante, nunca do tesouro, que se renova ano a ano. A economia feita hoje poderá ser ruinosa no amanhã próximo.
A ausência de arquiteto foi lacuna marcante na reconstrução dos prédios. Poucas fachadas justificam sua presença nas paredes, que arrematam. Salva-se meia dúzia de edifícios, particulares e públicos, projetados pelo tchecoslovaco Joseph Pitilick, arquiteto e boêmio, que veio ao Brasil para construir o pavilhão de sua pátria, na exposição internacional, comemorativa do nosso primeiro centenário. Projetou para o governo o Grupo Escolar "Gomes Cardim"(1) e o edifício da Imprensa Oficial. O escultor Waldemar Bogdanoff fez tetos pesados e, anos depois, dirigiu a decoração interna da Catedral. Era um curioso esse refugiado russo, de muita cultura geral e inteligente. Ótimo modelador em gesso. Não teve grandes oportunidades, como também não a teve Pitilick. A cultura artística do capixaba cingia-se a ouvir certos recitais de piano e, de quando em quando, a uma exposição de pinturas de Levino Fanzeres, na sua melhor fase criadora, e que sabia convencer seus coestaduanos do talento incontestável que possuía. Deixou telas magníficas nos salões de honra do Palácio e do Congresso. Foi ele quem despertou a procura repetida de Vitória pelos cultores do pincel. Gagarin, Pedro Bruno e, o maior de todos, Garcia Bento expuseram quadros esplêndidos. Tornaram-se freqüentes as visitas de declamadores, virtuosos do piano e do violão, quase sempre encaminhados pelo jornalista terrantez Abner Mourão, redator do "Correio Paulistano", ex-membro da Assembléia Legislativa do Estado e então deputado federal, a comandar o liderança da maioria, honra para o Espírito Santo, que o galardoaria com uma Senatória, em 1928.
A administração Ávidos, com as obras portuárias e a construção das duas pontes, a de Vitória e a de Colatina, transpunha as fronteiras. O preço do café atingia a fabulosa cifra dos setenta mil réis a saca (!) A receita do Estado oscilava pela casa dos trinta milhões de cruzeiros; o dólar valia pouco mais de oito cruzeiros. O Espírito Santo era de fato a terra da promissão. O Canaan, descrito por Graça Aranha, já não era ficção, era a realidade eloqüente, que o craque de 1929, entretanto, apagaria numa simples abertura de bolsa, naquele trágico pregão de outubro fatídico.
NOTAS
(1) Hoje Escola de Filosofia.
Fonte: Biografia de uma ilha, 1965
Autor: Luiz Serafim Derenzi
Compilação: Walter de Aguiar Filho, janeiro/2017
Vitória pertence ao tipo, que os urbanistas modernos denominam de cidade linear, unindo gânglios atrofiados entre o mar e as montanhas
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