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Primeiro dia em Linhares - Imigração Americana

Uma vila brasileira, única e pitoresca. Excedia em simplicidade qualquer coisa semelhante a uma cidade que nós jamais tínhamos visto. A floresta além do rio, com montanhas distantes em seus mantos azuis, apenas alguns matizes mais escuros que o céu, marcava o horizonte e nós fitávamos admiradamente em volta, quando os topos das árvores recebiam a brilhante luz lançada sobre elas pelo sol matinal. As casas, muitas delas cobertas com folhas de palmeiras, foram arranjadas em fileiras, formando um quadrado em torno de uma ampla área verde comum. Havia poucas casas feitas de tijolos, belamente acabadas e cobertas de telhas, pertencendo às classes mais ricas. Havia uma construção muito prosaica, contendo um sino rachado, que soava para missas e todas as reuniões. Umas poucas lojas, um correio e uma escola para os garotos da vila, e também uma igreja não terminada coberta de musgo, de todas as coisas a mais evidente.

Havia outras ruas além dessa, mas o maior número de casas podia ser visto da praça. Casas suburbanas, além da vila no lado norte, pontilhavam a borda do lago Deavis, canoas moviam-se pela superfície serena a qualquer hora, outras estavam amarradas com cipó às margens. A cena em torno dessa pequena lâmina d’água era muito bonita, com cabanas cobertas com palha, aninhadas entre palmeiras e bananeiras. Uma caminhada de mais de um quilômetro e meio levou-nos a esse cenário.

Lavadeiras estavam na água, batendo suas roupas sobre tábuas ou pedras lisas. Outras roupas brancas estavam alvejando à sua volta, sobre o chão. Ao longo das margens do rio, em vários desembarcadouros, as mulheres também permaneciam comprometidas na mesma ocupação, tornando as roupas que elas espalhavam na praia ofuscantemente brancas.

Mas devemos voltar à nossa descrição da vila e suas imediações para ver como os imigrantes estavam ocupados naquela hora. Vamos começar pelo nosso próprio domicílio. Havia muito que se fazer, mas o mais importante era o preparo da primeira refeição. Nosso café da manhã foi cozido nos fundos, fora da casa. Pés de café cresciam atrás

da casa, mas não próximos o suficiente para fornecer sombra em nossa nova atividade e estávamos determinados a termos um abrigo, coberto com folhas de palmeira. Nosso fogão ainda não tinha chegado, mas algumas panelas e um forno foram-nos emprestados. Colocamos nosso moedor de café na porta dos fundos da sala de jantar.

A senhora McDade, tendo chegado apenas um dia antes, estava pouco à frente de nós. Ela também estava fazendo todo esforço para almoçar alegremente em nosso novo mar de problemas e perplexidades. Alguns de nossos artigos mais necessários foram encaixotados na foz do rio e nos alcançariam aos poucos, na medida em que as canoas retornassem para buscá-los. Nesse tempo acampamos ao verdadeiro estilo pioneiro. Não havia utilidade em sentir pesar pelo vagar das coisas. Nós nos estabelecemos entre pessoas lentas e isso requisitava paciência.

Tínhamos assoalhos de mogno, mas não suponha por um momento que eles fossem polidos ou envernizados. Tábuas de pinho limpas sob nossos pés teriam sido mais belas a nossos olhos. Esses pisos foram serrados em grande espessura e não foram aplainados de maneira homogênea. Manchas do reboco estavam sobre o piso e um dos nossos primeiros esforços foi encontrar alguém para esfregá-lo. Percebemos ser impossível encontrar uma pessoa desejosa de realizar um trabalho tão pesado. Eles eram excessivamente limpos em sua aparência e suas casas em ordem, mas não achavam necessário esfregar. A maioria deles possuía pisos de terra batida e eram sempre bem varridos. Nossa única alternativa era tentar lavar os pisos nós mesmos.

Quando nossas caixas chegavam, cada uma delas que era esvaziada tornava-se algum artigo de mobília. Caixas de despensa, penteadeiras, etc. Nós tínhamos belas pequenas bacias para lavarmos as mãos feitas de ferro, muito leves e graciosas, pintadas de verde como nossas camas, e logo tínhamos um lar de aspecto jovial.

As damas estavam todas ocupadas e muito interessadas em organizar suas casas e se visitavam constantemente, comparando registros e obtendo novas idéias umas das outras.

A chuva caía a cada dia e nós achamos a temperatura do ar encantadora, mas uma noite, durante a primeira semana, uma chuva intensa veio saraivar nosso telhado. As telhas não tinham sido cimentadas ainda, algumas se soltaram de seus lugares e a água despejou como se passasse por uma calha. Nossas camas, por sorte, permaneceram fora do caminho da água. Reunimos, com muita pressa, todas as bacias e os baldes e, em pouco tempo, todos estavam cheios a ponto de derramarem. Pela manhã, nós secamos, arejamos tudo e rearranjamos as telhas. Os telhados de folhas de palmeira dos nossos vizinhos eram impenetráveis à chuva. Eram frescos e certamente muito bonitos, com beirais profundos e adornados.

Cada dia trouxe consigo algumas novidades triviais, e nossa experiência pioneira estava se tornando uma vida de sacrifícios em vez de alegrias. A esperança salvou-nos do desespero absoluto, pois não poderíamos senão acreditar que havia algo melhor à nossa frente. Nós já estávamos cansados do esforço de tornar uma casa temporária agradável, e ansiosos para que essa vida de provações viesse a termo.

A maioria dos cavalheiros estava procurando lares no belo lago Juparanã, próximo a nós, unido à vila por um estreito e meândrico rio no qual eles viajavam em canoas. Todos os dias traziam notícias

animadoras de alguém que retornou, cheio de entusiasmo. Cenários tão maravilhosamente belos, florestas tão ricas e variadas em cores, brisas tão deliciosas, miríades de peixes, praias de areias tão amáveis e brancas, tão pitorescos os desfiladeiros vermelhos cor de barro e as escarpadas, pedregosas encostas das gloriosas montanhas, tão musical o som das ondas fluindo! Os cavalheiros que retornaram da terra prometida eram eloqüentes, e à medida que ouvíamos, a esperança levava-nos aos céus em asas estendidas e a animação era restaurada em nossos corações.

Nosso fogão chegou, finalmente, e com nossos corações alegres fomos trabalhar e cozinhamos de uma forma mais agradável. Descobrimos que ele assava refinadamente, e então, com vida e energia renovadas, preparamos nossas refeições diárias. Chuvas freqüentemente nos interrompiam, é verdade, mas exclamaríamos rindo: “A chuva está vindo, devemos correr para a casa.”

Multidões de brasileiros vinham diariamente nos visitar. Muitas vezes respondíamos estupidamente às saudações costumeiras e lhes dizíamos:

“Tchau, até uma próxima vez”, quando deveríamos ter respondido: “Bom dia, como vai sua saúde?”. Eles não se ofendiam com nossa grosseria aparente e ainda continuavam a vir, mostrando o mesmo interesse profundo em nossos assuntos, todas às vezes. As mulheres não podiam andar, mesmo para visitar um vizinho próximo, sem uma escrava ao seu lado, e era freqüentemente difícil dizer quem era a senhora, sendo suas compleições as mesmas. Entre estas últimas, entretanto, havia algumas tão negras quanto às etíopes.

 

Fonte: Nossa vida no Brasil – Imigração Norte-Americana no Espírito Santo 1867-1870
Autora: Julia Louisa Keyes
Tradução e notas: Célio Antônio Alcântara Silva
Publicação: Arquivo Público do Espírito Santo, 2003
 

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