Santificado seja o vosso nome, Benemérito Frei Palácios!
Essa festa, que é, indubitavelmente, a mais concorrida de quantas se realizam no Espírito Santo há quatro séculos aproximadamente, vem sendo celebrada dentro dos dez dias seguintes ao da Ascenção de Nosso Senhor Jesus Cristo.
A Capelinha do antigo mosteiro, em boa hora confiada à direção de monges franciscanos, ainda obedece ao ritual da sua primeira celebração efetuada pelo grande apóstolo Frei Pedro Palácios, a quem devemos essa dádiva maravilhosa (que é o mosteiro da Penha) de que muito se orgulham o nosso Estado e o seu povo, notadamente os filhos da gloriosa Cidade do Espírito Santo.
Como o taumaturgo José de Anchieta, o fundador da Ermida da Penha tem a sua vida ligada a inúmeras lendas singulares, todas rememoradas anualmente, em rútilas consagrações de Amor e de Fé, no decorrer dos atos que se celebram no Santuário do majestoso templo, onde nasceu e cresceu opulentamente a religião católica do Espírito Santo.
Contam os cronistas e oradores sobre a vida do valoroso anacoreta, que vindo ele de além mar, depois de acidentada viagem de longos dias ou meses, embarcado numa das atrevidas, mas sempre beneméritas caravelas lusas, aportou à remansosa enseada de Vila Velha cerca de cinco lustros depois da instalação da Donataria.
Animava-o, reza a História, desejo ardente, irreprimível de auxiliar a quantos servindo a Jesus na difusão (“mistério verde a dentro”) dos sábios ensinamentos do Evangelho – “trabalhando e morrendo” – fincaram em terra de Santa Cruz o Marco Sagrado da Civilização Cristã.
Há quem afirme, baseado sem dúvida em elementos colhidos na torre doTombo, em Portugal, que o santo Frei Pedro Palácios, possuído de inexplicável e irresistível força de atração, sem conhecer previamente o roteiro de sua árdua e arriscada peregrinação, fez-se ao mar rumo às terras reveladas por Cabral.
Em meio à longa viagem, o santo arrábido, absorto em orações e preces efusivas diante do painel de Nossa Senhora da Penha de Paris – provavelmente uma das grandes obras de Arte atribuídas ao gênio de Rafael Sanzio – surpreendeu-se em dado momento com o toque a reboque do nauta que tomara a responsabilidade o comando do navio.
E logo depois a frágil embarcação mergulha em espesso nevoeiro, o vento raivoso faz crescer assustadoramente as vagas. Desencandea-se a tempestade. Vagalhões impetuosos, violentos quebram-se no costado da nau, já desarvorada e quase a desconjuntar-se aos fortes abalos, aos tremendos solavancos.
Na iminência de um naufrágio, o virtuoso servo de Maria Santíssima deixa o seu camarote em socorro aos que, em gritos alucinantes, presos de terror pânico ante o pavoroso espetáculo de um vendaval, subiam as escotilhas para pedir graças ao Deus Todo Poderoso. E quando aguardavam ajoelhados, a sentença da sorte, eis que Palácios, impávido, sereno e forte, assoma ao convés e ali entre os seus desesperados companheiros de viagem, ergue os olhos para o alto e balbucia humildemente uma fervorosa prece à Rainha do Céu, finda a qual atira sobre as ondas encapeladas o seu manto.
Assim, pela força de sua fé, de sua devoção, conseguiu o guapo sacerdote aplacar a cólera de Netuno e, conjurando o desastre iminente, restabelecer a paz nos corações de quantos, entre lágrimas e soluços, aos seus pés se reverenciavam, beijando-lhe carinhosamente as mãos.
Volta o piedoso Frei Palácios ao seu genuflexório e todos os passageiros, refeitos dos grandes sobressaltos, beneficiados pelo milagre da salvação de suas vidas, tributam-lhe respeitosas homenagens entre preces e agradecimentos a Bondade infinita de Deus.
E então, serenados os ânimos, o navio perdido na imensidão dos mares, velas rizadas, prossegue a sua viagem em rumo desconhecido, escrevendo sobre o verde glauco das águas o roteiro desejado pelo Santo Mensageiro de Maria Santíssima.
Frei Palácios, nas suas discretas manifestações à intrépida tripulação (constituída de verdadeiros fenícios na habilidade e na bravura) da caravela, já então resguardada da catástrofe, revela confiança absoluta no sucesso feliz dos seus desinios, fossem quais fossem os perigos, os sacrifícios a enfrentar.
E sabia com firme certeza de que não muito distante estava o dia em que os seus olhos, maravilhados, sob as benções cariciosas do Cruzeiro do Sul, alcançariam a Terra predestinada!
O virtuoso filho da Península Ibérica trazia das plagas lusitanas uma missão muito elevada (que se atribuía Divina), tão humanitária quanto perigosa, que era então a propagação das doutrinas cristãs nas selvas do novo Continente abençoado por Deus.
O milagre operado em alto mar sobre ondas furibundas exaltou as suas grandes virtudes, a serenidade do seu espírito, o seu devotamento à causa santa, tornou-o digno do respeito, do carinho e da veneração de quantos o acompanhavam na atribulada viagem. E por isso, o levita da paz e da caridade passou a ser tratado a bordo como um santo.
A sua crença em Deus não lhe permitia o menor desânimo no exercício do seu apostolado.
Jamais tergiversou, nem mesmo quando as rajadas enfurecidas e arrasadoras ameaçavam transformar o mar em leito fúnebre do seu corpo, em sarcófago impenetrável das relíquias de sua profunda Devoção.
A grandiosa singradura da arca sagrada em que o valoroso mensageiro de Maria Santíssima se transportou ao Novo Mundo, ficou mareada na História como um dos fatos que constituem verdadeira lição de Fé, Abnegação, Altruísmo e Perseverança, com a qual muito se exalta a alma católica do povo desse abençoado Espírito Santo.
Fonte: Jornal A Tribuna
Autor: Miguel Manoel de Aguiar
Compilação: Walter de Aguiar Filho, março /2012
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