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Vila Velha, a Cidade, sua História – Por Seu Dedê

Convento da Penha -Ilustração do Livro de Hartt

Situada numa planície à beira-mar, entre o Morro de Nossa Senhora da Penha e o de Inhoá, Vila Velha, a vila de Nossa Senhora da Vitória, foi fundada pelo donatário Vasco Fernandes Coutinho.

Cita Gabriel Soares a historiadora Maria Stella de Novaes (no seu livro “A História do Espírito Santo”) que: “Chegou a salvamento à sua Capitania e a qual desembarcou e povoou a vila de Nossa Senhora da Vitória, a qual chamavam de Vila Velha, onde se fortificou, e em breve tempo se fez uma nobre vila para aquelas partes de redor desta vila, se fizeram logo quatro engenhos de açúcar muito bem providos e acabados para isso, que sua terra deram muito bem”. (Tratado descritivo do Brasil – 1587 – Coleção Brasiliana).

Acossado pelos índios, os moradores se espalharam e a maioria foi autorizada pelo donatário a se mudar para a Ilha de Duarte Lemos (Vitória). Apoiados, pelos jesuítas, repeliram e derrotaram os indígenas, possuidores legítimos, e a seguir fundaram a Vila Nova e antiga recebeu o nome de Vila Velha. Vasco Fernandes Coutinho faleceu em sua residência do Sítio do Ribeiro, em 1561.

Seus ossos receberam, na igreja de Nossa Senhora do Rosário uma sepultura decente, mandada fazer em 1682 pelo donatário Antônio Francisco Araújo.

“A casa da misericórdia, que não se viam mais que os vestígios, mandou V. S. levantar, ficando perfeitíssima a que mandou V. S. dar sepultura decente aos ossos do primeiro Donatário Vasco Fernandes Coutinho que soterrados em húa arca se conservam relíquias delle. Está hoje esta villa muito enobrecida, assim na justiça como no mais". (Informação prestada por atestado expedido pelo provedor Manoel de Moraes na Vila de Vitória, em 27/07/1682).

O documento citado é um atestado passado a favor do donatário do E. Santo, pelo Provedor da Fazenda da Capitania do Espírito Santo, sob o título de "...Informação que dou a V S. do estado em que fica esta capitania no breve tempo que nella assistio. Passado na Vila de Vitória, em 27 de julho de 1682". Assinada pelo Provedor Manoel de Moraes com as firmas reconhecidas pelo tabelião da mesma Vila, Martim Amorim de Távora e pelo Ouvidor Geral da Bahia, Dr. Góis e Araújo.

O relatório do presidente da Província, em 1868, sobre o cemitério da Igreja do Rosário diz. "Não se achando nas melhores condições higiênicas, não fere tão gravemente a saúde pública como o da Santa Casa de Misericórdia".

Por falta de vagas no cemitério e com a construção da linha de bondes, os restos mortais foram exumados e levados para uma área provisória nas imediações da Rua Presidente Lima, até que nos anos 30 fosse construído nos arredores da cidade o cemitério atual (Rua Arariboia).

Segundo as cartas dos jesuítas, em 1549 a Vila possuía um largo em frente à capela onde realizavam os ofícios religiosos (atual Largo da Matriz).

Com a mudança da sede da Capitania para Vitória, Vila Velha ficou adormecida e tal situação não permitia que os poderes públicos funcionassem a contento, servindo de críticas severas do presidente da província, Jose Joaquim Machado de Oliveira: "Não devo aqui omitir, que o município do Espírito Santo simboliza um velho venerando (permita-me a alegoria) que, com a consciência de alta categoria que representou, não cura mais nadas e cheio de vanglória pelas tradições e reminiscência do seu passado, exige imperiosamente que se lhe tributem homenagens e deferências e se considere o seu estado de inanição como mui compatível a posição figurou. Até é bem difícil descobrir-se onde existe a autoridade pública, e nem o seu estado de perene quietismo e consentimento sem violência o estrepito do poder. Se fora outra sua atitude eu vos proporia que lhe relevásseis do predicamento de Vila, porque se tem tornado mui pequeno o círculo dos Cidadãos que querem servir até cargos públicos; mas Senhores, deixemos repousar esta velha pacífica sobre seus pergaminhos, e embalado pelas suas recordações de glória e preponderância primitiva".(O escrito acima é referente ao estado de languidez e  descoroçoamento na vida pública, a que chegaram às Câmaras Municipais no fim do ano, que infundiria desânimo da mais zelosa autoridade no cumprimento de seus deveres). — Relatório acima citado.

Encontramos notícias aqui e acolá, dos governadores e presidentes da Província, apresentando ou prestando contas ao Rei ou à Assembleia Legislativa sobre os reparos executados na Igreja do Rosário, nas pontes, no caminho para a Barra do Jucu, na Casa da Câmara e Delegacia, no Forte São Francisco Xavier, etc.

As notícias do período colonial e imperial são pouco lisonjeiras a Vila Velha.

O bispo do Rio de Janeiro, Dom José Caetano da Silva Coutinho, visitou a Freguesia de Vila Velha em 1812 e achou a Igreja do Rosário mais bela que a de Guarapari. Umas poucas e boas casas no largo da igreja e o restante tão pouco ou quase nada na sua observação.

Com a passagem dos cientistas estrangeiros, Vila Velha começou a receber a atenção do governo da Província. Seus relatórios muito influenciaram para a ação dos presidentes.

Mais notícias têm em 1815 quando o naturalista alemão Maximiliano, príncipe de Wied Neuwied, aqui esteve de passagem. Assim escreveu: "Numa linda baia, a Vila Velha do Espírito Santo, pequena miserável vila aberta, construída quase toda numa praça. Numa das extremidades fica a igreja, e na outra, a 'Casa da Câmara'. Numa alta colina coberta de vegetação, junto à vila, ergue-se famoso convento de Nossa Senhora da Penha, um dos mais ricos do Brasil". (Viagem ao Brasil-Brasiliana — 1940).

Em 1818, o botânico Auguste de Saint-Hilaire esteve em Vila Velha e assim descreve: “Esta pretensa vila é apenas um aldeamento, formado quase exclusivamente de cabanas semiarruinadas. Embora vizinhas das montanhas, essas cabanas são construídas num terreno plano e chegam só a quarenta. As menos danificadas se alongavam, mais ou menos juntas, até o mar e do lado oposto a este é tomado pela igreja”.

“Não podendo utilizar suas terras, os habitantes de Vila Velha vivem apenas da pesca; são pobres e seu número diminui dia a dia”. (Viagem ao Espírito Santo e Rio Doce – Coleção Reconquista do Brasil – Edusp).

Outros viajantes que visitaram Vila Velha:

O geólogo canadense Charles Frederick Hart, no ano de 1865 (Viajantes Estrangeiros do Espírito Santo – Levy Rocha).

Jean-Jacques de Tschudi, em passagem por Vila Velha, pernoitou em Ponta da Fruta, em 10 de novembro de 1860 (idem).

A Princesa Teresa Carlota em setembro de 1888 esteve com comitiva em visita ao Convento da Penha (ibidem).

Vila Velha veio a possuir o primeiro chafariz somente no final do século XIX.

A maioria das casas, até o século XVIII era de pau a pique, fato comprovado pela carta do Capitão-Mor da Capitania do Espírito Santo, Silvestre Cirne da Veiga datada de 10/08/1736. O Capitão-Mor sugeriu ao Rei D. João V que transferisse para a Vila do Espírito Santo os quartéis dos soldados, considerando ser uma das maiores vilas, “mais pronta para a defesa, e juntamente com uma praça grande onde se podem formar batalhões”.

“... Porque os quartéis dos soldados se podem fazer com muito cômodo na forma que costumam fazer as casas da Vila do Espírito Santo, porque paredes e repartimentos das casas são paus metidos na terra e nas esquinas da casa e pelo meio são mais grosso e depois aqueles paus, muito bem barreados, por dentro e por fora, rebocando-os depois com cal, ficam deste modo mui eficientes e com muito pouco custo...”.

Até os anos 40 do século XX, muitas casas de Vila Velha eram construídas com estuque. No geral, uma sala, dois quartos e uma cozinha. O banheiro era a latrina no fundo do quintal.

Para a construção destas casas não era necessário nenhum projeto. Ao adquirir um terreno com a medida de área mais ou menos e demarcada daqui até ali, o proprietário de poucos recursos (pobre), ia ao mato que circundava a Vila e cortava seis grandes estacas para, depois de fraquejadas, servirem de esteios.

Na área alagada retirava a madeira, de preferências o guanandi para servir de cumeeira, baldrame e divisória dos quatros cômodos da casa. No mangue cortava varas para o envaramento das paredes. Por encomenda aos carroceiros e com autorização do proprietário do terreno, cortava os varões de maior diâmetro para sustentação das varas. Nesta etapa já devia estar separadas as palhas da palmeira (Jussara) que serviriam de cobertura da casa. Completando a primeira armação, isto é, levantados os esteios, onde um pouco acima do solo era entalhado numa pela roliça ligando os esteios, com um rasgo, nele eram encaixados os varões, na vertical. Eram depois, com cipós trançados neles as varas que dariam sustentação às paredes que seriam cobertas com telhas, era feita antes do barreio, para evitar que a chuva estragasse todo o serviço.

 

Nota: O autor era carinhosamente conhecido por Seu Dedê

 

Fonte: Memória do Menino... e de sua Vila Velha – Casa da Memória Instituto Histórico e Geográfico de Vila Velha-ES, 2014.
Autor: Edward Athayde D’ Alcântara
Compilação: Walter de Aguiar Filho, junho/2020

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