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Coutinho viaja pela última vez para Portugal

Pictorio imaginativo da última viagem feita pelo donatário Vasco Fernandes Coutinho, 1560 - Autor: Vagno - Acervo: Casa da Memória de Vila Velha - ES

Antes de fechar a epístola, comunicou a ida de Vasco Coutinho à metrópole, “tão cansado e emfadado que não deseja senão que lhe tomem a capitania”.(4) Ainda aqui encontrou oportunidade para encaixar novo argumento em favor de sua tese.

Foi o próprio donatário quem deu ciência dessa viagem a Mem de Sá. Fê-lo pela carta escrita na vila de Ilhéus, a vinte e dois de maio de 1558. O documento é todo um rosário de queixas e lamentações. Vasco Coutinho se diz doente e aleijado; agradece a ajuda que lhe mandou o governador geral; a terra ficou “despejada dos inimigos e em termos melhores do que nunca esteve”, informa; censura acerbamente os colonos e, de maneira algo confusa, denuncia um desacato de que foi alvo devido a certa postura sobre cativeiro de índios. Prossegue manifestando seu desejo de chegar ao Reino, onde esperava encontrar quem quisesse comprar a terra, ou tomá-la de sociedade.(5)

Capistrano de Abreu põe em dúvida que Vasco Coutinho tenha conseguido chegar à metrópole nessa viagem.(6) Pensamos diferentemente, apoiado em pormenor digno de consideração – o longo período em que o donatário esteve afastado da capitania. A não ser que seu estado de saúde se tivesse agravado, prendendo-o em algum dos portos do norte do Brasil. O certo é que, tendo deixado o Espírito Santo em 1558, em fins de janeiro de 1560, quando por aqui passou Mem de Sá, continuava ausente.(7)

 

NOTAS

(4) - Carta, I, 226.

(5) - Carta de Vasco Fernandes Coutinho a Mem de Sá, de vinte e dois de maio de 1558 – “Senhor. – É a minha obrigação tanta, em que lhe são pela mercê que me fez e no socorro que me mandou, dado caso que sua pessoa e quem elle é e pera o que era obrigado a fazer o que fez e fora eu assim doente e aleijado como estava me embarquei ao vir visitar e beijar as maos e com o mao tempo e ma vida do barco, já quando aqui cheguei, foi dita chegar vivo da maneira que vim pela qual rezão e minha doença não vou, logo falo se se Nosso Senhor me der ajuda e um pouco de saude pera isso, pera lhe dar conta de mim e assim da terra como fica, Nosso Senhor seja louvado despejada dos inimigos e em termos melhores do que nunca esteve, do que Vossa Senhoria deve de ter muito gosto pois que por sua industria e ajuda depois de Deus pode dizer que salvou aquela gente do muito risco e perigo em que estávamos e ganhou aquela terra ainda que lhe custasse tanto e depois delle eu fui o mofino em Ella custar tanto não se pode nisto fallar porque é cousa tam nova tão fora de estilo e de rezão o por parte sucedeu tamanho mal que se não poderá fallar.

Peço a Vossa Senhoria que pois já ganhou aquella terra e comigo usou tanta fidalguia e tanta virtude que em tudo o faça como eu delle desespero em a favorecer nas cousas que for necesarias pera paz e socego da gente porque esta é a que mais nojo pode fazer entre huns e os outros porque dos indios já fica segura louvores a Deos e a terra despovoada delles, peço a Vossa Senhoria que me proveja com justiça de algumas desordens que la ha entre nós e que os moradores tem contra mim por onde se tem causado muitos odios e muitos desmandos entre elles e o começo de se os indios alevantarem foi esta que lhe direi huua postura que La está em que houvesse um compadre, tomaram no tanto em gozo que teimam os que querem e isto causou se alevantarem os negros com os resgates que levaram e pelos digo e como os não traziam ficavam logo alevantados; a isto ha Vossa Senhoria de prover a que os não haja por escusa e odios e demanda e tambem porque o capitão que ahi estiver não no tragam e tratem como até agora fizerem e a mim dizendo que no sertão eu não tinha que entender porque a camara tinha esse poder e elle com a postura que ella tem dizer a Vossa Senhoria o pouco amor e cortesia e ensino que comigo usavam pelos que de la vem o saberá. Eu por estas cousas e por outras muitas que eu por minha ventura e pecados tenho e mereço a Deus queria chegar ao Reino, se Deus for servido e a declarar me com a minha fortuna e ver se posso achar quem a povoe e fazer algum partido ou vender, pois que não mereci a Deus por meus pecados ter cousa minha a que a deixasse e porque me é muito necessario assim pera minha comciencia e descarga de minha alma, e pera que a terra se povoe e não esteja tão deserta, como está e tão desamparada, é necessario ir tomar conclusão antes que morra, porque são ja mui velho e mui cercado de doenças e morrendo desta maneira corra a alma muito risco. Pesso a Vossa Senhoria pois que tanta merce me tem feito depois que veio – que em tudo me faça merce e me favoreça e que escreva la como ella esta e as qualidades que tem e a muita necessidade que esta terra tem daquella terra se no perder por muitas rezões que Vossa Senhoria já sabera e se la ha embarcação e Vossa Senhoria ha de mandar algum navio pera o Reino, folgaria de por elle ser embarcado e ir ... com seu recado porque com elle e com sua ajuda espero em Nosso Senhor de lá fazer minha cousas como me são necessarias pera remedio de minha consciência e salvação pera aquella terra, porque espero em Nosso Senhor de me dar hum pouco de saúde e de esforço pera que lhe vá beijar as mãos e visitalo lhe não escrevo mais miudamente as cousas que são passadas e as que relevam pera bem da sua orbrigaçam e honra sua. Beijo as mãos de Vossa Senhoria. Desta Villa dos Ilhéus a vinte e dois do mes de maio de 1558 anos. Vasco Fernandes Coutinho” (Documento pertencente ao Arquivo da Torre do Tombo, Corpo Cronológico, I, 102, 96, apud P. DE AZEVEDO, Instituição [Apêndice], 382-3).

(6) - CAPISTRANO, Prolegômenos, 79.

(7) - É o que se infere do seguinte trecho da carta escrita por MANUEL DA NÓBREGA, em São Vicente, a primeiro de junho de 1560: “e partio [Mem de Sá, da Bahia, a dezesseis de janeiro de 1560], visitando algumas Capitanias da costa até chegar ao Espirito Santo, Capitania de Vasco Fernandez Coutinho, onde achou huma pouca de gente em grande perigo de serem comidos dos Indios e tomados dos franceses, os quais todos pedirão que ou tomasse a terra por El-Rey ou os levasse dali por a não poderem já mais sostentar, e o mesmo requeria Vasco Fernandez Coutinho por suas cartas ao Governador”. (Cartas, III, 242).

 

Fonte: História do Estado do Espírito Santo, 3ª edição, Vitória (APEES) - Arquivo Público do Estado do Espírito Santo – Secretaria de Cultura, 2008
Autor: José Teixeira de Oliveira
Compilação: Walter Aguiar Filho, maio/2017

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