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Entrando no Instituto Histórico e Geográfico do Espírito Santo – Augusto Botelho

Desembargador Augusto Botelho e ao centro de pé o Desembargador Carlos Xavier Paes Barreto

Exmo. sr. representante do Presidente do Estado

Exmo. revdmo. sr. Bispo diocesano.

Meus senhores :

Vai por 18 anos que, por uma tarde de abril de 1910, em meio dos soluços e preces de minha boa e santa mãe, eu, com o peito a borbulhar em pranto e olhos rasos d’água, deixei a perder de vista, na linha curva e enganosa dos horizontes, o meu heróico e encantador Recife — berço meu primeiro esplendente de luz e eterna e magicamente embalado pelas águas plácidas e remansosas, carinhosas e fraternais, do Capibaribe e Beberibe, em demanda deste outro berço, por aquele tempo, para mim, ainda tão vazio de carinho e de amor, e hoje, tão bom, tão querido, tão amoroso, tão abençoado, quanto aquele outro que eu deixara, vai por 18 anos. Aqui cheguei, aqui fiquei e aqui ficarei, si Deus o permitir, para sempre, a trabalhar e confiar, conforme a bela e magnífica lição contida no atraente e promissor lema deste Estado que, além de constituir uma maravilhosa síntese político-econômica, vale, ainda, por um belo e sábio programa de governo de um povo. Trabalha e confia. Eis a bela e magnífica lição do nosso querido, valoroso, invejável e rico Espírito Santo.

Meus senhores: — Quis o destino que as mãos, sempre boas e generosas de Carlos Xavier, que me receberam ao pisar estas hospitaleiras plagas, quis o destino, repitamos, fossem essas mesmas mãos que agora abrissem as portas deste santuário de relíquias históricas, para nele dar entrada à minha humilde pessoa, tão apagada quão obscura no formoso e brilhante meio intelectual de Vitória. Hei de me esforçar e trabalhar, tanto quanto couber em mim, na medida de minhas forças para corresponder à grandeza de vossa alma e à magnitude do vosso coração, fazendo-me sócio deste histórico e geográfico instituto.

Que grande honra e não menos jactância para mim! Mas, a esse chamamento para o vosso convívio cientifico e intelectual, só posso atribuir a razões do coração, atenta à minha pouca valia espiritual e ao meu pouco ou quase nenhum conhecimento dessa ciência que cultivais com tanto zelo e carinho e que se traduz, por assim dizer, pela ciência da historia geral da humanidade, e da qual venho me tornar hoje, forçoso é dizer — por nímia gentileza de vossa parte, obscuro, mas devotado e esforçado apostolo. Em paga de tão infinita generosidade, Sr. presidente e mais ilustrados membros do Instituto Histórico e Geográfico do Espírito Santo, eu vos hipoteco neste momento grandioso e sublime, para mim, o meu eterno reconhecimento, que é, como disse José Bonifácio, em uma de suas monumentais peças oratórias — a memória do coração.

Meus senhores:

Incorreria numa irreverência e na falta do cumprimento de um dever cívico, se nem por alto tocasse na data histórica; que hoje transcorre. Verdade é que se não faz mister rememorar aqui o fato em si, pois, se o fizesse; viria repetir, estou certo, e talvez mal, aquilo que vos todos já sabeis e conheceis tanto ou melhor do que eu, isto é, que hoje faz anos a República — e que esta foi a colheita promissora da primeira semente de liberdade brasiliense lançada ao solo pernambucano em 1710, e germinada no solo mineiro em 1792, e que, mais tarde, com o decorrer do tempo, se tornou árvore, e deu flor e foi fruto. Meus senhores: Senão todos, mas quase todos os grandes feitos da nossa historia já estão decantados em verso e prosa, esculpidos, cinzelados, perpetuados em custosos bronzes em valiosos mármores e pincelados em ricas telas! Mas, para mim, o maior e o mais sobrepujante de todos os feitos, e que, apesar de ser dos nossos dias, parece jazer um tanto esquecido, quero crer, seja o conquistado pela cabeça radiante e aureolada de Ruy Barbosa na conferência de Haia, onde, com o seu verbo miraculoso e quase divino, defendeu com inexcedível galhardia e fulgurante brilho, os direitos dos pequenos Estados até então menos prezados; e quando também, verdade seja dita, o Brasil tornou-se por assim dizer, conhecido na velha Europa. Esse grande e extraordinário feito já devia estar também cantado em verso e prosa, pincelado em telas, esculpido, cinzelado, perpetuado no bronze e no mármore para a memória da humanidade de hoje e da pro vindoura. Façam-se conquistas no campo do Direito, da Lei, da Justiça.

Desta, disse o grande apostolo Ruy, “nasce a confiança, da confiança a tranquilidade, da tranquilidade o trabalho, do trabalho a produção, da produção o credito, do credito a opulência, da opulência a respeitabilidade, a duração, o vigor”. Solucionem-se todas as questões, todas as dependências, quer intestinas, quer internacionais por meio da força do Direito, da Lei, da Justiça, concretizados no arbitramento. O que se tem de útil sobre a terra, nada se deve às armas e às guerras. Estas nada constroem, mas tudo destroem, devoram, aniquilam, estracinham e consomem: — amor, honra, esperança, mocidade, liberdade, vida, propriedade. Basta de guerra! Basta de sangue! As grandes descobertas cientificas não foram conquistadas nas guerras, mas no ambiente sereno e calmo dos gabinetes e laboratórios: Galileu fundando a física, Descartes instituindo a geometria geral, Newton descobrindo a lei da gravitação, Lavoisíer lançando os fundamentos da química, as grandes maravilhas, de Edison e de Marconi, e o problema da dirigibilidade dos balões, solucionada pelo grande matemático Santos Dumount, tais conquistas, e tantas outras mais, foram operadas nos gabinetes e laboratórios sob um ambiente de ordem e de paz.

Os pequenos benefícios resultantes de uma guerra, para a humanidade, por exemplo — a descoberta, nem sempre, de uma nova função de um órgão humano ou de uma nova aplicação de cirurgia, não compensam as vidas que se perdem e o sangue que se derrama, pois tais benefícios poderiam ser obtidos, como se têm obtido, nos hospitais, nos gabinetes e nos laboratórios. Na guerra o que mais se aperfeiçoa é a maquina infernal para a matança do gênero humano! Seja a grande guerra de 1914 o último imposto de sangue pesadamente pago sem nenhum resultado para a civilização, para as nações, e para a humanidade. Basta de guerra! Basta de sangue! Trabalhe a humanidade com animo forte, crente e confiante na força do direito, e não esquecendo a Deus, que há de triunfar e esmagar com mão de ferro o monstro de milhares de goelas famintas e insaciáveis, e tripudiar sobre os destroços de tão iracundo demônio — como seja a guerra. Há quem duvide da paz universal, dizendo que a “vida é a luta, a luta a ambição, a ambição a guerra”, e que, enquanto houver homens e fronteiras, haverá sempre guerra, chegando por isto à conclusão de que a paz universal é uma linda utopia! Mas esquecem-se esses pessimistas de que para refrear essa luta, esse egoísmo, essa ambição, que geram, que originam as guerras, existe, com a sua nova concepção filosófica — o Direito, já o brilhante espírito do meu grande mestre Dr. Henrique Milet, de sua cátedra de professor, nos fazia crentes dessa nova concepção filosófica do direito, dessa nova espécie de religião, ensinando-nos o seguinte dogma jurídico: “O direito é um produto do amor: refreia o egoísmo e expande o altruísmo. Sede, pois, os levitas dessa religião do direito, que busca a fraternidade universal”.

Eu não sou um mero utopista, mas um grande crente e confiante na força do direito, capaz de nos dar a paz universal sonhada e almejada pelos povos, que querem viver “para o direito, pelo direito, e com o direito”. As nações não se devem orgulhar de suas vitórias de guerra, mas dos seus feitos científicos, e de possuírem leis e códigos sábios. Napoleão, o homem que assombrou o mundo inteiro com seu espírito de guerreiro invencível, “hm “Santa Helena” exclamou: “Minha verdadeira glória não foi ter ganho quarenta batalhas. Waterloo apagou a lembrança de tantas vitórias”. O que nada destruirá e que viverá eternamente é o meu Código Civil. E disse.

 

Revista do Instituto Historico e Geográfico do Espírito Santo – Número 07 Março de 1934
Arquivo Público do Estado do Espírito Santo - Biblioteca Digital
Discurso proferido pelo desembargador Augusto Botelho, em 15 de novembro de 1928
Compilação: Walter de Aguiar Filho, maio/2020

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Judith Castelo Ribeiro

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