O dinheiro que vem com o café paga as obras que mudam a paisagem
Foi um período de grandes realizações governamentais, graças ao dinheiro arrecadado com a circulação de mercadorias, pois o comércio prosperou e se especializou, e com a exportação do café, produzido em grande quantidade
A agricultura era a base da economia do Espírito Santo no período colonial e continuaria sendo durante a República Velha. Foi introduzido o cultivo do café, que se expandiu rapidamente porque aqui encontrou terra abundante, clima propício e mão-de-obra disponível. As primeiras notícias de sua comercialização no Espírito Santo são de 1811. Na segunda metade do século XIX se tornaria a maior fonte de renda do País e do Estado, deixando em segundo lugar, aqui, a cana-de-açúcar.
No início do período republicano, o Brasil já era o maior exportador mundial de café, que, no ano de 1903, representava 95% da receita do Espírito Santo. Aqui era plantado somente o café capitania, conhecido por seu aroma e sabor.
Muitos proprietários rurais ficaram ricos com o seu cultivo e aqui surgiu, como em outras partes do Brasil, uma "nobreza do café". Eram fazendeiros que passaram a formar uma verdadeira aristocracia rural, com prestígio social e político. Os barões de Itapemirim, Aimorés, Timbuí e Guandu foram, antes de qualquer título, grandes proprietários de fazendas com extensas lavouras de café.
O plantio do café exigiu o desmatamento de vastas áreas e, como se praticava a "coivara" (queimada para limpar o terreno antes do plantio), houve um progressivo desgaste do solo. O escoamento da produção impôs uma rápida melhoria das vias de comunicação, abertura de estradas, caminhos, melhoramento dos portos, desobstrução de rios para o transporte fluvial, construção de ferrovias e introdução de barcos a vapor.
Além disso, provocou o crescimento da arrecadação de impostos, o que permitiu a realização de obras públicas que beneficiaram toda a população: obras de saneamento, iluminação pública, bondes elétricos, escolas, melhor organização do serviço de correios e telégrafos. Além do café e do açúcar, produziam-se no Espírito Santo o milho, o feijão, o arroz, o algodão, o cacau, a mandioca, madeiras, o tabaco, frutas e hortaliças.
A necessidade de escoamento da produção cafeeiro foi a motivação maior para a abertura de estradas e construção de pontes, promovidas por vários governantes. Foram construídas estradas em regiões de topografia acidentada como entre Santa Leopoldina e Santa Teresa, Castelo e Muniz Freire. Tiveram forte influência sobre o desenvolvimento econômico das regiões atravessadas, e logo passaram a ser trafegadas por caminhões de transporte de café. Assim, carros a motor percorriam o interior antes mesmo de a capital ter recebido os primeiros automóveis.
Durante o governo de Florentino Avidos (23/05/1924 a 30/06/1928), foram abertas as estradas de Colatina Nova Venécia, de Vitória a Afonso Cláudio, de Cariacica a Santa Leopoldina, de Santa Teresa a Colatina, passando por São João de Petrópolis. O trecho de Santa Teresa a São João de Petrópolis é citado por Florentino Avidos como o mais caro dos que construiu, por atravessar uma região de topografia muito acidentada, com nove quilômetros de serra.
Florentino Avidos construiu também as estradas de Ponte de Itabapoana a São Pedro de Itabapoana, e de Mimoso a São Pedro de Itabapoana. Fez reparos em praticamente toda a rede rodoviária do Estado, porque quando assumiu o governo as estradas existentes encontravam-se em condições lastimáveis de conservação.
O presidente Florentino Avidos abriu ainda trilhas, a que chamou de caminhos de penetração, a maior parte deles no município de Colatina. Destinavam-se principalmente às tropas de burro, importantes para o escoamento da produção agrícola, sobretudo do café.
Mas houve a preocupação de construí-los com possibilidade de adaptação fácil ao tráfego de veículos, evitando-se declives muito fortes.
Essas estradas foram interligadas com a construção de 20 pontes, em geral, de cimento armado. Algumas, porém, foram feitas de madeira, com pilares de pedra. Tiveram papel estratégico para o desenvolvimento do Estado a ponte sobre o rio Doce, em Colatina; a ponte interestadual de Bom Jesus, sobre o rio Itabapoana (o custo desta ponte foi dividido com o Estado do Rio de Janeiro); a ponte de Santa Leopoldina, sobre o rio Santa Maria, dando acesso à estrada de Santa Leopoldina a Santa Teresa; e a ponte metálica, ligando Vitória ao continente, que requereu serviços de saneamento e aterro nas regiões de acesso, principalmente na Ilha do Príncipe.
A costa do Espírito Santo dispunha de bons portos, que foram utilizados desde o início do período colonial: Itapemirim, Vitória, Guarapari, Benevente, São Mateus e Santa Cruz são alguns deles.
Vários rios eram navegáveis, como o Doce, o São Mateus, o Santa Maria, o Itapemirim, o Benevente, e dispunham de portos fluviais, por vezes com intenso movimento comercial, como o porto de Santa Leopoldina, às margens do rio Santa Maria.
Esse porto recebia a produção de café de uma enorme área interiorana, conduzida até ali pelas tropas de burro, e levada até o Porto de Vitória em canoas, de onde seguia para o exterior.
Com o passar dos anos, esses rios deixaram de ser navegáveis, em conseqüência do assoreamento dos seus leitos. O porto marítimo mais importante do sul da costa era o de Itapemirim, cujos valores de exportação de café chegaram a superar os de Vitória.
O porto de Vitória, até início do século XX, não tinha atracadouro para navios, que operavam ao largo, e as mercadorias eram trazidas até os trapiches em chatas ou flutuantes. Somente embarcações pequenas, os escaleres, acostavam no cais do Imperador, que se situava junto à atual escadaria do Palácio, e outros, como o Cais Grande da Praça Santos Dumont, junto à atual Praça Oito. As lanchas de Vila Velha chegavam ao pequeno cais do Eden Parque, situado no espaço ocupado hoje pelo Cine-Teatro Glória.
A construção de um cais e o aparelhamento do Porto de Vitória eram medidas necessárias ao desenvolvimento econômico do Estado. Durante anos, arrastaram-se os estudos para a construção do porto. Em 1881, o engenheiro Milnor Roberts elaborou estudos indicando a sua localização no continente, do outro lado da cidade, apontando a vantagem do local pela profundidade da bacia marítima e pela viabilidade da construção de uma estrada de ferro que penetrasse até o cais. O projeto não foi executado por pressão do Governo Estadual, que não aprovava a construção no continente.
Tecnicamente usava-se o argumento de que, embora a área do continente fosse mais profunda, possuía maior volume de lama, necessitando de trabalhos de drenagem que encareceriam o projeto. A área localizada na ilha, embora menos profunda. estava assentada em rochas. Mas, possivelmente, a maior preocupação dos governantes capixabas, dos comerciantes e políticos, estava centrada em manter a supremacia da cidade de Vitória e promover o seu crescimento econômico. Finalmente, um novo plano foi aprovado pelo Decreto 7.994, de 10 de maio de 1910. Determinava a construção de 855 metros de cais, a construção de uma ponte de 199 metros de comprimento, a dragagem da barra e outros serviços.
Os trabalhos foram iniciados em 1911, mas paralisados em 1914, por causa da Primeira Guerra Mundial. Até aquela data, haviam sido concluídos 348 metros do cais. Com o fim da guerra e a melhoria dos recursos financeiros do Estado, em 1925 foram reiniciados os trabalhos e puderam ser construídos os armazéns, a linha férrea, o calçamento, e instalados guindastes, pontes rolantes e iluminação elétrica.
Os serviços foram novamente interrompidos no dia 16 de outubro de 1930, quando já estavam concluídos 670 metros de cais, dois armazéns e a ponte de ligação com o continente, e nove guindastes estavam montados. Os trabalhos foram retomados no dia 11 de junho de 1935. A primeira seção do cais ficou pronta em 1937, e os navios passaram então a operar diretamente no porto, cuja conclusão só ocorreu em 1940, quando foi terminada a plataforma interna, seu aparelhamento técnico, e inaugurado, assim, o Cais Comercial de Vitória. O porto ficou situado na parte sul da ilha de Vitória, a três milhas e meia do mar, no fundo de um canal, ao longo da cidade, num local protegido dos ventos pelos morros que se estendem desde a barra até o ancoradouro.
Os recursos gerados pela produção cafeeira contribuíram também para a construção de uma malha ferroviária que escoaria a produção agrícola, transportaria passageiros, manteria o intercâmbio comercial entre as regiões percorridas e uniria o Espírito Santo aos Estados do Rio de Janeiro e Minas Gerais. Traria para o Estado progresso econômico e social. Determinaria também o aparecimento de povoações, vilas e cidades, que tiveram toda sua história ligada à passagem do trem. Algumas delas entraram em decadência quando as suas estações foram desativadas.
No Espírito Santo, construíram-se duas importantes ferrovias: a Estrada de Ferro Sul do Espírito Santo (depois chamada de Leopoldina Railway), que ligava a capital ao sul do Estado e ao Rio de Janeiro, escoando a produção de café, e a Estrada de Ferro Vitória a Minas, que une a capital ao norte do Estado e a Minas Gerais, para o transporte de passageiros, produtos agrícolas, madeiras. Seu primeiro trecho foi inaugurado em 1904. Essa estrada pertence atualmente à Companhia Vale do Rio Doce e transporta, principalmente, minério de ferro de Minas Gerais para os portos de Vitória.
As principais metas do primeiro governo do Presidente do Estado Moniz Freire eram o povoamento do solo e a construção de vias férreas. Ainda no seu governo, no dia 13 de julho de 1895, foi inaugurado o primeiro trecho entre o Porto de Argolas, situado no continente, em frente à capital, e a Vila de Viana. Em 1887 já funcionava a Estrada de Ferro Caravelas, no trecho de 50 quilômetros entre Cachoeiro do Itapemirim e a estação de Pombal, mais tarde denominada Rive.
Durante o governo de Nestor Gomes (23/05/1920 a 23/05/1924), foram construídas as estradas de ferro de Anchieta a Alfredo Chaves, São Mateus a Nova Venécia, Cajubi a Presidente Bueno. Vários governantes tiveram a preocupação de construir estradas de rodagem ligando regiões isoladas aos trilhos das vias férreas, interligando municípios e facilitando o escoamento da produção agrícola. O trecho da Estrada de Ferro Leopoldina Railway que liga Vitória a Cachoeiro de Itapemirim entrou em decadência na medida em que caiu a produção cafeeira da região serrana.
Fonte: Jornal A Gazeta, A Saga do Espírito Santo – Das Caravelas ao século XXI – 18/11/1999
Pesquisa e texto: Neida Lúcia Moraes e Sebastião Pimentel
Edição e revisão: José Irmo Goring
Projeto Gráfico: Edson Maltez Heringer
Diagramação: Sebastião Vargas
Supervisão de arte: Ivan Alves
Ilustrações: Genildo Ronchi
Digitação: Joana D’Arc Cruz
Compilação: Walter de Aguiar Filho, junho/2016
No final do século XIX, principalmente por causa da produção cafeeira, o Brasil, e o Espírito Santo, em particular, passaram por profundas transformações
Ver ArtigoNo Espírito Santo, como nas demais províncias do Império, o movimento republicano foi pequeno. Em 23 de maio de 1887, foi fundado o primeiro clube republicano do Espírito Santo
Ver ArtigoNo que diz respeito ao ensino primário, houve um acentuado aumento quantitativo do número de escolas e de matrículas
Ver ArtigoSuas realizações modificaram as condições de vida dos habitantes de Vitória e deram ao Estado oportunidade de crescimento econômico
Ver ArtigoO desenvolvimento comercial do Espírito Santo na Primeira República está ligado à produção do café
Ver ArtigoNo período de Florentino Avidos, o Estado se estabilizou economicamente e, com recursos da exportação do café e da madeira, muitas obras públicas foram realizadas. Ele construiu 29 pontes e 35 estradas
Ver ArtigoA Usina de Açúcar de Paineiras tinha a tecnologia mais avançada do País. Em Vitória, foi implantada uma fábrica de tecidos, em Jucutuquara
Ver ArtigoFoi principalmente graças à expansão da lavoura cafeeira e à necessidade de escoamento da produção que se impôs a utilização de tropas de burro para o transporte de café
Ver Artigo