Morro do Moreno: Desde 1535
Site: Divulgando desde 2000 a Cultura e História Capixaba

Os Santos também morrem - Ao Dr. Délio Etienne Dessaune

Capa - Vitória Propaganda

Sim, os santos também morrem e nosso "santo" Délio Etienne Dessaune morreu! Já estava muito velhinho, doente, vindo por fim a falecer. Havia já algum tempo que eu não o via, mas ele estava sempre presente em minhas orações.

Por uma dessas incríveis coincidências da vida, eu estava batendo à máquina, no meu livro de lembranças, a parte em que eu narrava o episódio da doença do meu filho, que nasceu com um problema que poderia deixar-lhe terríveis seqüelas de caráter irreversível, e que, com a orientação do Dr. Délio, teve cura "milagrosa".

Escrevia eu sobre esse caso, quando soube do seu falecimento. Enquanto chorava a perda desse amigo tão querido, deixei que os meus pensamentos vagassem pelo passado e resgatassem lembranças adormecidas no fundo da memória.

Dr. Délio Dessaune era também um grande amigo da família de meu pai. Saíam às vezes em grandes caçadas nas matas do rio Doce e do sul da Bahia. Voltavam com os carros carregados de laranjas-baía, cocos, cacaus, arcos e flechas de índios que lhes serviam de guias nas brenhas das matas e, também, vários barriletes repletos de peças de caça, assadas e conservadas na banha. Eram jaós, veados, pacas, tatus e tantas outras iguarias que, por algum tempo, davam novo sabor às nossas refeições.

Dr. Délio foi também o nosso médico, quando ainda éramos crianças. Quando algum de nós adoecia, papai logo o chamava e aquelas que estavam boas iam esperá-lo, às escondidas, atrás de uma pedra que ficava à beira da ladeira que dava acesso à casa. Assim que elas o avistavam, começavam a rir imitando a sua estranha e inconfundível risada.

Depois de examinar o doente, ele fazia uma revisão em toda a meninada e quando papai perguntava: — Então, Délio, como estão as crianças?

— Ótimas, Seu Lauro, ótimas! Não vê como estão rindo?

Após a consulta, o indispensável cafezinho com bolinhos ou pasteizinhos feitos na hora, enquanto os dois botavam a "política" em dia.

Assim que ele se retirava, levávamos um tremendo "pito" pela falta de consideração demonstrada para com o médico amigo. Guardei com carinho as minhas lembranças de volta na memória. Enxuguei o pranto e fui prestar-lhe a minha última homenagem. Quanta gente lá estava, também, com esse mesmo propósito! Como era querido o nosso "santo" Délio! E parecia mesmo enterro de santo. Em cada grupinho, alguém contava a "cura milagrosa" de algum ente querido. E todos, todos afirmavam a sua bondade incansável. Um médico à antiga. A qualquer hora do dia, da noite, de madrugada, fosse lá a hora que fosse em que se precisasse dele e o chamasse, lá vinha ele, sempre alegre, bem-humorado, rindo, sempre rindo aquela sua risada inconfundível.

Só de vê-lo, as crianças já se sentiam melhor, e as mães também! Sabíamos que ele daria um jeito! Com a sua "sabedoria chinesa", ele tudo curaria...

Certa vez encontrei-o em Guarapari e falei-lhe com orgulho: — Dr. Délio, o senhor não imagina como está lindo o meu filho! Alto, forte, inteligente e belo! E isso eu devo ao senhor!

Tomei-lhe as mãos e beijei-as reverentemente, agradecendo-lhe como a um santo: — Obrigada, doutor, sempre quis fazer isso, mas nunca tive a oportunidade. Obrigada, doutor!

Lá no cemitério, ao ver as suas mãos cruzadas sobre o peito, veio-me o desejo de beijá-las de novo, mas o respeito humano me conteve. Beijei-as em pensamento e o seu espírito, já liberto da carne, por certo compreendeu a minha timidez.

Beijo-as em pensamento agora ao prestar-lhe esta homenagem. Dr. Délio, o senhor terá sempre um lugar muito especial no meu coração, já que foi o "instrumento de Deus" para salvar a vida de meu filho.

Obrigada, doutor!

 

Fonte: ESCRITOS DE VITÓRIA - Volume 15 - Personalidades de Vitória — Uma publicação da Secretaria de Cultura e Turismo da Prefeitura Municipal de Vitória-ES, 1996.
Prefeito Municipal - Paulo Hartung
Secretário Municipal de Cultura e Turismo - Jorge Alencar
Sub-secretário Municipal de Cultura e Turismo - Sidnei Louback Rohr
Diretor do Departamento de Cultura - Rogério Borges de Oliveira
Diretora do Departamento de Turismo - Rosemay Bebber Grigatto
Coordenadora do Projeto - Silvia Helena Selvátici
Chefe da Biblioteca Adelpho Poli Monjardim - Lígia Maria Mello Nagato
Bibliotecárias - Elizete Terezinha Caser Rocha e Lourdes Badke Ferreira
Conselho Editorial - Álvaro José Silva, José Valporto Tatagiba, Maria Helena Hees Alves, Renato Pacheco
Revisão - Reinaldo Santos Neves e Miguel Marvilla
Capa - Vitória Propaganda
Editoração Eletrônica - Edson Maltez Heringer
Impressão - Gráfica e Encadernadora Sodré
Autora do texto: Beatriz Monjardim F. Santos Rabelo
Compilação: Walter de Aguiar Filho, janeiro/2018

Personalidades Capixabas

Personalidade Capixaba - Antônio Pinto Rodrigues

Personalidade Capixaba - Antônio Pinto Rodrigues

Nasceu em 1903, em Vila Velha, Antônio Pinto Rodrigues, filho de Cleto Rodrigues e Henedina Pinto Rodrigues

Pesquisa

Facebook

Leia Mais

Galerias - As 10 mais importantes por Eurípedes Queiroz do Valle

A do Tribunal de Justiça. (Palácio Moniz Freire) -E subdividida em duas: - a especial, constituída pelos que exerceram a Presidência, e a Geral, formada por todos os Desembargadores

Ver Artigo
Judith Leão Castello Ribeiro

Foi também a primeira mulher a ingressar na Academia Espírito-Santense de Letras. Sem dúvida, ela foi um exemplo de mulher pioneira e batalhadora

Ver Artigo
Um Patriarca Nosso - Por Aylton Rocha Bermudes

Ignácio Vicente Bermudes, morador de Timbuí, merece especial celebração ao atingir os 100 anos de vida

Ver Artigo
Dr. João Dukla Borges de Aguiar

As manifestações de pesar pelo seu falecimento - O Velório na Câmara Ardente - O Enterro - As Homenagens Oficiais - Outras Notas

Ver Artigo
Desembargadores - Os 10 mais antigos

3) Carlos Teixeira Campos. Natural do Município de Calçado, no Espírito Santo, no então Distrito de Bom Jesus do Norte. Nasceu em 6-3-1908

Ver Artigo