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Praia do Canto, uma história à parte - Por Sandra Aguiar

Porto de Tubarão em construção - Foto: Paulo Bonino, anos 60

Os japoneses chegaram, primeiro, para trabalhar na Companhia Vale do Rio Doce (CVRD), depois na CST, final dos anos 70 e início dos 80. "Estou em São Paulo ou estou no Japão? Não, estou em Vitória", brincava o projetista Tolumnio dos Santos Paiva, hoje aposentado, sobre a invasão dos orientais.

O tempo de vida de Paiva é o mesmo vivido na Praia do Canto: 72 anos. História de vida que se confunde com a história do lugar. Ele viu o lugar, planejado para ser um bairro dormitório, transformar-se em comercial. Mudança que colocou por terra, na sua opinião, o sentido de fraternidade e solidariedade entre as pessoas. Lamenta o progresso do individualismo, por ordem das gaiolas de concreto. Da verticalização das construções. Lamenta a perda da tranquilidade, em consequência da violência, que cresceu na proporção do crescimento do bairro.

Morava Paiva, filho do tabelião Nicanor Paiva, numa casa grande construída num terreno de mil metros quadrados, dez metros de frente (da porta até o muro) e muitas espécies de orquídeas no quintal, na Rua Viana — Joaquim Lyrio. Há 15 anos a família se mudou de lá, após um assalto, para um alto edifício na Moacir Avidos. "Para o meu pai e para nós foi o maior castigo deixar a casa para trás", conta. O conforto foi poder cuidar das plantas num sítio adquirido em Marechal Floriano — as orquídeas estavam salvas nas montanhas.

Na praia, a nova moradia fica bem em frente ao primeiro prédio da região, o Renata, de quatro pavimentos, como previa o texto original do código de construções no município de Vitória para o bairro. Os dotados de pilotis no primeiro piso poderiam possuir cinco andares, limite inferior ao permitido na Capital (seis). Até porque os terrenos, em sua maioria, eram da Marinha, o que dificultava a sua legalização junto ao SPU.

Horizonte aberto, muitos pais ainda podiam vigiar do portão ou da janela de casa a entrada e saída das crianças nas escolas. Sophia Müller, o mais antigo dos estabelecimentos educacionais, Irmã Maria Horta (único público, quando público significava qualidade), Instituto Barão de Monjardim, Angela de Brienza e Sacré-Coeur (Sagrado Coração de Maria), que antes da instalação em Ponta Formosa funcionou na Moacir Avidos, com regime de internato (opcional). Concluído o ensino de primeiro grau, os meninos, de modo geral, iam para o Salesiano, na Avenida Vitória, enquanto as meninas, para os colégios do Centro, a exemplo do Carmo, Escola Normal.

 

"Grupos escolares:

Do Sophia Müller

Somos Macacos

- Irmã Maria Horta!

- Comedor de galinha morta!

Se a elas ninguém amar ou quiser

Serão freiras do Sacré-Coeur...

Os do Angela de Brienza

Surdos a tudo isto

Vivem pedras

Brincam mangueira."

(F.Achiamé)

 

Antes de ser um shopping, a área onde está o Boulevard da Praia abrigou o Instituto Barão de Monjardim — após sair de um local entre a Praia Comprida e a do Barracão — e a maternidade do doutor Arnaldo. Local privilegiado, na esquina da Rua da Árvore, agora Eurico de Aguiar. O Irmã Maria Horta, no final da Joaquim Lyrio. Uniformes distintos, os estudantes se misturavam nas ruas, passos apressados e seguros para chegar lá antes do sino tocar. Idas e vindas a pé, com segurança, num curto caminho, sem trânsito, sem violência.

Muitos do filhos da classe média, lembra o projetista aposentado, que trabalhou na época em algumas empreiteiras e no próprio cartório, foram praticamente criados pelos pescadores da região, pois com eles passavam muito tempo de diversão, entre conversas, varas de pescar peixes para almoçar e conselhos. Concluído o ensino fundamental, ele observa, o destino era fazer curso superior em outros estados, no Rio de Janeiro, em São Paulo ou Salvador. "Aqui as opções eram somente Direito, Farmácia e Contabilidade."

Nem só de estudo e pescaria viviam os pré-adolescentes e adolescentes. Eram comuns as festinhas nas casas dos pais dos colegas. "Sempre um clima familiar", ressalta Paiva, observando que a mentalidade dos jovens daquela época era bem diferente de hoje em dia. Domingo, dia de matinê no Glória, a tradicional voltinha na Praça Costa Pereira — meninas-moças circulam de um lado, meninos-rapazes, de outro —, tipo de paquera limitada a olhares, às vezes troca de bilhetinhos. Após um certo horário, uma passadinha nos clubes, Saldanha da Gama, no imponente Forte São João, ou no Álvares Cabral, na Beira-Mar, ou ainda no Vitória, Centro. Tempo contado, para não perder o bonde de volta.

Quando veio a Segunda Guerra (1939-1945), a comunidade não ficou alheia aos acontecimentos. Lembra Paiva, membro do Instituto Histórico e Geográfico do Espírito Santo, que um fato, em especial, motivou uma revolta generalizada: uma ofensiva naval dos alemães. "Eles (nazistas) afundaram navios (dos Aliados), então começou um grande quebra-quebra aqui e em outros locais da cidade, as casas e as lojas dos alemães foram depredadas. Então, as famílias germanas procuraram outro lugar seguro para morar."

Diferente de hoje, em que os vizinhos mal se cumprimentam, o morador diz que antes a amizade era mais importante do que o "vil dinheiro". Uma das boas lembranças que guarda da época é a chegada dos automóveis, e dos que andavam motorizados, sempre dispostos a oferecer carona a quem precisasse, como Salvador Buzato, dono de fábrica de móveis, no Centro, e o desembargador Rômulo Finamore.

Como se de volta ao passado por alguns instantes, o projetista vai contando episódios que jamais saíram de sua memória, com a emoção daquele instante que parece presente. As lembranças de Salvador Buzato, por exemplo, o fazem rir: "Certa vez, parou uma ambulância em frente à casa dele, e Dona Zinha, sua mulher, foi até o portão para saber o que estava acontecendo. Ela passou mal ao ver o marido saindo de dentro do carro, e ele tentou acalmá-la dizendo que havia pegado apenas uma carona." Muitos outros nomes e histórias para contar sobre eles (os vizinhos): Teófilo Costa, Gilson Vanderlei, Joel da Escócia, Eumênis Guimarães, Deomar Bittencourt, Antônio Rogério Lello, Lizandro Nicolet, João Linhares, José Moysés, Manoel Salastiel Batista, José Costa, Guilherme Ayres, Maria Telma dos Santos Madeira, os Petrochi, entre tantos mais. "Nara Leão nasceu no bairro", diz, relatando que a família da menina Narinha, depois cantora famosa da Jovem Guarda, morou ali — há versões que dão conta da residência na Saul Navarro e outras na Moadr Avidos, ruas bem próximas.

 

Fonte: Praia do Canto – Coleção Elmo Elton nº 4 – Projeto Adelpho Poli Monjardim, 2000 – Secretaria Municipal de Vitória, ES

Prefeito Municipal: Luiz Paulo Vellozo Lucas

Secretária de Cultura: Cláudia Cabral

Subsecretária de Cultura: Verônica Gomes

Diretor do Departamento de Cultura: Joca Simonetti

Administradora da Biblioteca Adelpho Poli Monjardim: Lígia Mª Mello Nagato

Conselho Editorial: Adilson Vilaça, Condebaldes de Menezes Borges, Joca Simonetti, Elizete Terezinha Caser Rocha, Lígia Mª Mello Nagato e Lourdes Badke Ferreira

Editor: Adilson Vilaça

Projeto Gráfico e Editoração Eletrônica: Cristina Xavier

Revisão: Djalma Vazzoler

Impressão: Gráfica Santo Antônio

Texto: Sandra Aguiar

Fotos: Cláudia Pedrinha

Compilação: Walter de Aguiar Filho, março/2020

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Itapoã

Itapoã

Apenas quatro casas rodeadas de muito verde e árvores frutíferas. Assim era Itapoã, em 1965. Só mato, capoeira pura. Existiam também mais três casas em construção.

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