Prestando Contas – Por Eurico Rezende
Passaram-se vinte e um anos.
Em janeiro de 1967, uma cativante certeza de dever cumprido adentrava minha consciência e alvoroçava, sob a paraninfo da recompensa, os sentimentos de quem, "com mão diurna e mão noturna", no conselho lapidar de Rui Barbosa, pesquisou, estudou e aplicou a perseverança de seus esforços na elaboração de nossa Carta Maior.
Hoje, neste mês vestibular de 1988, tão cheio de desafios para a Nação aflita, coloco-me na longa esteira de recordações do trabalho inovador, profícuo e multiplicador que, mercê de Deus, desenvolvi no preparo da Constituição em vigor, com absoluta fidelidade ao juramento que prestei eimantado pelo estímulo da confiança de meus coestaduanos. Ponho-me a lembrar da alternação dos dias, das noites e das madrugadas, vividos intensamente na Comissão, no Plenário, na Biblioteca, no Gabinete e em casa, cada cansaço logo substituído pela tenacidade, porque estava diante de mim a oportunidade histórica de vincular-me e, comigo, o Espírito Santo, ao mais importante documento de um País.
Delegado popular de um pequeno Estado, discricionado de força política ponderável, era necessário o meu esforço pessoal para compensar tal deficiência de estrutura.
Empenhei-me, ávida e profundamente.
Era a transição para o regime democrático, deflagrada pelo gesto de estadista do Presidente Humberto de Alencar CASTELLO BRANCO.
Agora, decorridos mais de dois decênios daquele evento e antes que o entardecer se complete e a impiedade do calendário prospere, resolvi prestar contas de minha atuação naquele relevante episódio, sistematizando as emendas que produzi e abordando outros temas, que, embora não absorvidos no texto, considerava merecedores de aprovação, ou que, pelo menos, ficassem diante da atenção nacional.
PELA DEMOCRACIA
É importante que fique expressa esta verdade, sem atavios nem artifícios, demonstrada cabalmente, através de insuspeito documentário inserido neste livro: solidário com o Movimento cívico-popular de 1964, que incontáveis benefícios iria conduzir para o meu Estado, colocando-o em posição de destaque na Federação, ao ser convocado para elaborar a nova Constituição, escudei-me no compromisso — que tornei inviolável até o fim da jornada — de proceder com independência total, sem ouvir senão minha consciência, somente esta, e visando a cooperar para o retorno do Brasil à plenitude do estado de direito.
A partir dali, considerei, sem tergiversar, que era o momento de encerrar-se o processo revolucionário. E, nesta trincheira, acionei minha conduta.
PERFIL DE CONSTITUINTE
Não sei se posso me qualificar de constituinte. Não seria tal título uma exorbitância, de vez que não fora eleito, especificamente, para aquela tarefa?
A resposta não pode ir "nem tanto à terra, nem tanto ao mar".
Mas seja-me lícito fazer algumas colocações. Advirta-se, preliminarmente, que não basta ser constituinte. O relevante, o que conta, o que vale, é proceder como constituinte. Enfim, o que importa é o resultado concreto dessa honrosa atividade.
Sem falsa modéstia, tive tal conduta, e obtive o correspondente resultado, olhos postos no interesse público e na Pátria cristã e eterna.
PODER PERMANENTE
Mesmo sem ter poderes originários, senadores e deputados mantidas a Federação e a República, são livres para emendar a Constituição, parcialmente ou em seu todo. Nesta última hipótese, obviamente, estarão votando novo Estatuto Fundamental. Acrescente-se que, segundo a melhor doutrina, a convocação de uma Assembléia Constituinte só se justifica e se impõe quando há ruptura da ordem jurídica, o que não ocorreu na atual conjuntura nacional. Ao contrário, a sucessão presidencial verificou-se normalmente, através de um colégio eleitoral, que só foi alvo de censura e repúdio quando ali a Oposição era minoria. Assim, se rompimento houve, foi das persistentes convicções daqueles que, sistematicamente, combateram o processo de escolha do presidente da República, por eles qualificado de ditatorial e espúrio.
SOBRE "IMPOSIÇÃO"
Criticou-se o fato de o Congresso ter sido convocado para elaborar a Constituição de 1967 por um Ato Institucional (nº 4).
Mas não poderia ser de outra forma, já que o Parlamento, com prerrogativa para tal, não teve ou não pôde ter, em virtude das condições da época, a iniciativa de fazê-lo. Ademais, convém salientar que o Executivo não procurou impor o seu projeto. Poderia até mesmo editar uma Constituição, de vez que estava respaldado em poderes revolucionários. Preferiu, porém, entregar a missão ao corpo legislativo. Observe-se, também, que o artigo 5º do aludido instrumento convocatório estabeleceu que, se o projeto não obtivesse a maioria absoluta em cada uma das duas Casas, estaria automaticamente rejeitado. Esse preceito deu ensejo a que o Parlamento adotasse a alternativa que lhe aprouvesse.
Convém lembrar, a propósito, que, para os Constituintes de 1933 e 1946, os Presidentes da República chegaram a sugerir regimentos internos.
TEMPO SUFICIENTE
Outro argumento que se levantou, em termos de inconformismo, foi a exiguidade de tempo para a elaboração e a promulgação constitucionais. Precedente histórico, todavia, contraria essa alegada angústia de prazo. Nesse sentido, tome-se, como exemplo, a Assembléia de 1946. Ali, aprovado em globo o projeto, sem prejuízo dos destaques das emendas, estas, em número superior a quatro mil, tiveram sua votação concluída em vinte e cinco dias, e a elaboração final não delongou. E se nos reportarmos à Constituinte de 1890, responsável pela complexa tarefa da institucionalização da República, verificaremos que a duração de seus trabalhos foi de apenas três meses e meio, realizando-se pouco mais de sessenta sessões. E observe-se o óbvio: a diferença da qualidade e da quantidade de tecnologia das duas épocas para os nossos dias guarda proporções espaciais. De tudo se conclui — e a observação e a experiência confirmam — que se pode elaborar uma Constituição em prazo inferior a três meses, desde que não se cuide de detalhes desnecessários e inconvenientes, remetidos, ai devem ser, para o legislador ordinário.
Completa-se a validade do raciocínio contra o argumento de prazo exíguo com o nobre propósito e o elogiável escrúpulo do Presidente Castello Branco de, antes da posse de seu sucessor, premiar a Nação com uma Carta democrática, com aceleração necessária mas sem pressa opressiva.
OMISSÃO
Dentre alguns temas de realce que os atuais constituintes sustentam, figuram o sistema de governo e a duração do mandado do atual Presidente da República.
As duas questões, porém, não foram ventiladas durante a campanha eleitoral de 1986. Os candidatos, tendo como pontes de comunicação com o povo os comícios, as vozes do rádio, as colunas da imprensa e as imagens da televisão, defenderam suas posições, com preferência absoluta, no campo da ordem econômica e social e na área da reforma e distribuição tributárias, de envolta com o questionamento em torno da dívida externa, do FMI e da corrupção. Sobre presidencialismo e parlamentarismo a omissão dos postulantes foi praticamente total. E, no que concerne ao regime de gabinete, o jogo ficou “escondido”, naturalmente porque, tendo o eleitorado, ao tempo do governo João Goulart, repelido, de forma esmagadora, o parlamentarismo, os seus adeptos ficaram receosos de defender o sistema, tendo em vista que poderiam ser remetidos para o holocausto eleitoral. Fique, assim, patente a verdade: a mobilização popular restinguiu-se a reivindicações na área da ordem econômica e social, buscando maior poder aquisitivo e melhoria da qualidade de vida.
Consequentemente, em melhor situação ficamos nós, constituintes – alegadamente atípicos – de 1967, porque, descompromissados com a espécie, nos foi possível cuidar do geral. E o fizemos com pleno conhecimento dos problemas e dos interesses do País, o que jamais foi monopólio, nem o será, de Assembléias tituladas de funções originárias.
Fonte: Memórias – Eurico Rezende– Senado Federal, 1988
Compilação: Walter de Aguiar Filho, agosto/2018
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