Vida Escolar - Grupo Escolar Vasco Coutinho - (Parte I)
Para falar da Vila Velha de algumas décadas atrás. Devemos começar com um rápido esboço da nossa educação escolar primária.
Ela se deu no Grupo Escolar Vasco Coutinho, poucos anos depois de sua inauguração, quando só existia o bloco fronteiriço situado à rua Luciano das Neves.
Entramos na primeira sala de aula no dia 4 de fevereiro de 1935, com sete anos de idade, no primeiro ano A. Deste ano A passava-se para o B e só depois alcançava-se o segundo ano primário. O primeiro dia de aula ficou marcado porque nossa professora, chamada Lídia, escreveu essa data no quadro negro, com letras bem talhadas e definidas, para que a copiássemos, fosse lá do jeito que fosse. Compreendemos mais tarde que essa tarefa inaugural seria um teste de aptidão coletiva dado pela excelente educadora para avaliação dos alunos que a ela caberia alfabetizar. Foi o nosso primeiro esforço, inaudito, experimentado como estudante. Da nossa parte a tarefa foi cumprida, só que em letras escarrapachadas, com que ocupamos uma página inteira do caderno. Isso ficou indelével na nossa cabeça – 4 de fevereiro de 1935.
No que se refere às acomodações, apesar de sabermos que algumas escolas não ofereciam nenhum conforto, as acomodações do aluno, em geral, eram de qualidade superior às de hoje. As carteiras eram feitas de madeira maciça – o compensado ainda não existia -, polida e bem envernizada.
No Grupo Escolar Vasco Coutinho cada carteira acomodava confortavelmente dois alunos. Essas carteiras eram compostas de duas partes distintas: do assento, na frente, e do tampo, que servia de mesa e depósito para cadernos e livros dos alunos que se sentavam na carteira de trás, e que era localizada na parte posterior do móvel. Assim sucessivamente formavam-se as filas de carteiras, com o detalhe de que a primeira carteira da fila tinha somente o banco onde alguém poderia sentar-se sem, no entanto, dispor de mesa para escrever, enquanto a última carteira da fila tinha apoio para a escrita e depósito para guardar livros e cadernos, mas faltava-lhe o banco.
Na parte superior do tampo, de fora a fora, localizavam-se duas valetas dispostas uma sobre a outra, destinadas a acomodar lápis e caneta bico-de-pena, ambos de uso obrigatório. Ainda na mesma superfície, em cada uma das metades, centralizado e no alto, havia um buraco vazado e redondo para receber um tinteiro com tampa, fazendo face à superfície desse móvel. Esse tinteiro era constantemente abastecido pelo servente do educandário, para que não faltasse tinta para a escrita.
Posteriormente as carteiras de lugares duplos foram substituídas pelas individuais mantendo a mesma disposição, exceto pelo assento, que era constituído de um banquinho com encosto de madeira, sustentado por um pé de ferro cilíndrico, esparramado na sua base para a necessária sustentação e equilíbrio. As carteiras foram se transformando, sendo suprimidos vários de seus detalhes até chegarem às de hoje, individuais geminadas, simultaneamente com assento e suporte para anotações.
As canetas-tinteiros ainda não deviam existir, e assim que criadas seu uso foi restrito. O mesmo aconteceu com a esferográfica. Logo no seu lançamento não era permitido usá-las para assinar documentos, caso em que esses documentos eram considerados inválidos. Com o tempo essa assinaturas passaram a ser aceitas, o que restringiu o uso da caneta-tinteiro a ocasiões solenes em que eram assinados atos notórios. Hoje essas canetas são vistas ainda em alguns consultórios médicos, gabinetes de executivos e escritórios dados a essa prática.
Naqueles tempos, não existindo nem uma nem outra, utilizava-se a famosa pena de metal. Mais ainda a de aço, com uma ranhura da metade para baixo do bojo do seu corpo, por onde escorria a tinta, molhada no tinteiro. O tinteiro devia receber quantidade suficiente de tinta e o usuário, ao mergulhar a pena para recolhê-la, não podia deixar que a caneta alcançasse a base do seu recipiente. Essa pena molhada, com a quantidade adequada de tinta em sua concha, permitia escrever duas ou três linhas antes de se retornar ao tinteiro. De qualquer forma, até concluir a escrita pretendida, o reabastecimento dessa pena era repetido com bastante freqüência.
A escrita à tinta não era uma tarefa fácil, pois, além de manejar a caneta, o usuário tinha também que calcar a pena sobre o papel. Isso requeria um aprendizado prolongado: na escrita a pena devia ser aplicada sobre o papel com leveza e controle para que a ranhura existente na sua extremidade não se abrisse além do necessário, caso contrário a tinta escorreria, acumulando em excesso na escrita, dando origem a borrões.
Para evitar esses borrões usava-se um papel chamado mata-borrão, que absorvia a tinta excedente, favorecendo também a secagem de todo o trabalho. Isso era importante, pois qualquer pequeno deslize de uma das mãos sobre o texto ou outro qualquer acidente poderia acontecer de manchá-lo. Por essa razão era o mata-borrão considerado material escolar e obrigatoriamente o aluno deveria portá-lo, usando-o por ocasião de treinos com a caneta a bico-de-pena e, indispensavelmente, nas provas escritas. Ao término das provas, não raro, encontravam-se estudantes dos anos primários menos adiantados com as suas mãos e uniformes manchados de tinta, manchas que chegavam a alcançar os seus rostos ao coçá-los.
As penas de metal descritas antes, que em boa parte do século XX e anteriores desempenharam um papel preponderante no aperfeiçoamento e melhor agilização da escrita, tiveram, além de tantas destinações, uma outra muito importante e curiosa, ao nosso ver, como instrumento de ajuda no combate da varíola. A mesma pena de aço adquirida em caixinhas de papelão vendidas no varejo era usada pelo pessoal da Saúde Pública como material cirúrgico na aplicação da vacina contra a insidiosa moléstia.
Dessas penas molhadas no tinteiro, há uma inesquecível: a de ouro empunhada pela Princesa Isabel ao promulgar a lei de Abolição da Escravatura no Brasil, no dia 13 de maio de 1888. Este ato memorável, por ter sido assinado com uma pena de ouro, ganhou a denominação de Lei Áurea. A Princesa Isabel era filha do Imperador D. Pedro II e da Imperatriz Teresa Cristina e foi herdeira presuntiva do trono. Contam que teria sido ignorada não fosse o destino lhe colocar nas mãos, por três vezes, as diretrizes do poder administrativo do Estado na ausência do seu pai, governando com os Gabinetes Rio Branco, de 1871 a 1872; Caxias, de 1876 a 1877; Cotegipe e João Alfredo, de 1877 a 1888. Nessas ocasiões, a Princesa desempenhou relevante papel na alta magistratura imperial. Inúmeros acontecimentos se efetivaram durante o exercício dessa tríplice regência em favor das necessidades da estrutura do organismo governamental e da coletividade humana. Devem-se ao gênio empreendedor da grande princesa, dentre outros, os decretos de naturalização de estrangeiros no país, o primeiro recenseamento do Império, o desenvolvimento da ferrovia, a solução de intermináveis questões de limites territoriais e o restabelecimento das relações comerciais com os governos vizinhos. A lei de 1861, que libertava os nascituros dos escravos, ficou conhecida como Lei do ventre Livre, etc. Foram muitas penadas importantes apostas em documentos pela Princesa Isabel, mas a que lhe valeu maior consagração na história do Brasil foi a Lei Áurea e por esse ato de abnegação e justiça recebeu o título de “A Redentora”, outorgando-lhe o papa Leão XII a rara honraria da Rosa de Ouro.
Livro: Ecos de Vila Velha
Autor: José Anchieta de Setúbal. 2001
Compilação: Walter de Aguiar Filho, outubro/2011
GALERIA:
O navio em que Coutinho regressou ao Brasil tocou em Pernambuco e, com certeza, era de sua propriedade
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Ver ArtigoTalvez o regresso se tivesse verificado em 1547, na frota mencionada na carta de Fernando Álvares de Andrade, ou pouco depois
Ver ArtigoConcluo, dos nobres que aportaram à Capitania do Espírito Santo, ser ela a de melhor e mais pura linhagem
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