As Aventuras do Barão que desafiou o Imperador
Capixabas aventureiros havia muitos, no século XIX. E foram eles que abriram nas matas, a ferro e fogo, as picadas que se tornaram os caminhos e as estradas de hoje, ocupando os pontos menos conhecidos do nosso território e muitas vezes enfrentando a resistência de índios e a cobiça dos mineiros, nossos vizinhos.
Sim, foram muitos, mas poucos correram os riscos que Antonio Rodrigues da Cunha enfrentou desde a juventude, ao deixar para trás a vida confortável na cidade e, à frente de 100 escravos que recebera como herança, navegar pelo Rio São Mateus e desbravar a mata virgem, para construir sua grande fazenda, com barragem, usina de açúcar importada da Europa, o sobradão e uma ponte atravessando o rio.
Tinha apenas 22 anos, quando abraçou esse formidável desafio. E, quando o açúcar brasileiro perdeu grande parte do valor que tinha no mercado europeu, esse homem empenhado em ampliar as fronteiras da civilização, abandonou tudo, atravessou o rio e incendiou os canaviais, para abrir caminho até o distrito mineiro de Peçanha, onde o receberam com festa e já com o título de “Major”.
Inquieto e movido por sua atração insuperável pelo desconhecido, Antonio deixou para trás a fazenda da Cachoeira do Cravo e, atravessando terras dominadas por indígenas, cuja língua sabia falar perfeitamente, demarcou a área, fundou nova fazenda e plantou café nos contrafortes de uma serra a 12 quilômetros ao sul de Nova Venécia: a Serra de Baixo, como é conhecida hoje.
Por seu espírito de justiça, punindo exemplarmente o homem que raptara uma índia, conquistou o apreço e o respeito dos indígenas. Chegou a plantar um milhão de pés de café, nessa terra onde o homem branco jamais havia pisado. E também abriu nova picada (ou “picadão”) na mata virgem, entre Nova Venécia e São Mateus.
Mas esse pioneiro da cafeicultura não parou por aí. Antes mesmo da abolição, deu alforria aos escravos e, para garantir o povoamento de Nova Venécia, trouxe da Itália 60 famílias de agricultores. A região até se tornou conhecida como “Barracão”, devido à construção erguida por ele para abrigar as famílias italianas, nos primeiros tempos.
Era um incansável, esse Antonio, que ainda corrigiu várias curvas do Rio São Mateus, para facilitar a passagem das imensas canoas que, na época, transportavam a produção agrícola.
Em reconhecimento a essa obra gigantesca e pensando que teria sua eterna gratidão, o Imperador Pedro II concedeu-lhe o título de Barão – honraria muito disputada pelos poderosos da época. Mas Antonio Rodrigues da Cunha era homem feito de outra têmpera: por pertencer ao partido político contrário ao de Pedro II, jamais assinou seu nome ao lado do título com que o Império o agraciou.
Tempos depois, ajudaria a eleger dois governadores – Graciano Neves e Constante Sodré – e até o seu falecimento, em 1893, com apenas 58 anos de idade, exerceu forte influência na política capixaba, sem jamais esperar por recompensa pessoal. Homens assim nunca dependeram de títulos e homenagens, para se consagrarem como heróicos civilizadores do Espírito Santo e do Brasil.
Autor: José Eugênio Vieira, Diretor Superintende/Sebrae ES
Compilação: Walter de Aguiar Filho, maio/2012
GALERIA:
Pero de Magalhães de Gândavo, autor da 1ª História do Brasil, em português, impressa em Lisboa, no ano de 1576
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