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Bacia do Rio Itaúnas é marco da luta dos escravos

Rio Itaúnas - 2012

Contar a história da Bacia Hidrográfica do Rio Itaúnas significa mergulhar na sociedade escravocrata do período colonial e descobrir as origens do povoado de Santana, em Conceição da Barra, onde se ergueu o mais importante foco de resistência escrava no Espírito Santo: o Quilombo do Morro.

De acordo com o historiador, escritor e ex-secretário de Estado da Cultura Maciel de Aguiar, a rebeldia dos negros ficou evidente nas várias ações organizadas, que levou a criação de locais específicos para receber os negros fugitivos das fazendas.

Entretanto, segundo ele, no tocante ao Espírito Santo, nada pode ser comparado ao Quilombo do Morro.

“O quilombo era uma cidadela com ruas, casas, lavoura e fortificação. Por lá passaram cerca de duas mil pessoas. Ocorriam lutas armadas entre guerreiros africanos e capitães-do-mato. Foram cerca de 30 anos de resistência, após a criação, em 1852, da Guerrilha de São Mateus, a pedido do governo da província do Espírito Santo”, narra Maciel.

Ele vai publicar nos próximos dias a obra “As Histórias dos Quilombolas”, onde conta com riqueza de detalhes os principais acontecimentos do único foco de resistência negra organizada genuinamente capixaba.

Sob as lideranças de Negro Rugério e Silvestre Nagô, o quilombo teria conseguido se reerguer por diversas vezes até que, em julho de 1881, foi completamente destruído. As batalhas teriam levado à morte de aproximadamente 500 pessoas.

Ao longo de mais de um século, muitas famílias remanescentes das comunidades quilombolas de Conceição da Barra permanecem nessas terras, com sua diversidade cultural.

Princesa africana saqueava navios

Um fato curioso foi marcante na história da bacia do rio Itaúnas. No final do século XVII e início do século XVIII, viveu na região a princesa angolana Zacimba Gaba, da nação de Cabinda, que foi capturada e trazida para o Brasil como escrava.

Comprada pelo fazendeiro José Trancoso, da Capitania de Porto Seguro, no Recôncavo Baiano, ela foi levada para a sua fazenda em Riacho Doce. Em1674, a capitania incorporou toda a região de São Mateus, que pertenceu à Bahia.

Conforme conta o historiador e escritor Maciel de Aguiar, a princesa teria envenenado o fazendeiro com o que ficou conhecido na época como “pó de amansar senhor”, uma espécie de veneno da jararaca. A cabeça da cobra era queimada e torrada. O pó misturado à comida dos senhores pelas mucamas.

Liberta, Zacimba passou a liderar, no período de 1695 a 1710, um grupo de escravos fugitivos que saqueava navios vindos de Angola abarrotados de escravos, na foz dos rios Mucuri e Cricaré.

Sempre em ataques noturnos, quando a tripulação estava dormindo, a princesa e seus comandados chegavam em canoas, subiam ao convés e pegavam os mercadores de escravos desprevenidos.

Segundo narra o escritor, no ano de 1710, Zacimba foi morta e todo o seu grupo após sofrer uma emboscada. Entretanto, a história da princesa que lutou contra a escravidão ficou registrada pela história.

Álcool e petróleo: base econômica

A região da Bacia Hidrográfica do Rio Itaúnas concentra as principais usinas alcooleiras do Estado e dois dos seus oito municípios – Conceição da Barra e São Mateus – recebem investimentos da Petrobras, que executa neles atividades de produção e exploração de petróleo.

Diagnóstico da bacia do rio Itaúnas elaborado pelo Grupo de Estudos e Ações em Recursos Hídricos (Gearh), da Ufes, conclui que, apesar de pobre em fertilidade natural, os solos têm alta capacidade de uso intensivo e mecanizado, devido ao relevo plano a ondulado, o que responderia ao fato de mais de 60% da produção de álcool do Estado estar concentrada na região.

Cerca de 65% da água é usada para atender às atividades agropecuárias. Porém, as alcooleiras também têm papel importante. As atividades tradicionais, como a agricultura do café e a pecuária leiteira, têm aberto espaço à fruticultura, com destaque para o mamão, e para a agroindústria de papel e celulose.

O município baiano de Mucuri detém 8,1% de toda a bacia do rio Itaúnas. Representada pela Bahia Sul, empreendimento de grande porte instalado no início dos anos 90 em Itabatã, distrito de Mucuri, a empresa possui grandes áreas, principalmente no Sul da Bahia e no Norte do Estado, com plantios de eucalipto para produção de celulose.

Força de um barão

Um dos homens mais ricos do Império, o fazendeiro Olindo Gomes dos Santos Paiva, o Barão de Timbuí, deixou uma importante contribuição para história: foi um dos financiadores do telégrafo no Brasil (1852), o que, inclusive, lhe teria rendido o título de nobreza.

Segundo relato do escritor e historiador Maciel de Aguiar, homem voltado para as letras e a ciência, D. Pedro II participou de uma exposição nos Estados Unidos, onde teria tido o primeiro contato com o aparelho.

Entusiasmado, chegou ao País repleto de idéias, mas não dispunha de recursos para bancar o empreendimento.

Sabendo do fato, o barão teria escrito carta ao imperador dizendo que contribuiria com o financiamento do projeto.

Rico, com uma boa fortuna construída a partir da produção de açúcar mascavo, inhame, farinha de mandioca e abóbora, o barão dispunha de todas as qualidades indispensáveis para a época – possuía várias posses (a vila de Itaúnas teria surgido de uma das suas fazendas), era solteiro e ostentava um título de nobreza.

Por isso mesmo, era cortejado pela elite escravocrata que queria casá-lo a qualquer custo.

O Barão de Timbuí morreu sem deixar herdeiros oficiais.

“Convidado a freqüentar a casa-grande, fugia à noite para a ‘quartaria’ onde dormia com as mucamas. Em suas idas ao Rio de Janeiro, escolhia até 15 negras para levar na viagem”, entrega o historiador.

Principal meio de transporte

Antes que a sua navegabilidade sofresse a influência negativa da abertura de uma foz artificial, na década de 80, o rio Itaúnas foi a “estrada” para a exportação do que era produzido na localidade, nos tempos da produção de farinha de mandioca.

Ângelo Camillo, 67anos, mais conhecido como “Caboquinho”, relembra do tempo em que o rio era o principal meio de transporte dos moradores.

Ele contou que até os anos 50 eram transportados cerca de 2,5 mil sacos de farinha, produzidos no local e levados para Conceição da Barra, em grandes canoas.

“Todo o transporte do que era produzido aqui ia pelo rio. Levavam café, mandioca e até animais que eram criados para o comércio”, relembrou.

 

Fonte: A Tribuna, Suplemento Especial Navegando os Rios Capixabas – Rio Itaúnas - 29/07/2007
Expediente: Joel Soprani
Subeditor: Gleberson Nascimento
Colaboradora de texto e fotografia: Flávia Martins
Diagramação: Carlos Marciel Pinheiro
Edição de fotografia: Sérgio Venturin
Compilação: Walter de Aguiar Filho, setembro/2016

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