História debaixo da areia - Itaúnas
Quem caminha sobre as dunas de Itaúnas, entre o mar e a região alagada pelo rio, está passeando sobre a história de uma vila que foi, aos poucos, sendo coberta pela areia fina até desaparecer. Bastam algumas horas de conversa com moradores mais antigos, para entender por que o local é cercado de lendas.
Até a década de 50, era lá que viviam os primeiros moradores. Eram apenas duas ruas – a “de cima” e a “de baixo” – e pouco mais de 100 casas, a maioria de estuque, construção feita com madeira e barro.
Uma das principais atividades econômicas era a produção de farinha, feita nas dezenas de farinheiras espalhadas pelas propriedades, e levada para Conceição da Barra através do rio. Também havia pescadores e algumas pessoas viviam do comércio do que produziam, às margens do rio Itaúnas.
A partir de 1952, os moradores começaram a ser expulsos pela força da areia e a mudar para o outro lado do rio, onde fica a vila atual.
As dunas chegam a atingir 30 metros acima do nível do mar. Restaram poucos moradores da vila antiga para contar a história. Um deles é Ângelo Camillo, 67 anos, o “Caboquinho”, figura emblemática do lugarejo.
Ele garante que, embora muitos pensem que a areia soterrou tudo o que encontrou pela frente, estão enganados.
“Ela veio aos poucos. Não foi agressiva não. Foi pedindo licença, para aterrar. Ficava dois, três anos na porta da gente, jogando areia sobre as casinhas de estuque. Muita gente acha que tem casas debaixo da areia, mas as pessoas foram tirando tudo”, contou.
O primeiro a desaparecer sob História debaixo da areia as dunas foi o cemitério da vila. Em seguida, a Igreja de São Sebastião foi soterrada. O biólogo André Luiz Campos Tebaldi, gerente do Parque Estadual de Itaúnas, explicou que o principal motivo para a formação das dunas foi a destruição da vegetação de restinga.
Ele ressaltou que o movimento da areia continuou com o tempo. Hoje as dunas estão mais baixas em alguns pontos. Exemplo disso é que as ruínas e o mastro da igreja já despontam em meio às “montanhas” de areia.
Hoje uma das diversões preferidas dos turistas é escalar a areia fina e clara, seja em dias ensolarados ou noites de lua cheia.
“As dunas são bem bonitas e interessantes. Uma vez rolei nelas e cheguei embaixo que nem um bife à milanesa” diverte-se a estudante Jéssica Nascimento de Souza, 11, que mora em Vitória, mas sempre passa férias no balneário.
Patrimônio humano de Itaúnas
Simpático, alegre e sempre disposto a conversar horas para contar aos visitantes histórias da vila de Itaúnas. Esse é Ângelo Camillo, 67 anos, mais conhecido como “Caboquinho”, que nasceu ainda na vila antiga e pode ser considerado patrimônio histórico da região.
“Caboquinho” se mudou com a família logo depois que a areia começou a invadir as casas.
“Quando surgiu a vila nova, todo mundo foi passando para cá e construía suas casinhas. Trabalhei 12 anos nessa obra”, contou.
Ele se diverte com as histórias que se espalham e rondam a vila antiga. “Já vi dizerem até que aquilo foi praga de um padre. Na verdade, o que aconteceu foi que a areia cobriu o mato e passou por cima até de árvores”, afirmou.
“Aqui é muito bom, não tem violência, pobreza, todos são amigos. Graças a Deus”, concluiu.
Vila vai ser reurbanizada
A vila de Itaúnas ganhará uma praça, um portal de entrada, calçadas gramadas e estacionamento para ônibus e carros. Além disso, terá rede de tratamento de esgoto e o trecho da rodovia ES-010, que a liga à estrada de Conceição da Barra, será pavimentado. As primeiras obras começam ainda este ano.
O secretário de Turismo do município, Bilirrelli da Cunha Monte, garante que o objetivo é manter as características rústicas da vila, para que ela não perca o ar bucólico que atrai os turistas.
O projeto está sendo coordenado pela Secretaria de Estado do Turismo (Setur), com recursos do Ministério do Turismo.
“Estamos procurando resgatar a história da vila e trabalhar em conjunto com o meio ambiente. Vamos fazer um trabalho para definir melhor as ruas, colocar calçadas de grama. Na área em frente à Igreja de São Sebastião será construída uma praça, para as manifestações culturais dos moradores”, disse o secretário.
Antes da entrada da vila será construído um estacionamento para que ônibus e carros não precisem circular pelas ruas internas, que continuarão sem calçamento. Apenas 20, dos 21 quilômetros da estrada serão pavimentados. O último quilômetro continuará sendo de terra.
A gerente de Estudos e Negócios Turísticos da Setur, Carla Rezende Bastos, explicou que os recursos virão do Programa de Desenvolvimento do Turismo do Nordeste (Prodetur).
Juntamente com recursos do Estado, o convênio para as obras de esgotamento sanitário deve ser assinado até o próximo dia 15. Com investimento de R$ 3 milhões, as obras devem durar seis meses, sendo o primeiro passo para o projeto de reurbanização, que deve começar a ser executado em 2008.
O diretor-geral do Departamento de Estradas de Rodagem do Espírito Santo (DERES), Eduardo Mannato, explicou que o projeto de pavimentação da rodovia está em fase de estudos, mas deve ser executado até 2009.
Folclore atravessa gerações
As manifestações culturais e religiosas são muito fortes e atravessam gerações, em Itaúnas, num reflexo do sincretismo entre a doutrina cristã e as tradições africanas.
Todos os anos, tudo se mistura nos dias 19 e 20 de janeiro, na homenagem a São Sebastião. Entre as mais fortes está o Ticumbí, tradição quilombola de mais de 300 anos. Também há o Rei de Bois e o
Jongo. Contam os antigos que o Ticumbí começou na fazenda do Barão de Timbuí. Ainda restam suas ruínas, a 12 quilômetros da vila.
“O Ticumbí é uma roda de dança. Foi trazido pelos escravos no tempo do barão, às margens do rio Itaúnas. Eles pediram licença para montar essa brincadeira da África. Todos se enfeitam com capacetes com fitas coloridas, tocamos violas, pandeiros e brincamos de reis”, explicou Ângelo Camillo, 67 anos, que faz parte de um dos três grupos da vila.
Também há o Rei de Bois, com foliões entoando louvores aos Reis Magos. Uma procissão segue pelas casas e todos entram na brincadeira, com a soltura de uma espécie de boi bumbá. Na praça da Igreja de São Sebastião, a tradição conta ainda com a puxada e a fincada de mastro.
Fonte: A Tribuna, Suplemento Especial Navegando os Rios Capixabas – Rio Itaúnas - 29/07/2007
Expediente: Joel Soprani
Subeditor: Gleberson Nascimento
Colaboradora de texto e fotografia: Flávia Martins
Diagramação: Carlos Marciel Pinheiro
Edição de fotografia: Sérgio Venturin
Compilação: Walter de Aguiar Filho, setembro/2016
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