Dois visitantes ilustres a Linhares
No final de 1815, visitou o rio Doce o Príncipe Maximiliano Wied Neuwied, que deixou-nos observações preciosas sobre o pequeno povoado de Linhares. Esteve na Fazenda Bom Jardim, onde recebeu “calorosa acolhida”. Lá encontrou um engenho de açúcar em produção, o primeiro do rio Doce, e plantações de arroz, mandioca e cana. O povoado era “insignificante”, com casas feitas de barro, não caiadas e cobertas de folhas de palmeiras. “Servia de igreja uma simples casinha” e existia no meio da praça um cruzeiro rústico feito de um tronco de sapucaia. Havia um pároco que causava grandes problemas à população pelos seus desmandos e pela proteção que lhe dava Rubim, chegando a ponto de causar uma desavença insolúvel entre o governador e João Filipe. A população compunha-se de um alferes, Cardoso da Rosa, que comandava o posto militar, o padre, um cirurgião-mor, soldados e alguns colonos que residiam em volta da mencionada praça, no grande platô argiloso à beira do rio. Ali em volta mesmo faziam as suas plantações, ou em, algumas ilhas próximas. Fazenda, só a de João Filipe Calmon.
Para proteger o povoado, havia o Posto Militar e, para os restante da população do rio Doce, mais sete “no interior da floresta”, de Regência ao Porto do Souza.
Mencionou que os soldados eram bem armados e protegidos por uma “couraça”, chamada “gibão d’armas”, que era vestida pelos que iam patrulhar as matas, como defesa contra as flechas dos índios. Informou ainda que, no ano seguinte, estando o Príncipe no rio Mucuri, soube que o Povoado de Linhares sofrera um pesado ataque dos botocudos, que colocara em pânico a pequena população, com receio de serem devorados pelos índios, como corriam notícias. Muitos habitantes fugiram, mas João e Filipe e sua família, escravos e alguns soldados “fincaram pé firme”, resistiram e transformaram a Fazenda “numa fortaleza até que chegaram reforços mandados pelo Governador”.
Apesar dessas dificuldades, algum comércio necessariamente se fazia: os mineiros desciam em canoas com carne, toucinho, rapadura e fumo, e os capixabas subiam o rio com sal e farinha.
Estava, pois, assim o povoado, quando aqui chegou o naturalista francês: Auguste de Saint-Hilaire. Como sua passagem por Linhares data de 1818, suas impressões são praticamente as mesmas do Príncipe.
Em seu livro, faz um breve histórico sobre o passado da povoação e descreve os lugares por onde viajou, principalmente o rio Doce. Refere-se à fertilidade das terras do vale e recolhe várias amostras de plantas, verdadeiras preciosidades para ele.
Parou no Porto de Regência e fez a viagem até Linhares numa canoa, pois “nenhuma estrada leva até Linhares, exceto uma trilha mal aberta, embaraçada de galhos e espinhos”. Desembarcou na Fazenda Bom Jardim, cujo dono estava ausente e com quem havia se encontrado antes no Rio de Janeiro. João Filipe lhe dera uma carta de recomendação e foi bem recebido por seus familiares, servindo-lhe de acompanhante o jovem Anselmo, filho do dono da Fazenda.
Achou o local do Povoado muito bem escolhido, e à “frente da plataforma onde se construiu Linhares, aprecia-se uma vista imponente e bastante alegre”. Fez uma descrição do lugarejo, com “choupanas dispostas em simetria nos 4 lados de uma praça perfeitamente quadrada, coberta de grama; estavam terminando a igreja e havia um Hospital Militar dirigido por um cirurgião-mor”. A força militar para toda a região do rio Doce “compõe-se de somente 50 homens”, ficando a maior parte em Linhares, dos quais alguns estabeleceram-se em dois pontos de apoio na floresta próxima para melhor vigilância contra os botocudos: “O quartel de Aguiar e o de Comboios.
Visitou a lagoa Juparanã, como tantos outros, antes e depois dele, falando sobre o rio Juparanã, vulgarmente rio Pequeno, que era bem diferente do que é hoje: no canal por onde a lagoa deságua no rio Doce, as árvores eram tantas nas margens que os ramos de uma e outras se entrelaçavam formando uma “abóbada por cima da ribeira e algumas se inclinavam em seu leito”. Os cipós cruzavam-se de tal maneira que mal se vai o céu. Depois, empolgado coma beleza da lagoa Juparanã, acreditava que, no futuro, “este lugar será, por certo, um dos mais belos do Império do Brasil”.
Com isto, poderia ele estar se referindo ao aproveitamento turístico do local?
Pode ser.
Seguindo esta linha, acrescentamos:
- E ele não viu a fonte de água cristalina que jorra continuamente de uma das altas barrancas que circundam a lagoa! E outro platô existe onde se construiria uma pousada, como tantas que margeiam os grandes e belos lagos de outros países. Poderia ser feito um ancoradouro para barcos, que seriam alugados, dirigidos por um bom canoeiro e nadador – porque a lagoa é bem funda em alguns trechos – para que turistas pudessem admirar a paisagem ou praticar esqui aquático. Para os amantes de boas pescarias (e não muito bons pescadores), outros barcos também poderiam ser alugados no ancoradouro, orientados por tantos em Linhares conhecedores desta prática. Caminhos de pedregulhos, margeados de pequenas plantas e gramados, levariam à gruta que ali existe ou á mina d’água. Clareiras abertas, como pequenas jóias na mata, serviriam a jogos diversos e, junto às seculares árvores que ali existem, poderiam ser plantados arbustos floridos ou cercas-vivas de folhagens multicolores, As praias, limpas e cuidadas, seriam outras entre tantas atrações.
Se sonhos como este, que sabemos ser de muitos linharenses, se tronassem realidade, não só ocupariam tanta mão-de-obra ociosa, como poderiam fazer da lagoa Juparanã uma nova Guarapari de água doce!... Só assim a previsão de Saint-Hilaire não se perderia no tempo nem na noite dos sonhos, passando a ser dos dias presentes.
Fonte: Panorama Histórico de Linhares, 1982
Autora: Maria Lúcia Grossi Zunti
Compilação: Walter de Aguiar Filho, fevereiro/2012
Pero de Magalhães de Gândavo, autor da 1ª História do Brasil, em português, impressa em Lisboa, no ano de 1576
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