O anti-retrato de Dorian Gray
No topo da Don Fernando esquina com Padre Nóbrega, ali na cidade alta, continua o velho banco de pedra. Semicircular ele oferece acomodação a quem queira cismar sozinho. Ou a quem prefira namorar, de preferência sob o capote da noite. Não sei há quantos anos ele espia a cidade. Pra mim o banco sempre esteve ali plantado, observador e com a mesma dor imutável de pedra discreta. Indiferentemente às novidades. Granítico. Eternamente novo.
A doce Ilha do Mel, Vitória, faz 442 anos de idade. E me parece sempre a cada vez mais uma menina-moça predestinada a não envelhecer. Assim como uma novelista, que embora não se veja mais, teima em não sair da nossa memória. Com o seu colecionador colado ao peito. Na contracapa interna a estimulante fotografia colorida, arrancada Deus sabe de que Capricho, do ídolo Paul Newman.
No cais, em qualquer pedaço da beira-mar o sensual barulho da água roçando as pedras tem o mesmo tom. O tom que entristece a solidão de quem lamenta um amor perdido. Ou que estimula os sonhos de quem começa uma nova paixão. E a brisa é sempre a mesma. Ás vezes forte, de arrepiar cabelos. Ás vezes miúda, a provocar suspiros diante de uma baía tão grande que cabe uma dezena de navios. E tão pequena pra espraiar uma alegria imensa de quem não tem alma pequena.
Vitória conserva no formol do tempo até mesmo o enorme prazer de um caranguejo – que deve ser numa mesa do Davi, fervendo, vermelho. Gostoso e sensual, com os pelos negros a roçar os lábios de quem come e nem se dá conta disso. Nossos cabelos embranquecem, não os do caranguejo.
Nossos olhos, já opacos se recorrem de lentes pra comprovar que o céu azul da Ilha tem ainda a mesma transparência, acredito, que encantou os primeiros maratimbas.
Nossa memória já rateia, mas o mesmo coentro, com o mesmo sabor, está lhe esperando numa banca qualquer do mercado da Vila Rubim para temperar sua moqueca. A mesma de sempre, como se acabasse de ser criada a sua fórmula divina.
Vitória 442 anos. Como o anti-retrato de Dorian Gray. Enquanto nós envelhecemos ela continua cada vez mais moça, mais linda, mais desejável, mais sensual...
Nota do site: "O Retrato de Dorian Gray", filme de Oscar Wilde publicado em 1890 em que Dorian uma vez convencido de que juventude e beleza são tudo, realiza um pacto demoníaco pedindo para que seu retrato envelheça, enquanto ele permanece perene em sua beleza. Interessante que esses filmes clássicos com o passar do tempo ganham mais atualidade.
Fonte: Escritos de Vitória - Crônicas publicadas em 1993, na administração de Paulo Artung quando prefeito de Vitória, homenageando os 442 anos da Capital
Autor:Marcos Alencar
Compilação: Walter de Aguiar Filho
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