Primeira descrição - Imigração Americana
A barra, em sua grande força solitária, jaz à nossa frente, com nada para romper a monotonia da mesmice, exceto o quebrar das ondas, que se formavam metodicamente, fazendo um estrondo sombrio. E ainda nos sentíamos gratos, por mais enfadonho que fosse. Rapidamente nossa tenda foi armada, nossas camas de ferro, que abriam e fechavam com dobradiças, foram montadas para nosso uso e colchões lançados sobre elas. Elas eram pintadas em verde e eram razoavelmente bonitas. Cadeiras e bancos de acampamento foram espalhados.
Os cavalheiros andaram pelas redondezas e trouxeram gravetos, que foram pegos do chão, e fizeram fogueiras. Panelas de ferro foram requisitadas para cozinhar feijão preto, que havíamos trazido em abundância. Os feijões são muito duros e é fácil conservá-los como o café ou o arroz. Nós tínhamos certa quantidade de arroz também, e cada família possuía um amplo baú de latão cheio de bolachas, queijo e presunto cozido. Nosso primeiro almoço foi muito saboroso, e apreciamos a ocasião como um grande piquenique. Entre aqueles que estavam conosco havia grupos que já tinham sido pioneiros antes, e sua experiência era benéfica aos outros.
Quando a noite se aproximou julgamos recomendável que nosso grupo se separasse, alguns em busca de acomodações em uma casa, a menos de um quilômetro de distância, tendo sido informados de que podíamos ter nos abrigado lá. Alguns foram a pé, outros em canoas. Nossa família foi pela rota aquática. Uma residência, finalmente, surgiu em nossa visão, a viagem foi curta. Novamente desembarcamos. Vimos um dos primeiros telhados cobertos de sapê. A casa não tinha cerca em volta e os bodes permaneciam familiarmente próximos à porta sob os beirais pendurados. Passamos pelo rebanho e entramos, a pedido de Madame Oliveira, a senhora da casa. Ela possuía uma face amável e bela, parecia desejar que nos sentíssemos bem-vindos. Sua compleição tinha a cor negra brasileira, seu cabelo negro, liso e lustroso, seu vestido limpo e arrumado. Isso era agradável, na medida em que não esperávamos limpeza dentro enquanto bodes abundavam do lado de fora. Alguns dos cômodos possuíam piso de madeira, mas em sua maioria eram de terra. O melhor quarto continha uma bela cama francesa e duas cômodas. Uma era de um estilo antiquado e desajeitado, a outra mais moderna. Nossa gentil anfitriã fez tudo a seu alcance para que nos sentíssemos confortáveis, nem por um único momento pareceu perder sua paciência e estava nos servindo apenas de bom coração. Aprendemos que eles não aceitariam qualquer dinheiro pela sua hospitalidade aos americanos. A senhora aceitou pequenos presentes em jóias e artigos de vestuário para suas crianças. A moda e as mercadorias americanas eram de fato de valor para ela, pela sua novidade. Nós todos nos sentimos muito mais satisfeitos após termos retornado, de algum modo, essa gentileza genuína. Aqui estava uma verdadeira mulher, gentil, retraída, benevolente e fomos, imediatamente, acalorados, em coração, para com esses estrangeiros. Seu marido era capitão de uma escuna, que carregava Jacarandá ao Rio. Vimos outros homens indo e vindo, alguns pareciam instruídos. Parentes e visitantes vinham, três ou quatro de uma vez, atraídos pelos americanos, nós supusemos. Eles nos observavam com grande curiosidade, mas com deferência e polidez. Examinavam nossos trajes e realizavam comentários agradáveis.
Havia um grande cafezal, não distante da residência, ou casa, como as chamam, e caminhamos entre suas sombras, ao entardecer; sentindo que estávamos, de fato, em um novo país. Parecia-nos estranho não haver árvores frutíferas à nossa volta, em uma terra em que elas crescem tão abundantes, mas isso é o que ocorre, freqüentemente, em nosso próprio país quando tais luxos são obtidos e criados sem dificuldades, eles nunca são cultivados.
A grande questão das canoas, nas quais realizaríamos a viagem rio acima, foi o assunto que nos deixou absorto. Os homens se reuniram, fazendo planos, e as senhoras consideravam como suportariam a viagem desse modo insólito. Um grupo de cavalheiros tomou uma rota terrestre, a maioria a pé, em companhia do Coronel Gunter. O Sr. Roussell tinha certo número de escravos que o acompanhavam. Um grupo se foi, o restante estava preparado e esperando avidamente.
Cedo, na manhã seguinte, quando a luz estava apenas surgindo através dos interstícios do teto de folhas de palmeira, ouvimos vozes altas do lado de fora. Os camaradas chegaram, com canoas. Dormimos profundamente, embora sem luxo, já que muitos de nós usamos nossos próprios colchões, colocados lado a lado sobre o chão. Saímos nessa hora refrescante, para ouvir sobre o que se tratava toda aquela conversa alta. Observamos grandes gesticulações dos homens, que estavam apontando para as nuvens e ouvimos “muinta chuva” entre outras palavras que não entendemos, e a partir disso compreendemos que eles estavam apreensivos com a chuva e a jornada seria adiada até que tivéssemos tempo limpo. Como isso nos deprimiu! Outro dia! Talvez outro. Sim, nós fomos compelidos a esperar por tempo bom.
Fonte: Nossa vida no Brasil – Imigração Norte-Americana no Espírito Santo 1867-1870
Autora: Julia Louisa Keyes
Tradução e notas: Célio Antônio Alcântara Silva
Publicação: Arquivo Público do Espírito Santo, 2003
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