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A Árvore Negra do Queimado – Por Maria Stella de Novaes

A Igreja do Queimado

Conhecida de todos os capixabas e registrada, nas páginas da História, a Insurreição do Queimado representa, de certo, no Espírito Santo, a passagem mais dolorosa do século XIX. Descreveram-na penas eruditas. Falta-lhe apenas a contribuição de um poeta que, no fulgor de um poema, fixasse a culminância do sofrimento daqueles infelizes, castigados pelo crime de almejarem a liberdade! Elisiário, o cabeça, jaz no esquecimento, ainda, quando sua figura constitui, sem dúvida, motivo de pesquisa histórica e sociológica.

Perpetuou-se, nas lendas, surgidas, nos comentários do povo, em torno da referida revolta, de 1849. Uma relaciona-se com a fuga misteriosa, da cadeia, em Vitória; outra, com a morte, nas brenhas serranas ou mateenses. Desta, vamos tratar:

— Conseguindo fugir da prisão, na Capital, o Caudilho Negro, — no dizer do Sr. Dr. José Paulino Alves Júnior, — meteu-se nas matas da Serra, varou capoeiras, penetrou na selva do Queimado, errou... errou, perseguido sempre, dos capitães-do-mato.

Uma caçada humana impiedosa, selvagem!

Elisiário, porém, antepunha as privações da solidão, à morte, nas mãos dos seus algozes, estribados na Justiça. Comendo frutos agrestes ou recebendo, furtivamente, uma ração partilhada pelos seus companheiros mais afortunados, o escravo sentia o esgotamento das próprias forças e, entre horrorizado e esperançoso, — a aproximação lenta e fatal da morte. Aturdido, porque avaliava o abandono do seu corpo às feras e às aves necrófagas, sem ao menos expirar, recebendo um beijo da esposa e a prece de um crente! Teria apenas o repouso, no tapete úmido e ralo de musgo, sob a ramagem densa da floresta. Esperançoso de receber, afinal, o conforto da Paz, no seio de Deus!

Assim, desapareceu Elisiário!...

Não festejaram os brancos, — os senhores, — a glória de enfrentar o "negro fugido". Trucidá-lo!

Jamais lhe encontraram o corpo.

Resta somente aos seus perseguidores o perpetuar da sua memória, numa lenda: — Contam os antigos a aparição de um vulto, semelhante a uma árvore, árvore enorme e negra, nas matas do Queimado. Parecia assinalar a sepultura de Elisiário, cavada pelos seus companheiros, errantes, na mata. Parecia cabiúna. Temiam todos que os machados e as serras a atingissem. Desaparecia, misteriosamente, quando um corajoso se lhe aproximava, sem contudo conseguir localizá-la.

O avanço das gerações posteriores à Abolição, alheias ao fantasma de Elisiário, foi devastando as matas do Espírito Santo. O Queimado entrou em decadência. Ninguém mais cogitou de averiguar a existência da árvore lendária. O certo é que, tolhido na realização do seu ideal de conseguir a liberdade, na Terra, o Caudilho Negro libertara-se, para a vastidão eterna do Além!

Encontrou, certamente, a Santa Rainha!

(Dos jornais da Biblioteca do Espírito Santo.)

 

Fonte: Lendas Capixabas, 1968
Autora: Maria Stella de Novaes
Compilação: Walter de Aguiar Filho, setembro/2015

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