A situação econômica do Espírito Santo (1979)
Assim que tomou posse, o governador Eurico Rezende denunciou as precárias condições financeiras do Espírito Santo, chegando mesmo a classificar a situação como "calamitosa". Apresentando dívidas num total superior a Cr$ 5,5 bilhões, o Estado enfrenta problemas que se originam principalmente da forma como se efetua a cobrança do ICM e, no momento, não consegue sequer pagar os funcionários públicos com a receita existente.
Na opinião do ex-secretário da Fazenda, Armando Rabello, a prioridade básica deve ser a modificação do sistema tributário. Por sua vez, empresários dos setores comercial, agrícola e industrial fazem um diagnóstico da situação econômica e propõem uma série de medidas destinadas a atenuar os problemas. Todos concordam, entretanto, que será necessária uma ajuda cada vez mais decidida do governo federal para que algum resultado duradouro seja alcançado.
Logo a pós tomar posse no Palácio Anchieta, o governador Eurico Rezende declarou repetidas vezes que a situação financeira do Estado era altamente delicada chegando mesmo a classificá-la como "caótica", "Calamitosa" e adjetivos semelhantes.
Para o ex-secretário da Fazenda, Armando Rabello, entretanto, a situação do Espírito Santo não é diferente da que se verifica na grande maioria dos estados brasileiros: “nem é pior nem melhor. O que acontece é que, indiscutivelmente, precisamos contar com a ajuda do governo federal, que, de resto, tem prestado toda assistência não só a nosso Estado, como a todas as unidades da federação, dentro das possibilidades, é lógico. Sem dúvida alguma, a situação é difícil, mas ao tomar posse, o governador Eurico Rezende recebeu toda a documentação relativa ao assunto com detalhamento das dívidas e ônus com os quais teria de arcar”.
Mostrando-se constrangido em chegar a minúcias sob o montante das dívidas legadas ao novo governador, Armando Rabello explicou que um dos fatores que mais tem pesado para o quadro que tem se verificado no Espírito Santo é a mecânica da cobrança do Imposto sobre Circulação de Mercadorias (ICM): "Antigamente, o imposto era cobrado a cada operação sofrida pela mercadoria. Assim, se uma determinada mercadoria custava 100 cruzeiros, ao sair da fábrica ela sofria a primeira tributação. Assim que ela era vendida para o distribuidor, nova tributação, novo pagamento. E assim por diante, até chegar às mãos do consumidor. Dessa forma, a tributação era feita sobre todos os intermediários do produto. Com a implantação do ICM, entretanto, a cobrança do imposto abrange apenas a diferença de preço entre o momento em que ela chega à loja onde será comercializada, sem contar, é claro. com a tributação feita no momento em que ela sai da fábrica. Por outro lado, grande parte dos produtos comercializados pelo Espírito Santo (gêneros de primeira necessidade em geral, hortifrutigranjeiros, etc), é isenta do pagamento do ICM, o que acaba complicando ainda mais a situação do Estado Antigamente, nosso balanço não apresentava déficit. Foi a partir da implantação do ICM que os problemas se avolumaram, a ponto de chegar na situação realmente difícil que temos agora".
Na opinião de Armando Rabello, enquanto não se modificar o sistema de tributação, os problemas não serão resolvidos. Segundo revelou, algumas mudanças estão sendo estudadas e aguardam uma definição do governo federal. Para ele, uma das soluções que poderiam resolver, pelo menos em parte, seria permitir a elevação das alíquotas de ICM e a diminuição das alíquotas do Imposto sobre Produtos. Industrializadas (IPI), o que propiciaria um maior equilíbrio entre os estados mais industrializados e os de natureza essencialmente agrícola. Outra sugestão é no sentido de fortalecer o sistema financeiro dos Estados, para que eles possam se desvencilhar melhor dos problemas.
Voltando ao caso específico do Espírito Santo, Armando Rabello referiu-se aos problemas das recentes enchentes, "cujos efeitos perduram. No entanto, observa-se a tendência de que os problemas venham a ser superados, o que poderá contar com a ajuda da safra do café, que será grande e será comercializada a preços altamente favoráveis". A respeito do pagamento do funcionalismo estadual, que sempre foi feito em dia na administração anterior, o ex-secretário da Fazenda explicou que na época, havia a possibilidade de remanejar recursos, o que ajudava bastante a que se mantivesse o pagamento em dia. Ele explicou que atualmente não mais é possível recorrer a esse mecanismo, uma vez que a rígida política de contenção de despesas impede essa prática, devido ao rigoroso controle sobre a movimentação dos recursos.
Mesmo assim, para Armando Rabello não há motivo para susto.
— A partir de 1980, a grande maioria que opera no Espírito Santo sob o regime de incentivos fiscais, perderá essa facilidade, com o que haverá uma saudável injeção de recursos nos cofres estaduais. Além disso, também dentro de pouco tempo, a Companhia Ferro e Aço de Vitória deverá duplicar ou até mesmo triplicar sua produção, gerando um aumento considerável na arrecadação de impostos. Por outro lado, várias indústrias em fase de implantação começarão a produzir, sem contar com isenção de impostos. Sem contar com Tubarão, cuja produção deverá iniciar-se em 1983 e se constituirá na redenção da economia capixaba. Pelos contratos, pelo menos nos dois primeiros, 2/3 terços de sua produção serão comercializados dentro do território nacional, o que representa inestimável fonte arrecadadora de ICM.
Armando Rabello explicou "que todas essas medidas visam aumentar a arrecadação de ICM, termômetro da economia de um Estado", e disse que cerca de 93% dos recursos estaduais advêm desse imposto, sendo que qualquer impacto nesse setor desequilibra a situação do Estado.
COMÉRCIO
Presidente da Federação do Comércio do Espírito Santo, vê o endividamento do Estado de forma, natural Antônio Oliveira Santos, presidente da Federação do Comércio do Espírito Santo, vê o endividamento do Estado de forma, natural: “Todos os governos anteriores, com raras exceções, realizaram as obras essenciais de desenvolvimento com a colaboração do Governo Federal, e, no governo passado, não só a União colaborou, mas até estimulou a administração estadual a que ela se endividasse, através de empréstimos, até mesmo externos sendo o Espírito Santo um Estado eminentemente consumidor, apenas tendo no momento a Companhia Vale do Rio Doce como seu verdadeiro pólo de desenvolvimento econômico e a Aracruz Celulose começando a brotar, não existe outra alternativa senão o governo federal, como fez anteriormente, ajudar o governador Eurico Rezende a sair da difícil e aflitiva situação financeira".
No que se refere à tributação, Antônio Oliveira Santos acredita que "o Governo Federal tem que adotar uma medida urgente para promover a revisão nos critérios estabelecidos para o ICM, sem o que o empobrecimento de Estados e municípios se processará de forma acelerada e chegará a um Estado falimentar, impossível de ser recuperado a não ser com a continuidade dos sucessivos empréstimos a fundo perdido que o governo faz a quem está em dificuldades. "Ressaltou também que os governos estaduais devem estabelecer princípios rígidos para a admissão de funcionários públicos, dizendo que é surpreendente o número de funcionários em certos organismos, que nada representado para o esforço de desenvolvimento econômico e social". Daí porque, disse ele, "o Estado muitas vezes não ter dinheiro para suprir o pagamento da própria folha".
A respeito da sua área de atuação específica, o comércio, Antônio Oliveira Santos afirmou que o recente pacote antiinflacionário, que restringiu as vendas pelo sistema de crediário, não afeta diretamente os estabelecimentos comerciais. Ele disse que, pela sua própria estrutura, o comércio se amolda às conjunturas econômicas que se apresentam:
— No meu entender o maior prejudicado com a nova sistemática introduzida será a indústria e, por via de conseqüência, o comprador, que não pode mais ter na mesma proporção os produtos essenciais à vida moderna, como ocorria anteriormente, com as facilidades dos prazos elásticos. O governo parece não ter entendido que não são as vendas em 12 ou 18 meses que trazem influência no processo inflacionário, mas sim os programas de desenvolvimento da economia com base em projetos das empresas públicas ou sociedades de economia mista. Muita coisa precisa ser vista e revista no Brasil, a começar pelo preço da gasolina e da urgente necessidade de se produzir álcool carburante, a fim de que o Brasil se desprenda das pesadas peias das importações petrolíferas, que minam nossas economias em mais de 6 milhões de dólares anuais".
Mas foi sobre o chamado pacote antiinflacionário que Antônio Oliveira Santos lembrou ao governo que, pelas classes produtoras, as autoridades federais podem ficar tranqüilas, porque "hoje no Brasil ninguém aspira mais pelo declínio inflacionário senão o povo e o empresariado, porque ninguém suporta mais o descontrole econômico".
INDÚSTRIA
Segundo o presidente da Federação das Indústrias do Espírito Santo, Osvaldo Vieira Marques, as dificuldades anunciadas pelo governador Eurico Rezende, são comuns a todo início de governo, e de certa forma, refletem um quadro geral comum a todo o país. Ele afirmou que é natural, os administradores, principalmente em fim de mandato, realizarem o máximo possível de obras e só depois de sair é que se verificam as conseqüências. Assinalou que todos os políticos procuram deixar seu nome marcado nas realizações que empreendem. Sobre a situação em que se encontram atualmente as indústrias cedidas em nosso estado, declarou que todos estão numa espécie de compasso de espera, uma vez que é necessário retomar o ritmo, de acordo com as diretrizes da nova gestão, explicando que isso ocorre normalmente quando são substituídas as autoridades. "Esses períodos geralmente são caracterizados por uma certa recessão. Vários projetos que poderiam estar sendo impulsionados estão parados, à espera de uma orientação mais definitiva sobre os rumos que se pretende adotar".
Além disso, declarou que as enchentes ocorridas no início do ano realmente representaram um duro golpe na economia capixaba. Perguntado sobre o real alcance desse golpe, comentou que isso poderia ser medido pela importância que Linhares e Colatina têm no contexto da economia estadual. Frisou, entretanto que, já está havendo uma reação não só devido ao trabalho do governo estadual, mas também decorrente da ajuda federal, que, em sua opinião, deve continuar, até a perfeita normalização da situação.
Falando sobre restrição ao crédito, Oswaldo Vieira Marques admitiu haver uma série de problemas nessa área, principalmente no que se refere aos juros. Observou que, ao mesmo tempo em que promove a liberação dos juros para desconto de duplicatas, o governo os reduz para o capital de giro, o que acaba dando no mesmo. Em sua opinião, os juros, a exemplo do que ocorre com os produtos, também deveriam ser tabelados pois, segundo suas palavras, o atual sistema prejudica os industriais.
Mas é a respeito do Decreto-Lei 880 que Oswaldo Vieira Marques tem mais críticas a fazer. Para ele, a prorrogação desse incentivo fiscal por apenas um ano gerou um clima de incerteza entre os empresários, que, dessa forma não podem fazer projetos de “longa maturação”, uma vez que se torna impraticável prever se o dispositivo estará ou não em vigência. A seu ver, a prorrogação por apenas um ano fará com que seja necessária nova conscientização das autoridades federais para que, revalidado o DL-880, e seja efetivado e com isso traga segurança aos industriais.
Oswaldo Vieira Marques adiantou que o secretário extraordinário para projetos especiais, Cristiano Dias Lopes Filho, está entrando em contato com a Federação das Indústrias a fim de estudar uma, estratégia visando a continuação dos incentivos fiscais, que beneficia principalmente às pequenas e médias indústrias, as quais segundo informou, representam numericamente muito melhor o setor industrial do que as empresas maiores. Em sua opinião, a continuação do DL-880 significará um ponto de partida para a elaboração dos projetos especiais que espera sejam implantados ao longo da administração Eurico Rezende.
O presidente da Federação da Agricultura do Espírito Santo, Carlos Lindenberg Filho, declarou que é difícil ter uma noção exata do estado em que encontra o setor em todo o Espírito Santo, uma vez que nenhum levantamento preciso foi efetuado para esse fim, até mesmo pela falta de possibilidade física de realizá-lo tendo em vista que grande número de estradas se encontra intransitável, desde as enchentes de janeiro e fevereiro.
Outra dificuldade para se traçar um perfil real da situação agrícola estadual é a diferença de culturas e das dimensões de cada propriedade: "não se pode tomar como base os plantadores de cacau, café e outros produtos que vêm obtendo bons preços, pois esses produtos estão mais concentrados em grandes propriedades. O que eu posso dizer é que, em termos atuais, existe uma certa retração de crédito, mas há perspectivas favoráveis".
No que se refere aos agricultores mais carentes, Carlos Lindenberg Filho espera que as medidas anunciadas recentemente pelo ministro Delfim Neto, da Agricultura, possam melhorar sua situação, partindo da certeza de que as medidas serão realmente aplicadas e poderão ajudar bastante, principalmente se contar com a colaboração dos agricultores, segundo ele, condição indispensável para o êxito de qualquer iniciativa do gênero.
Na opinião de Carlos Lindenberg Filho, a primeira providência que precisa ser tomada é a imediata recuperação das estradas afetadas pelas enchentes, para o que é necessária uma participação efetiva das autoridades federais, cuja presença só se fez sentir pela vacinação em massa realizada quando as águas começaram a baixar, além de construção de residência para os que ficaram desabrigados em conseqüência das chuvas.
Fonte: Jornal A GAZETA - Caderno 2, Artes e Lazer, 28/05/1979
Compilação: Walter de Aguiar Filho, janeiro/2015
GALERIA:
Pero de Magalhães de Gândavo, autor da 1ª História do Brasil, em português, impressa em Lisboa, no ano de 1576
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