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Nossa Senhora da Penha é a Padroeira do Espírito Santo — Por quê?

Nossa Senhora da Penha

— Nossa Senhora da Penha é a Padroeira do Espírito Santo.

— Por quê?

Já escrevemos, em capítulo anterior que a Bula de Urbano VIII, de 23 de março de 1630, proclamava a Virgem Maria, sob o título da Penha, — a protetora da terra espírito-santense. Por isso, a 26 de Janeiro de 1908, em todas as paróquias da Diocese, realizou-se um plebiscito, a fim de auscultar-se a vontade do povo, em relação ao documento pontifício. Mas, o resultado foi de verdadeira eleição, confirmando-se espontaneamente a confiança dos capixabas na intercessão de Nossa Senhora da Penha, sobre os destinos da sua Diocese. Enviado para Roma, o resultado, com expressiva mensagem de Dom Fernando Monteiro, recebeu, a 27 de Novembro de 1912, o seguinte despacho.

N° 117 s, c,

1912

 

DO ESPIRITO SANTO NO BRASIL

Desde os tempos mais remotos os fiéis cristãos da Diocese do Espírito Santo acompanham com grande carinho o exercício da devoção à Santíssima Virgem Mãe de Deus, sob o título popular — da Penha, cuja imagem pintada num quadro de madeira, foi primeiramente exposta à veneração pública, no ano de 1558, e, em seguida, colocada no templo sobre um alto monte (situado à entrada do porto de Vitória) generosamente construído e dedicado à Imaculada Mãe de Deus, sob o título da Penha da Cidade da Vitória, que é a sede episcopal da célebre Diocese. Por motivo dessa insigne piedade, como a Diocese do Espírito Santo ainda não gozasse de um celeste Patrono, o clero e o povo relembram o decreto de Urbano VIII, de 23 de Março de 1630, escolhendo a Santíssima Virgem Maria, sob o título da Penha, como sua principal Protetora junto a Deus e apelam com suplicantes votos, para que o Rmo. Sr. Dom Fernando de Souza Monteiro, Bispo do Espírito Santo, consiga essa confirmação apostólica do Santíssimo Padre Pio X. Por conseguinte essa súplica, sendo deste modo exposta ao abaixo assinado — Cardial Prefeito da Sagrada Congregação dos Ritos, por sua suprema autoridade constituiu e declarou a Santíssima Virgem Maria, sob o título popular — da Penha, principal Padroeira de toda a diocese do Espírito Santo, no Brasil: com todos os privilégios e honras, atribuídas à mesma Padroeira, que competem, por direito, aos principais patronos; assinado na festa da mesma Santíssima Virgem Maria da Penha, segunda-feira da oitava da Páscoa; conforme entrou em voga o memorável costume de celebrar a mesma festa, no mesmo lugar.

A não ser que se mande o contrário.

Dia 27 de Novembro de 1912

Card. Martinelli, Prefeito

(as) Pedro Lafontaine

 

Correram assim os anos, durante os quais, além da bênção festiva do altar, outras solenidades, principalmente as tradicionais da segunda-feira, acima referida, atraiam os devotos de Nossa Senhora ao convento lendário. Nenhuma personagem importante chegava à capital do Espírito Santo e omitia uma visita à Penha. Assim, ali estiveram a 16 de Maio de 1911, a escritora Júlia Lopes de Almeida e seu filho Afonso de Almeida, acompanhados de senhoras e cavalheiros da sociedade vitoriense.

Surgiu, porém, uma nota dissonante, uma passagem de apreensões na vida secular do Santuário querido. Em Setembro de 1911, Dom Fernando teve notícia de que, por ordem do então Ministro da Justiça, fora requerido, no Rio de Janeiro, o seqüestro dos bens (convento e igreja) dos franciscanos. Constituiu logo o Dr. Thiers Veloso, advogado, para impedir que tal medida fosse executada, no Espírito Santo. Requerido o interdito, no Juízo Federal, foi deferido. E assim, por essa providência, oportunamente executada, deixou de ser cumprida a Precatória vinda do Rio de Janeiro, datada de 4 de Setembro, para o seqüestro.

Realizou-se a audiência do Juiz Federal, a 21 de Setembro de 1911, em Vitória.

No mesmo ano, Dom Fernando instituiu a Associação de Nossa Senhora da Penha, para o Seminário Diocesana, então planejado. Os associados concorriam com 100 réis mensais (um tostão, como se dizia). E com os tostõezinhos Nossa Senhora da Penha, reunidos às economias particulares de S. Exa. e algumas dádivas espontâneas de benfeitores da Diocese, em 1914, a reserva para o Seminário orçava em 35:000$000. A morte de Dom Fernando, em 1916, impediu 3 realização dessa obra.

Em 1913, Dom Fernando mandou fazer "Lembranças da Penha" — terços, medalhas, cruzes com fotografia do altar e do Convento, binóculos minúsculos e estampas, etc. Introduziu o emprego das placas de mármore, para registro das graças alcançadas, e aprovou o "Ato de Consagração”, impresso nas estampas de Nossa Senhora da Penha: —

Ó Senhora minha, ó minha Mãe! Eu me ofereço todo a Vós; e, em prova de minha devoção para convosco, Vos consagro, neste dia, os meus olhos, os meus ouvidos, a minha boca, o meu coração e todo o meu ser; e, porque assim sou vosso, ó incomparável Mãe, guardai-me e defendei-me como uma cousa e uma propriedade vossa. Amém".

(100 dias de indul.)

Vitória, 15-8-1913.

Fernando, Bispo do Espírito Santo, c.m.

 

Tendo o Cônego João Maria Cochard viajado à Europa, a fim de realizar a visita canônica ao Santo Padre, em nome do Sr. Bispo, a capelania da Penha foi confiada ao Pe. Luís Cláudio de Freitas Rosa. Passou depois ao vigário da Capital que destacava sempre um sacerdote, seu auxiliar, para atender ao serviço religioso, no Santuário. Assim, o Pe. Elias Tomasi muito concorreu para a conservação do templo e, cumprindo as determinações do Sr. Bispo, manteve ali o marceneiro Pinin, sempre trabalhando, até que, no dia 15 de Janeiro de 1916, foi nomeado para o cargo de capelão efetivo o Pe. José Ludwin.

Dom Fernando faleceu, a 23 de Março de 1916.

Após dois anos administrada pelo Superior dos Lazaristas, Pe. Francisco Pimenta, a diocese recebeu o terceiro bispo, Dom Benedito Paulo Alves Sousa, em Maio de 1918. S. Ex. mandou adaptar o Convento para retiro do clero, substituindo o mobiliário antigo pelo moderno, mais confortável. Foram igualmente, reformados e mobiliados de modo condigno o refeitório e os cômodos reservados ao Sr. Bispo.

Auxiliado pelo Sr. Antônio Ribeiro, fervoroso devoto de Nossa Senhora da Penha, que se prontificou a fazer a caiação externa do Santuário, e tendo recebido contribuições espontâneas diversas, o capelão Pe. Ludwin empreendeu o conserto geral do edifício, inclusive a pintura interna.

A 21 de Abril de 1919, Dom Benedito aprovou os estatutos da Associação de Nossa Senhora da Penha, para a obra das Vocações Eclesiásticas, em projeto. Simultaneamente, concedeu ao templo o título de "Episcopal Santuário de Nossa Senhora da Penha". Continuando no cargo de capelão da Penha, o Pe. Ludwin, em 1920, reconstruiu a Casa dos Romeiros (antigamente, dos banquetes e do jogo). Venceu a lenda segundo a qual morreria o sacerdote que tentasse reerguê-la, e cairiam vítimas de desastres os operários empregados na obra.

Inaugurou-se a Casa dos Romeiros, a 14 de Abril do mesmo ano. Atualmente, no segundo pavimento dessa casa, encontra-se o "Museu dos Milagres", sala onde se vêem os ex-votos que atestam graças alcançadas pelos fiéis, mediante a intercessão da Virgem Maria. Devemos, por isso, fazer, aqui, uma referência às "Promessas" e outras fórmulas de súplicas a Nossa Senhora da Penha. Ansiosos de alcançar um favor do Céu, pela intercessão de sua querida Protetora, os devotos se comprometem de agradecer-lhe de um modo especial: — oferecendo esmolas ao Santuário, mandando celebrar missas, varrendo a ladeira, subindo a ladeira, com uma vela acesa (Que luta com o vento!), ou rezando o terço, etc. Há muitas outras promessas: bordar toalhas para o altar, acender velas no Santuário, subir de joelho parte da ladeira, oferecer peças de cera (braços, pernas, cabeça, coração, etc.), ou tranças amarradinhas com laços de fitas, porque "se fez promessa" de não cortar o cabelo, até determinada idade geralmente quinze anos.

Quanta gente sobe descalça toda a ladeira?

Antigamente, havia até o heroísmo de pessoas que subiam, de joelho, os sete lances da ladeira.

A poesia popular não falha:

"De rastos subi a Penha

E à Virgem Santa

pedi me curasse esta maldita

cegueira de amor por ti.

 

Uma variante:

 

Subi o monte da Penha

e de rastos lhe pedi

Me curasse esta maldita cegueira

de amor por ti:

Somente quem vai sempre à Penha pode presenciar o poder da Fé expresso no semblante e atestado no sacrifício dos romeiros.

Algumas pessoas "escrevem a Nossa Senhora da Penha", formulando seus pedidos.

A construção de uma casa para residência do capelão no "Morrinho", ao pé do Monte, provocou uma questão levantada pelo Prefeito de Vila Velha, Dr. Antônio Francisco Ataíde, a 16 de Setembro de 1920. Debatido o caso, na imprensa, venceu finalmente a causa da Igreja, em 1922.

Para render homenagem aos Chefes espirituais do Estado, o mesmo capelão inaugurou solenemente, a 5 de Abril de 1921, os retratos de Dom João Batista Corrêa Neri, Dom Fernando de Sousa Monteiro e Dom Benedito Alves de Sousa, no salão contíguo ao Santuário.

No ano seguinte, Dom Henrique Gasparri, Núncio Apostólico, visitou a Penha. S. Ex. esteve no Espírito Santo, em excursão, pelas colônias italianas.

Fundado o Orfanato Cristo Rei, sob a direção do Pe Leandro del Uomo, publicou-se, em Vitória, em 1925, "O Santuário da Penha", jornal católico, impresso nas oficinas do mesmo educandário e destinado à divulgação da história dos milagres de Nossa Senhora da Penha.

Mas, um fato doloroso abalou o povo capixaba, em 1925. "Roubaram as jóias de Nossa Senhora da Penha!" — foi a exclamação pungente de todos, logo ao circular a notícia de que, no dia 4 de Outubro, mãos criminosas tiraram a preciosa coroa de ouro e pedras raras, oferta do Condestável Torquatro de Araújo Malta, em troca da que veio da Europa, com a imagem, que era de prata. Além da coroa, jóias valiosas e o manto da Virgem foram sacrilegalmente retirados. Anéis da platina, brilhantes e ouro!... Broches raríssimos, estilo antigo... E, na fúria de arrancarem anéis, pulseiras e cordões de ouro, os assaltantes quebraram o braço da imagem!

Pela manhã, quando chegou ao templo, a fim de preparar o altar para a missa, o sacristão quedou-se horrorizado, como se fora presa de perturbação mental — o Santuário estava arrombado! A imagem despida do manto e das jóias inestimáveis, com o braço quebrado, parecia irradiar profunda tristeza! Desvairado, o homem correu a espalhar a dolorosa nova. Logo, formou-se uma romaria, que se prosternou contrita, perante a imagem querida.

Por iniciativa da Sra. Maria Vieira, reuniu-se, na Cidade do Cachoeiro de Itapemirim, uma comissão de pessoas piedosas que, em nome do povo sulino, ofereceu à Nossa Senhora outra coroa de ouro maciço, em 1925.

Passados alguns anos, porém, outro assalto criminoso verificou-se, naquele santuário embalsamado pela ternura da assistência maternal da Augusta Senhora da Penha. A 2 de Abril de 1947, novamente, foi a coroa roubada, por indivíduos inescrupulosos, dentre os quais um ex-zelador do Santuário. Badalaram os sinos!... Afirmaram algumas pessoas da Vila Velha que, alta noite, ouviram o sinal suave do campanário da Penha. Era, — diz o povo, um aviso de Nossa Senhora. Entretanto, o guardião, residente no Convento, nada percebera.

Desta vez, os criminosos foram presos e a coroa encontrada, já em pedaços, além de os cordões de ouro e outras, jóias. Posteriormente, pela iniciativa do Dr. Antônio de Oliveira Pantoja e do Sr. João V. Simões, reconstitui-se a coroa.

Finalmente, nas comemorações do Quarto Centenário de Vitória, em 1951, as senhoras capixabas promoveram uma subscrição popular para a solene coroação de Nossa Senhora da Penha. Valiosas coroas de ouro e pedras preciosas foram adquiridas para Nossa Senhora da Penha e o Menino Jesus, conforme veremos adiante.

 

Fonte: O Relicário de um povo – O Santuário de Nossa Senhora da Penha, 2ª edição, 1958
Autora: Maria Stella de Novaes
Compilação: Walter de Aguiar Filho, abril/2018

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