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O plano português para colonização das terras doadas - Sesmarias

Mapa das Capitanias Hereditárias no Brasil

1 - Descobrimento e razão do crescimento linear do Brasil, nos primeiros dias de contato com a civilização

 

A então considerada poderosa frota do Almirante luso, saída de Lisboa, na alvorada do século dezesseis, com o objetivo de dirigir-se às Índias, desvia-se bastante para o ocidente, encontra uma terra, que é, inicialmente, considerada uma imensa ilha.

São feitas, anos após, em seu litoral, as primeiras feitorias.

Ninguém, contudo, se dispõe a caminhar em direção ao seu interior, porque o lusitano coevo, como, na maioria, os outros homens então, ambicionava, preferencialmente, se apoderar dos lugares onde se lhes deparasse a axiomática possibilidade de vencer.

O colonizador Português, não somente devido ao exposto, mas em virtude da escassez de braços e deficiência de recursos ou outros, submeteu-se, por isso, em permanecer, durante amplos decênios, adstrito à faixa litorânea.

 

“Contentou-se, na frase de São Vicente do Salvador, a andar arranhando ao longo do mar, como caranguejos. Carecia de capacidade numérica para galgar as altas montanhas que o separavam do hinterland, vasto e desconhecido. E não dispunha de força militar para vencer o gentio numeroso e forte; que, após a fundação dos primeiros estabelecimentos lusitanos, se haviam aprestado para a defesa, sob a liderança dos tamoios.” (ANDRADE, Teófilo de. ‘O Paraná’)

 

Foi, em virtude do exposto, que o português daquela época resolveu fixar-se no litoral, e não pretendeu aplicar idênticos esforços aos que, posteriormente, empregaram incontáveis mestiços, secundados por muitos nativos, na parcial eliminação das nossas matas, condição imprescindível à expansão da cultura em nossa terra.

Vê-se, portanto, que o trabalho lusitano concorreu apenas para o surgimento do Brasil agrário da costa. Aos ingentes esforços dos mestiços, seguidos pelos dos nativos, é que, sem dúvida, devemos a utilização, posteriormente feita, de grande parte do nosso interior. Esse aproveitamento, entretanto, necessário se torna evidenciar, não teria sido possível, se não fora o adequado rumo traçado pelo Jesuíta, “bandeirante da primeira hora”.

Além dos mencionados, havia, então, um outro poderoso fator adverso ao desenvolvimento da terra; a falta de um plano de colonização bem elaborado e convenientemente compreendido.

Foi em decorrência das razões focalizadas que, durante vários decênios, só se conseguiu fazer uma diminuta sondagem na terra descoberta, do que resultou o seu inicial crescimento apenas na parte osculada pelo Atlântico.

 

2 - O plano português para colonização das terras doadas

 

É na análise das instituições territoriais da terra do imortal e incomparável Camões, que vamos colher elementos para o estudo da história territorial do Brasil.

A asseveração acima encontra sólido apoio no que afirma Ruy Cirne Lima, em sua magnífica monografia – ‘Terras Devolutas’:

 

“A ocupação de nosso solo pelos capitães descobridores, em nome da Coroa Portuguesa, transportou, inteira… a propriedade de todo o nosso território para além-mar – para o alto senhorio do Rei e para a jurisdição da Ordem de Christo.”

 

Em face do esclarecido, torna-se evidente que, ao tratarmos do fundamento de nossa propriedade, teremos, forçosamente, de estudar as instituições territoriais de Portugal, o que infelizmente, não se poderá fazer, de modo amplo, dentro dos restritos limites deste insignificante trabalho.

Iremos, entretanto, embora pela rama, tratar da mais importante de todas as instituições territoriais lusitanas – a das sesmarias – porque, a nosso ver, a mesma constitui o alicerce de nossa propriedade imóvel.

Vejamos, ainda, o que afirma o autor em referência, na obra nesta aludida:

 

“… O primeiro monumento das sesmarias no Brasil é a carta patente, dada a Martim Afonso de Souza, na vila de Crato, a 20 de novembro de 1530.”

 

Trouxe ele, na expedição de 3 de dezembro de 1530, três cartas régias.

Pela primeira, ficava autorizado a tomar posse das terras que descobrisse. Ficava também incumbido de organizar o respectivo governo, bem como a administração civil e militar.

Pela segunda, foram-lhe conferidos títulos de Capitão-Mor e de Governador das terras do Brasil.

A terceira, finalmente, permitia-lhe que concedesse sesmarias das terras que encontrasse e pudessem ser aproveitadas.

Em vista da autoridade que lhe foi outorgada pela última das mencionadas cartas régias, Martim Afonso de Souza fez as seguintes concessões:

a) a João Ramalho, de terras situadas na ilha Guaipe, em 1531;

b) a Brás Cubas, em Piratininga, a 10 de outubro de 1532.

 

A 28 de fevereiro de 1532, D. João III, por carta, cientificou a Martim Afonso de Souza a resolução que tomara de dividir o litoral do Brasil, de Pernambuco ao Rio da Prata, com o fim de formar capitanias com cinqüenta léguas da costa.

Prometeu, na referida carta, dar-lhe cem léguas e cinqüenta a Pero Lopes, seu irmão.

A divisão da terra, entretanto, só se objetivou em 1534, quando foram passadas:

 

“Cartas de doação aos agraciados que, além de muitas vantagens e poderio, gostariam de juro e herdade, do título e mando de Governadores de suas terras, sendo, porém, reservada à Coroa a prerrogativa de cunhar dinheiro e a percepção dos dízimos à Ordem de Christo.” (Dicionário Histórico e Geográfico da Província do Espírito Santo)

 

Convém focalizar que os donatários não foram investidos na propriedade das terras.

Cabiam-lhes somente os direitos e vantagens de capitão. Podiam transmitir esses direitos, por herança. Era-lhes também facultado até aliená-los, sob certas condições.

O título de doação era um contrato. Nele ficavam estatuídos os direitos da Coroa, os do Donatário e a situação dos colonos estabelecidos nas terras doadas.

Eram, portanto, uns verdadeiros senhores feudais.

Exerciam, nos seus domínios, quase todas as prerrogativas do Rei.

Concentravam, em suas mãos, entre outros, os seguintes poderes: proviam todos os cargos da administração; regulavam todo o serviço público e o exercício de todos os direitos; nomeavam juízes; julgavam, em última instância, todos os delitos; tinham o monopólio de quase todas as indústrias nascentes; arrecadavam a sua parte de tributos; tinham o privilégio de escravizar índios para o trabalho agrícola; etc.

É evidente que todo esse poder devia ser exercido dentro dos limites prescritos pelo Soberano.

As Capitanias, criadas e concedidas por Cartas Régias de diversas datas, foram primeiro doze, sendo principais, pela extensão e pela importância que logo tiveram, a de Pernambuco, a de São Vicente, a da Bahia e a do Espírito Santo.

Na maioria, não prosperaram.

Delas, somente as acima citadas progrediram.

As demais quase estacionaram; umas em vista de permanecerem plenamente abandonadas; outras, em conseqüência de não haverem dado profícuos resultados os esforços dos respectivos donatários.

Falhou, pelo exposto, quase completamente, o plano português para a colonização das terras doadas:

 

“Dentro de poucos anos, estava o Governo Português convencido da necessidade de organizar a administração oficial em todo o país, submetendo as capitanias à autoridade superior de um governador geral.” (POMBO, Rocha. ‘História do Brasil’)

 

O Rei lusitano, certo de que o fracasso adviera também da falta de recursos dos respectivos donatários, autorizou-os a repartir as suas capitanias por pessoas capazes de realizar o visado pela Coroa, que era, principalmente, a cultura e a valorização dos interesses públicos e privados.

Já prevalecia, naquela época, embora ainda por ninguém objetivada, a hoje tão conhecida e acatada opinião de um jurista filósofo:

 

“cio posto, é facile comprendere Che Il diritto di proprietà deve indendere, qual un podere sulla cosa, e, in pari tempo, quale un dovere di usarla secundo una bene intensa utilità individuale e sociale.” (Vicenzo Michellei. Apud: AZEVEDO, Philadelpho. ‘Destinação do imóvel’).

 

Fonte: Sesmarias, 1988
Autor: Vicente da Silva Loureiro
Compilação: Walter de Aguiar Filho, outubro/2013 

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