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Quadros desalentadores da Província, 1823

Em 1823, tomou assento na Assembléia Constituinte brasileira, como representante capixaba, o Dr. Manuel Pinto Ribeiro Pereira de Sampaio, membro do Supremo Tribunal de Justiça

Ao findar 1823, fez-se um balanço da situação econômico-financeira da província. As rendas não alcançavam quinze contos de réis. Só as despesas com a tropa subiam a mais de quarenta.(42)

Esses dados não afinam com o demonstrativo apresentado, no ano seguinte, pelo presidente Inácio de Acioli de Vasconcelos(43) ao marquês de Queluz, ministro do Império. Eis a sinopse presidencial:

“Receita ..................................................46:231$852

Despesa

Militar ............................ 46:312$647

Civil e Eclesiástica .........12:862$933

Totalizando 59:175$580

Maior despesa......................................12:943$728”

Comentando a situação, dizia Inácio Acioli:

“Para qualquer parte que se lance os olhos nesta Província não se vê um objeto que não peça providências. A agricultura não dá a necessária farinha para sustento dos habitantes do país e é preciso importá-la em grandes porções...(44) A educação da mocidade, as escolas, estão em relaxação e abandono, não só por falta de bons mestres, como por falta de pagamento de seus ordenados, além de serem estes muito módicos, para convidarem homens hábeis a este importante emprego. O Hospital Militar é mais um calabouço do que o restaurador da saúde, pelo mau estado do edifício, e falta até do indispensável número de camas.

As prisões são verdadeiros tormentos e sepulturas dos que nelas entram. As estradas para a Província de Minas estão atulhadas de mato, a antiga de beira-mar sem pontes, que de arruinadas se fazem intransitáveis”.(45)

Meses depois, dirigindo-se ao marquês de Queluz, o presidente expunha, com a maior franqueza, a precariedade em que se encontravam as finanças públicas e as ínfimas possibilidades materiais da população. A receita não ia além de quinze contos de réis e a despesa ordinária exigia mais de sessenta.

Desde 1821, a arrecadação dos impostos de Campos deixara de ser feita pelos cofres da província, (IX) justamente quando foram exigidos novos encargos para a manutenção da tropa. Perdurando as dificuldades, o governo seria obrigado a suspender os trabalhos da civilização dos índios, pressagiando-se, então, conseqüências funestas e calamitosas, principalmente para as lavouras. As dívidas eram grandes e a defesa militar reclamava novos gastos. Enfim, ficasse o soberano “cabalmente ciente de que esta Província é a mais miserável do Império: não tem agricultura nem comércio; seus habitantes são pobríssimos”. (X)

Mas se a crise era grande, maior ainda era o regozijo público pela implantação do regime constitucional no país. A dezenove de abril – dia em que Vitória assistiu ao juramento da Carta Magna, outorgada por D. Pedro a vinte e cinco de março de 1824 – a cidade se engalanou para comemorar tão auspicioso evento. A cerimônia – como todos os atos solenes da época – teve lugar na igreja-matriz, “perante imenso concurso de povo, Câmara Municipal e corporações civis, eclesiásticas e militares”.(46)

Várias vezes, no decorrer de 1824, a população livre foi convocada às urnas: para as eleições do deputado à Assembléia Geral,(47) do Conselho Provincial(48) e do senador.(49)

Sem dúvida, as campanhas que antecediam tais pleitos alteravam o ritmo de vida e, conseqüentemente, colaboravam para agravar ainda mais a crise em que se debatia a província. Mas havia outros motivos de inquietação, tais como o levantamento dos índios de Itapemirim,(50) os constantes desentendimentos entre o ouvidor José Libânio de Sousa e os governos civil e militar,(51) além da epidemia de varíola, que causou grande mortandade entre os índios.(52)

Alteando-se à realidade – que poucos motivos oferecia a entusiasmos – um acontecimento promissor falava ao futuro da mocidade: a instalação de uma escola pública na província, entregue aos cuidados do sargento José Joaquim de Almeida Ribeiro, que ensinava pelo método lencastriano (XI) (ensino mútuo).(53)

Segundo o censo realizado nesse ano – 1824 – a população da província era estimada em trinta e cinco mil, trezentas e cinqüenta e três almas, cabendo à freguesia da Vitória treze mil e trinta e oito, seguindo-se a de S. Mateus, com cinco mil, trezentas e treze. Os fogos totalizavam cinco mil, duzentos e setenta e quatro. Só a freguesia da Capital contava dois mil, quinhentos e oitenta deles. (XII)

 

NOTAS

(42) - Ofício de dezesseis de dezembro de 1823, dirigido a João Gomes da Silveira Mendonça, in Gov ES, II.

– À guisa de curiosidade, citem-se também os ofícios de dois de janeiro e doze de março do mesmo ano – ambos da Junta – o primeiro pedindo bandeira nacional, de vez que era impossível confeccionar uma em Vitória, pela “extrema falta de meios”; o segundo solicitando retrato do Imperador “para os dias de pública veneração” (Gov ES, II).

(43) - Inácio de Acióli de Vasconcelos – primeiro presidente da província – tomou posse a vinte e quatro de fevereiro de 1824 (Ofício de vinte e cinco de fevereiro de 1824, in Pres ES, 111).

Acióli foi nomeado por carta imperial de vinte e cinco de novembro de 1823, cujos preâmbulo e artigo primeiro rezam: “Dá nova forma aos governos das Províncias, criando para cada uma delas um presidente e Conselho. Ficam abolidas as Juntas Provisórias de Governo estabelecidas nas Províncias do Império do Brasil por decreto de vinte e nove de setembro de 1821.”

– O lugar de presidente da Província foi criado pela lei de vinte de outubro de 1823. O chefe do executivo era assistido por um conselho de seis membros “... com atribuições quase idênticas às que foram posteriormente dadas às Assembléias Provinciais, continuando as funções civis extremadas das militares, que foram exercidas por um comandante das Armas até ser extinto este lugar pelo artigo quinze, parágrafo terceiro, da lei de quinze de novembro de 1831, mandado executar pelo decreto de cinco do mês seguinte, passando tais atribuições aos presidentes da Província, sem vencimento algum (CÉSAR MARQUES, Dicion ES, 122).

(44) - Curioso é que, dois anos depois, o mesmo presidente escrevia o seguinte: “Continuando a seca nas Províncias do Norte, têm concorrido ao porto desta Cidade muitas Sumacas de Pernambuco, e Bahia a condução de farinha, e suposto que a maior parte deste gênero daqui exportado venha da Vila de S. Mateus onde não podem entrar muitas Embarcações com receio da barra: todavia não deixa de sair alguma do termo desta Cidade, de maneira que de 600 réis, mais, ou menos por que se comprava um alqueire, agora tem subido a 1$200, e a mais sendo muito natural Exm.º Snr., que os lavradores convidados pelo bom preço desmanchem as mandiocas verdes, e ainda que me consta haver bastante plantação delas, contudo acho acertado coartar, algum tanto, e por alguns meses a liberdade da exportação deste gênero daqui, para prevenir a sua falta para o futuro, na incerteza se o tempo correrá bem para semelhantes plantações, ficando porém sempre livre a exportação de alguma que venha de outras Vilas, e da de S. Mateus; porquanto nessa não há outro gênero de Comércio. / Estou bem persuadido, que semelhante passo se opõe de alguma maneira à liberdade do Comércio, mas também me lembro que esta em tal caso não deve ser tão completa que precipite aos habitantes desta Cidade, e termo na penúria, e inteira falta de um gênero de primeira necessidade. / S.M.I. me tem recomendado o auxílio à exportação de farinhas para a Província do Ceará, e Rio Grande do Norte, estas não deixarão de ser socorridas, com a que daqui vai de S. Mateus, de Santa Catarina, e outras partes” (Ofício de doze de abril de 1826, ao ministro José Feliciano Fernandes Pinheiro, in Pres ES, III, 234-4v).

(45) - Ofício de treze de março de 1824, in Pres ES, III. Concluía o presidente pedindo uma consignação mais avultada que a de trinta contos de réis, de vez que esta importância era insuficiente para cobrir as despesas correntes e atender ao pagamento das dívidas atrasadas.

(46) - DAEMON, Prov ES, 268.

(47) - Foi eleito o bacharel José Bernardino Batista Pereira.

(48) - Foram eleitos: Francisco Pinto Homem de Azevedo, vigário José Nunes da Silva Pires, Manuel de Morais Coitinho, José Ribeiro Pinto, Antônio Joaquim Nogueira da Gama e Joaquim José Fernandes (DAEMON, Prov. ES, 269-70).

– Cabe transcrever aqui, pelas informações que contém, o texto do ofício dirigido pelo presidente da província ao marquês de Queluz, a vinte e seis de março de 1824. Diz o referido documento: “Tenho a honra de participar a V. Excia. que tendo mandado proceder à eleição do Conselho desta Província, como me recomenda a carta imperial de vinte e cinco de novembro p. passado entra o ouvidor da Comarca em dúvida se para semelhante eleição se devem reunir os votos das vilas de Campos, visto que se reúnem para a de deputado. Ora aquelas vilas (sic) posto que pertençam a esta comarca, contudo consideram-se fora dos limites da Província, e nenhuma obediência prestam a este governo: e por isso me persuado que não devem concorrer para a eleição do seu Conselho. / A vila de S. Mateus, que em conformidade da Portaria da Secretaria de Estado dos Negócios do Império de dez de abril de 1823 deve reconhecer-se pertencente a esta Província, também entra em dúvida se deva dar votos para as eleições nesta ou na Província da Bahia para onde o presidente da mesma a tem chamado.”

No documento acima foi exarado o seguinte despacho: “As vilas de Campos não dão votos porque se consideram fora da Província. A vila de S. Mateus, ao contrário, porque pela ordem citada pertence à Província e disso se fará Aviso ao presidente da Bahia. Catorze de maio de 1824” (Pres ES, III).

(49) - Foram eleitos Manuel Pinto Ribeiro Pereira de Sampaio, magistrado, com sessenta votos; José de Azevedo Cabral, magistrado, com cinqüenta e nove votos; Francisco dos Santos Pinto, eclesiástico, com trinta e um votos. (TAUNAY, O Senado, 175). O imperador escolheu este último, que foi, assim, o primeiro senador capixaba. Sua nomeação data de vinte e dois de janeiro de 1826. Faleceu a três de abril de 1836 (PENA, História, 123).

(50) - Ofício do presidente Inácio Acióli de Vasconcelos ao marquês de Queluz. Vitória, vinte de outubro de 1824 (Pres ES, III). DAEMON, Prov. ES, 270.

(51) - DAEMON, Prov. ES, 268-9.

(52) - Pres ES, III; DAEMON, Prov. ES, 269. O governo prestou toda a assistência possível aos índios, fazendo-os vacinar e socorrendo-os com medicamentos.

(53) - Assevera BASÍLIO DAEMON que a escola foi instalada aos catorze de setembro de 1824, em uma das salas do antigo Colégio dos jesuítas, assistindo ao ato, além do presidente da província, o comandante das Armas e pessoas gradas (Prov. ES, 270-1). A dezoito de março daquele mesmo ano, Inácio Acióli oficiava ao governo central informando ter chegado a Vitória o sargento Almeida Ribeiro, designado para reger uma aula de ensino mútuo, não só para instrução da tropa como também de particulares que dela se quisessem aproveitar. E, como o governo desejasse incrementar a instrução, pretendia – ele, presidente – “convocar alunos de todas as Vilas desta Província, que tenham meios de vir à capital”. Concluía pedindo os “utensílios precisos” para o funcionamento da classe (Pres ES, III).

IX –

– “Constando-me, que alguns indivíduos das Vilas dos Campos Goitacazes solicitam nessa Corte, que as Rendas Reais daquele Distrito, entrem efetivamente nos Cofres da Tesouraria Mor do Real Erário, e não nos da Junta da Real Fazenda desta Província, a que pertencem pela Carta Régia de sua Criação, datada em vinte e nove de Maio de 1809. 

/ Apresso-me a dizer a V. Excia., para que chegue ao Conhecimento de S. A. R., que as Rendas Reais do Distrito de Campos são as únicas, pode-se assim dizer, que a Junta da Real Fazenda desta Província tem para suas despesas indispensáveis, e para as quais nem chegam, e que conseguindo os pretendentes o deferimento como solicitam, tornar-se-á esta mesma Província uma habitação de mendigos, pois que os Rendimentos que lhe restam são diminutíssimos, e por conseqüência insuficientes para pagamento da Tropa, Empregados, e mais despesas de que está sobrecarregada, sendo a maior parte destes de suma necessidade.

/ Já em 1810 pretenderam isto mesmo, com o falso pretexto de poder a Escolta que conduz as Rendas ser acometida na Estrada, que vem para esta Vila, por ladrões, que nunca existiram, e por Gentios, que não ofendem se não a uma, ou duas pessoas que encontram desacauteladas, e por Provisão de primeiro de Fevereiro do dito ano, foi determinado ao Administrador dos Dízimos daquele Distrito Manoel Antônio Ribeiro de Castro, que o produto dos mesmos Dízimos entrasse no Real Erário por via de Letras seguras; mas reconhecendo-se depois a falta que o mesmo Rendimento fazia a esta Província, foi por outras Provisões de vinte de Setembro do sobredito ano dirigidas ao dito Administrador, e ao Juiz de Fora derrogada aquela de primeiro de Fevereiro./ Talvez cessasse, Exm.º Sñr., a rivalidade dos Campistas, se eles fossem sujeitos a esta Província na parte Militar, assim como o são na da Fazenda Real, e Civil, tornando-se assim idêntico o Distrito do Governo com o da Comarca, o que é indispensável à boa administração da Justiça, e Economia política destes Povos./ Igual Representação, já em treze do corrente dirigi pela Secretaria de Estado dos Negócios da Fazenda, e agora acrescento, que o Comércio desta Vila, é menos inda que passivo, e as pessoas que o constituem, meros Caixeiros dos Negociantes dessa Corte, ou da Bahia, por conseqüência, não vejo um só, capaz de satisfazer à vista uma Letra, por pequena que ela seja; sendo assim, não sei como possa realizar-se qualquer transação de dinheiro, que S. A. R. For Servido Determinar para esta Província” (Ofício de Baltasar de Sousa Botelho, para o ministro Pedro Álvares Diniz, de trinta de agosto de 1821, in Pres ES, 49-50).

X –

“Tendo considerado com a Portaria da Secretaria de Estado dos Negócios do Império de onze de junho próximo passado o estado desta Província não vejo remédio algum senão recorrer a S. M. Imperial.

Não poucas vezes se tem levado aos pés do trono que as rendas desta Província não avançam a mais de quinze contos de réis, e a despesa ordinária exige mais de sessenta contos. As rendas de Campos, que faziam a maior soma da receita, foram desmembradas daqui no ano de 1821 em cujo ano se aumentou o número de tropa, e logo depois os soldos, e etapas da mesma tropa, de maneira que o que vence hoje em etapa é por si só quanto dantes vencia de soldos. A isto acresce o importante objeto da civilização dos índios do Rio Doce, cujo serviço pára infalivelmente por falta de numerário para se continuar e então visto a grande porção de gentio que já se tem congregado, um terrível mal vai cair sobre os lavradores derramando-se o mesmo gentio por toda a parte logo que virem que as promessas que se lhes têm feito se tornam nulas ou tardias: e as conseqüências desta desgraça são patentes à consideração de V. Excia.

É preciso enfim que S. M. Imperial esteja cabalmente ciente de que esta Província é a mais miserável do Império: não tem agricultura nem comércio: seus habitantes são pobríssimos.

Não sei absolutamente donde possa tirar recursos para pagar uma grande dívida atrasada e nem mesmo para fazer as despesas correntes, e muito menos para suprir aos preparativos da defesa, tão indispensáveis, que até as carretas do pequeno parque de artilharia estão precisadas de conserto: a tropa nua e descalça: e enfim tudo aqui é fome. Rogo mui reverentemente a S. M. Imperial haja de mandar-me algum socorro pecuniário além da consignação de dois contos e quinhentos mil réis mensais que houve por bem consignar a esta Província, e que além de não chegar para fazer face às despesas como já fiz ver pela cópia do Balanço que remeti em treze de março do corrente e nesta data ao ministro da Fazenda mesmo assim não tem vindo completamente e além da outra consignação aplicada para os aldeamentos do Rio Doce, que até o presente não tem ainda sido enviada, e pela qual damos todos os dias o coronel Diretor dos referidos aldeamentos, pois que um não sendo socorrido certamente a Nação de perder os serviços já feitos e o resultado será o pior para a Província pois que aqueles bárbaros que por ora vão acreditando nas promessas feitas terão de reverter para os bosques e então a guerra deles será inevitável.

Bem vejo que o governo de S. M. Imperial está encarregado de grandes ponderações qual a salvação da Pátria, mas também é certo que esta parte do Império pela sua constante adesão à causa do mesmo Império lhe deve merecer atenção assim como a requerição do seu presidente que em tempo algum deseja ser notado de omisso ou indolente em negócios de tanta monta, e pelo que se faria responsável perante S. M. Imperial e a Nação” (Ofício dirigido pelo presidente da província ao marquês de Queluz, ministro do Império. Vitória, primeiro de julho de 1824 – Pres ES, III).

– A Câmara de Vitória, em 1825, dirigia pungente apelo ao imperador, “reduzida [que estava] à maior indigência possível, por ver os seus cofres exauridos, e não poder ao menos pagar aos seus empregados”; sugeria lhe fosse concedido parte do contrato da aguardente, “visto que tem-se aumentado muito a ponto de ser arrematado por Seis Contos de réis, para com este rendimento ir pouco a pouco reparando a Cadeia, e poder pagar aos seus empregados, não falando nas imensas dívidas que já tem contraído com as mais Câmaras da Comarca”.

Como a demonstrar a dura realidade das suas afirmações, fez juntar ao ofício o quadro seguinte:

Imagem embaixo da matéria.

XI –

Com a Independência, renasceram as preocupações dos brasileiros de disseminar o ensino primário por todo o país.

Entregue a direção da educação nacional ao Ministério do Império, já em 29 de janeiro de 1823 José Bonifácio (detentor da pasta) deferia a pretensão de Nicolau Diniz José Reynaud, de estabelecer na Corte uma aula de ensino mútuo. Decreto de primeiro de março seguinte “criava uma escola de primeiras letras, pelo método do ensino mútuo, para a instrução não só dos militares, mas de todos aqueles que desejassem aproveitar-se de tão vantajoso estabelecimento”. Na primeira fala do trono (de três de maio de 1823), D. Pedro I podia dizer aos dignos representantes da nação brasileira que, “conhecendo a vantagem do ensino mútuo, também fiz abrir uma escola pelo método lencastriano”.

AFRÂNIO PEIXOTO escreveria: “O novo método era velho: desde o século XVI se conhecia na Europa. Erasmo o recomendara. Madame de Maintenon fizera aplicação dele em Saint-Cyr. André Bell, em 1798, codifica-o em Madrasta, nas Índias; José Lencaster aplica-o em Londres; daí o nome e a fama. Conta-se que Jorge III quisera conhecer o mago mestre-escola, dizendo-lhe: ‘Como é possível que nas suas escolas um só professor ensine a quinhentos alunos ao mesmo tempo?’ ‘Do mesmo modo, respondeu Lencaster, que o vosso exército é posto em movimento por uma palavra do seu comandante’.

Na escola de Lencaster os exercícios eram cadenciados, e em ordem disciplinar. Cada grupo de alunos (decúria) tinha um aluno menos ignorante (decurião) que dirigia os outros. O ensino mútuo dispensava assim quase o professor e os meninos mutuamente se ensinavam.

Uma escola podia abrigar quinhentos alunos para um só mestre. Muito e depressa e sem custo: o ideal para o Brasil.

Só em 1833, o ministro do Império Campos Vergueiro confessa, timidamente, que o método do ensino mútuo não dera as vantagens apregoadas e o governo não estava mais disposto a propagar escolas de tal sistema. Chichorro da Gama, igualmente ministro, no ano seguinte, também tristemente escreve que as escolas lencasterianas ‘por uma razão qualquer’, não corresponderam às nossas esperanças. Em 1835, Vieira da Silva, e, em 1838, Bernardo Pereira de Vasconcelos, também ministros do Império, não são mais animados. Este procura ainda uma escusa: o tempo de ensino ou a imperfeição do exercício fizeram que o sistema não correspondesse à expectativa pública”.

– Algumas indicações sobre a adoção do método lencasteriano no Brasil: AFRÂNIO PEIXOTO – Cem Anos de Ensino Primário, in Livro do Centenário da Câmara dos Deputados (1826-1926); ADOLFO MORALES DE LOS RIOS FILHO – O Rio de Janeiro Imperial; ESCRAGNOLLE DÓRIA – Primeiras Letras, in Revista da Semana (Rio de Janeiro, quinze de outubro de 1927).

XII – Imagem logo abaixo da matéria.

 

Fonte: História do Estado do Espírito Santo, 3ª edição, Vitória (APEES) - Arquivo Público do Estado do Espírito Santo – Secretaria de Cultura, 2008
Autor: José Teixeira de Oliveira
Compilação: Walter Aguiar Filho, maio/2018



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