República não trouxe a estabilidade desejada
Uma onda de boatos fez o povo tirar as economias guardadas na Caixa Econômica. Agora já existe jornal, um deles em Cachoeiro de Itapemirim. A produção de açúcar cede lugar ao café. E a industrialização dá os primeiros passos.
O movimento republicano atingiu mais diretamente o Espírito Santo por volta de 1887, com a fundação do primeiro clube republicano.
A iniciativa partiu de Bernardo Horta de Araújo, Antonio Gomes Aguirre e Joaquim Pires de Amorim. Eles foram chamados de “os gigantes do pensamento republicano no Espírito Santo”.
O primeiro Congresso Republicano Provincial do Espírito Santo foi realizado, em Cachoeiro de Itapemirim, em 16 de setembro de 1888.
Em meados de novembro, pouco antes da Proclamação da República, chegavam a Vitória as notícias dos acontecimentos políticos no Rio de Janeiro. E no dia 16 desse mesmo mês (já proclamada a República), Afonso Cláudio foi indicado, pelo Governo Provisório, para administrar o Estado do Espírito Santo.
Por meio do ofício nº 1, de 20 de novembro de 1889, Afonso Cláudio comunicou ao Governo Central a sua posse no cargo.
Como no resto do Brasil, tudo se passou em verdadeira calmaria. O povo não se manifestou; assistiu a tudo parecendo não estar entendendo muito bem a precipitação dos acontecimentos.
Apenas na Bahia, segundo informações documentárias, houve "vislumbres de resistência", isto é, manifestações contrárias à República. Logo foram dissolvidas pelas autoridades.
Em Vitória, houve um certo constrangimento com os boatos que se propagavam a quatro ventos. Os usuários correram à Caixa Econômica temendo pelo seu dinheiro, tão bem guardado, mas que agora poderia evaporar-se com os rumos da nova política brasileira.
Expectativas duvidosas apontavam no sentido de atentados às suas pessoas e bens.
O tumulto começou a crescer.
Afonso Cláudio, preocupado com a boataria que caminhava à solta, resolveu interceder, antes que a situação atingisse níveis mais graves. Publicou um comunicado na imprensa acalmando a população e fazendo ver que os boatos não tinham quaisquer fundamentos.
O comunicado terminava assim:
"Não há motivo para tamanho pânico: a guarnição da Capital, enquanto estiver sob a responsabilidade dos briosos militares cujo patriotismo o país admira, é o mais seguro penhor de ordem que os cidadãos aqui residentes podem possuir e desejar".
Em Cachoeiro de Itapemirim o novo regime foi festivamente comemorado.
O Diário do Espírito Santo, de vinte e sete de novembro de 1889, publicou um telegrama com os seguintes dizeres: "Bandeira republicana federal é a mesma nacional, substituindo somente coroa por estrela encarnada".
No ano da Proclamação da República o Espírito Santo estava dividido em 14 Municípios, 4 cidades e 10 Vilas:
Vitória (capital)
Cachoeiro de Santa Leopoldina (vila)
Viana (vila)
Espírito Santo (vila)
Serra (cidade)
Nova Almeida (vila)
Linhares (vila)
Barra de São Mateus (vila)
São Mateus (cidade)
Santa Cruz (vila)
Guarapari (vila)
Anchieta (cidade)
Itapemirim (vila)
Cachoeiro de Itapemirim (vila)
A população chegava a 110.137 habitantes.
Vitória possuía, então, quatro jornais editados: A Província do Espírito Santo, O Espírito-Santense, A Gazeta de Vitória e A Folha de Vitória.
Os dois primeiros eram diários, sendo que A Província do Espírito Santo alcançava uma tiragem de 1.600 exemplares, enquanto que o Espírito-Santense conseguia chegar a 500 exemplares por edição. Os dois últimos eram bissemanais, com uma tiragem de 300 exemplares. Em Anchieta era editado A Tribuna, lançado em 3 de fevereiro de 1889, sob a direção de José Horácio Costa, republicano convicto.
Em Cachoeiro de Itapemirim era editado O Cachoeirano e O Constitucional. O primeiro foi lançado em 7 de janeiro de 1887: e o segundo em 12 de abril de 1885, em Itapemirim. Em julho de 1886, passou a ser editado em Cachoeiro do Itapemirim. Teve vida curta: a publicação terminou dois anos mais tarde, isto é, em 1889.
O café e o açúcar eram os principais produtos agrícolas já além dos meados do século XIX. As culturas do milho, arroz, feijão, algodão e cacau existiam em pequena escala.
Logo o café assumiria a liderança na economia como atesta o gráfico que segue:
Exportação de café e açúcar da Província do Espírito Santo, em arrobas:
ANOS CAFÉ AÇÚCAR
1858 151.227 46.222
1859 136.102 39.822
1860 202.117 29.550
1861 223.809 21.843
Por este gráfico percebe-se, claramente, o que foi, afinal, a substituição da cana-de-açúcar pelo café.
A marca mais famosa do Estado era, então, o Café Capitania, de excelente aroma e sabor, segundo testemunhos de especialistas da época.
E começaram os primeiros passos da industrialização.
Há registros de existência de produção de açúcar e tecidos no Espírito Santo no início do século XIX.
A chamada pré-industrialização resumia-se no trabalho de artesãos pelos idos de meados do século.
Documentos registram fabricação de cal, cigarros, licores, cerveja, sabão, velas, baús, colchões, selas, aguardente e outros mais.
A produção de tecidos em Vitória, chegou a abastecer boa parte das necessidades do Rio de Janeiro. A mão-de-obra feminina era o sustentáculo da fabricação, recebendo cada trabalhadora, em média, rs0$120 por dia.
A produção manteve-se em patamares de baixa qualidade, não cresceu, nem progrediu.
No setor açucareiro, as coisas também caminharam com dificuldade. Houve a tentativa da Usina Guaraná, de propriedade do General Aristides Armírio Guaraná, instalada na Fazenda das Palmas, Município de Pau Gigante (hoje Ibiraçu).
De boa capacidade produtiva, representou o marco inicial da fabricação de açúcar no Espírito Santo.
Funcionou bem, e durante algum tempo, mas um violento temporal, em 1887, destruiu grande parte das instalações.
O empreendimento foi desfeito. Paralelamente às barreiras de administração, o prejuízo liquidou a esperança de novas investidas.
No período de 1892/1898, novas indústrias surgiram, como a Fábrica de Tecidos de Meia, que se desenvolveu graças ao preço favorável do café. Quando houve queda nesse preço, as tentativas de industrialização foram retardadas.
Logo após a Proclamação da República, vamos ver que o novo regime não propiciou ao Estado do Espírito Santo, nos primeiros tempos, estabilidade administrativa.
O governo de Afonso Cláudio não atingiu as metas desejadas pelos capixabas. Faltava-lhe experiência como administrador. A situação econômica era insuficiente até mesmo para atender às despesas com o funcionalismo. O governador apelou para o Ministro da Fazenda, Conselheiro Rui Barbosa, e lhe foi concedido um empréstimo de noventa contos de réis.
Em 09 de setembro de 1890, alegando problemas de saúde, Afonso Cláudio passou o cargo ao terceiro Vice-Presidente, Constante Gomes Sodré.
Esse, por sua vez entregou a direção do Estado ao segundo Vice-Presidente, Tenente-Coronel Henrique da Silva Coutinho, em 20 de novembro de 1890.
Antes de decorridos quatro meses da assunção de exercício desse último, o Dr. Antônio Aguirre foi nomeado governador.
Gestão rápida teve a assinalá-la a Proclamação da Constituição Estadual, em 20 de julho de 1891.
Nesse mesmo mês de julho assumiu o governo o Barão de Monjardim. Foi curta a sua permanência na chefia administrativa do Estado.
Em 18 de dezembro desse mesmo ano, transmitiu o cargo ao Vice-Governador Antônio Aguirre, que o ocupou um dia apenas.
Junta Governativa — Com a ascensão de Floriano Peixoto ao Poder Central, a oposição organizou, no Espírito Santo, uma Junta Governativa constituída pelo Coronel Inácio Henrique de Gouvea, Graciano dos Santos e Galdino Loreto. Essa Junta assumiu o governo em 19 de dezembro de 1891, sem a presença do Vice-Governador Antônio Aguirre, que havia abandonado o Palácio.
Até 02 de maio de 1892, os destinos do Espírito Santo estiveram entregues a essa Junta.
Com a promulgação da Nova Constituição e a eleição, seguida de posse, do Presidente do Estado, Dr. José Carvalho Muniz Freire, em maio de 1892, parecia que a estabilidade administrativa voltara às terras do Espírito Santo.
Graciano Neves (1896-1898) sucedeu a Muniz Freire. Mas não completou o tempo de governo: em 1898 assumiu o substituto legal, Vice-Presidente Constante Gomes Sodré.
Marcelino Pessoa de Vasconcelos fechou o século comandando os destinos do Espírito Santo.
Enfrentando toda uma série de dificuldades, o Espírito Santo chegou vitorioso ao final do século XIX. Com a Independência do Brasil, e passado o tempo tumultuado de transição, houve a preocupação de atender às exigências sociais do homem.
Os direitos do cidadão foram assegurados por uma Constituição. A cidadania, o júri, o privilégio de escolher os conselheiros de seu governo passaram a fazer parte da vida capixaba.
A construção de estradas tornou-se preocupação crescente. Em 1886, foi iniciada a primeira estrada de ferro, inaugurada em 16 de setembro de 1887, ligando Cachoeiro de Itapemirim e Rive, e Coutinho e Castelo. Pontes foram construídas ou restauradas; a saúde do povo mereceu especiais cuidados.
Os índios eram, então, assistidos oficialmente. Os colonos europeus que, desde o meado do século, chegavam em grandes levas, contribuíram para o progresso demográfico e econômico do Estado (próximo fascículo). A população era de 60.702 habitantes em 1862. Chegou, em 1890, a 209.783 habitantes. No campo econômico, a produção de café foi, de fato, a mola propulsora do desenvolvimento. Apontam os registros: em 1860, 50.529 sacas; em 1890. 250.000; em 1900, 394.150!
Fonte: Jornal A Gazeta, A Saga do Espírito Santo – Das Caravelas ao século XXI – 23/09/1999
Pesquisa e texto: Neida Lúcia Moraes
Edição e revisão: José Irmo Goring
Projeto Gráfico: Edson Maltez Heringer
Diagramação: Sebastião Vargas
Supervisão de arte: Ivan Alves
Ilustrações: Genildo Ronchi
Digitação: Joana D’Arc Cruz
Compilação: Walter de Aguiar Filho, junho/2016
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