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Florentino Avidos

Caixão da Ponte Florentino Avidos

O povo tem qualquer coisa de feminino nas suas opiniões e no seu modo de apreciar uns tantos fatos da vida social. Quando cria um ídolo é inútil querer-se substituí-lo ou associá-lo a outro. O povo namora e ama certo símbolo, assim como a mulher namora e ama certo homem, desconhecendo-lhe todos os defeitos em benefício de uma só virtude. Nem a viuvez, em muitos casos, substitui o herói feliz. A lembrança do eleito se enraíza na imaginação da sobrevivente, sem que nenhuma outra personagem se lhe afeiçoe. Jerônimo Monteiro gozou desse privilégio raro. Tornou-se legenda, que cresce com o tempo na imaginação do povo.

Florentino Avidos foi homem de méritos excepcionais, como administrador e amigo da cidade. Trabalhou e muito na elevação cultural e material do povo. Rasgou horizontes novos à economia do Estado mas sua lembrança vai se apagando numa velocidade estonteante. A tabuleta, que encima o pórtico da ponte, que une a ilha ao continente, parece alta de mais para ser lida. Seu colorido se esfuma na cor das vigas, de tal modo que já não a pode ler, com a velocidade cada vez maior com que se trafega sobre a Baía de Vitória.

O governo de tantas realizações, vai se apagando cada vez mais na memória do povo ingrato, que lhes recebeu benefícios.

O engenheiro Florentino Avidos ascendeu ao governo do Espírito Santo debaixo da maior expectativa popular. Seu nome polarizou as três correntes da política estadual: Jeronimistas, Bernardinistas e Pinheiristas. Os irmãos Monteiro se haviam extremecido seriamente, quando da escolha do nome a suceder a Bernardino Monteiro.

Nestor Gomes, pomo da discórdia, teve a inteligência e o bom senso de devolver a política do Estado à família Monteiro, sem que houvesse perturbação da paz. Florentino Avidos, estranho às políticas da família, exercia suas atividades no Ministério da Agricultura, fora do Estado, quando foi requisitado para dirigir os “Serviços de Melhoramentos de Vitória”. Era alheio aos negócios do Espírito Santo e, praticamente, afastado da influência política de seus cunhados. Teve, portanto, independência absoluta para governar acima dos partidos. E governou.

O homem forte em seu governo foi o jovem e malogrado engenheiro Moacyr Avidos, filho mais velho do Presidente, com três anos de diploma e oito de estudos meticulosos e pacientes, assistidos pela bela inteligência que emoldurava a personalidade marcante.

Idealista, modesto, trabalhador, colega exemplar, foi modelo de dedicação e amor a sua terra. Ocupou a Secretaria de Agricultura, Terras e Obras e Viação, acumulando as funções chaves dos departamentos técnicos, como o “Serviço de Melhoramentos de Vitória” e as “Obras do Porto”.

Não se envaideceu com tantas honrarias, conquistadas aos vinte e cinco anos de idade. Reuniu uma equipe de jovens engenheiros, apelidados de “jardim de infância” e, com ela, dividiu os pesadíssimos encargos, duplamente onerosos, de pessoa de confiança e filho do Presidente do Estado. Foi seguramente a fase áurea, até então da engenharia moça no Estado: Augusto Barata, Clovis Macedo Côrtes, Francisco Menescal, Sebastião Fragelli, Alvim Schimmelpfeng e o grande Secretário Álvaro Matos, só para citar os chefes da divisão. Eram quase todos estreantes, porém animados do mais vivo interesse de acertar. E acertaram e trabalharam mais do que Hércules da Mitologia grega.

Trabalharam com a angústia de realizar. Não tiveram honrarias. Não fizeram fortuna. Ocuparam postos para os dignificar com o trabalho sadio de moços idealistas.

Florentino Avidos foi também grande crítico das condições urbanas de Vitória. Não se limitou, contudo, a chorar nos muros de Jerusalém, como fizeram os governadores da era monárquica e alguns presidentes da primeira república.

Leiam-se as páginas da “Mensagem Final” do seu governo poliédrico em que, num estilo sincero e desataviado,relata os defeitos da ilha, três vezes e meia centenária.

“As longas crises que advieram, após a administração de 1908 a 1912, não permitiram a construção de obras necessárias para o desenvolvimento de nossa Capital e nem ao menos, a regular conservação dos grandes serviços de abastecimento de água, esgoto, eletricidade e viação urbana.”

“Ruas apertadas, ladeadas de velhos prédios, ameaçando desabamento, calçadas em geral com alvenaria de pedras secas roliças, sem drenagem, com serviço de água e esgotos, defeituosos em grande parte, com freqüentes interrupções, quase todos precisando de completa reforma; eis a situação encontrada. Salvo algumas ruas do bairro do Parque Moscoso, em toda a cidade havia falta de calçamento e de drenagem de águas pluviais.”

“Ruas como a Sete de Setembro, eram completamente alagadas com qualquer aguaceiro, pondo em sobressalto os moradores. Não havia calçamento de espécie alguma para os bairros próximos, nem como se expandir a cidade pela falta de estradas de rodagem.”

“A viação era embaraçada pela estreiteza das ruas principais, que não permitindo linha dupla, de bondes, obrigava os passageiros a penosa demora nos cruzamentos. Este mal, se bem que ainda não corrigido completamente, se acha muito diminuído.”

“Por outro lado, era de zig-zag o serviço de bondes por falta de espaço para fazer a curva. Mister se tornava que a nossa cidade proporcionasse certo conforto, para que as fortunas aqui adquiridas fossem desfrutadas por seus possuidores, sem necessidade de buscar outras localidades a desejada comodidade.”

“Pela falta de calçamento das ruas, não havia senão 4 ou 5 automóveis, número que hoje se eleva a mais de 300, tornando mais apreciáveis os passeios, mais fácil a vida comercial e o trânsito em geral e dando mais movimento à capital.”

“Assumindo a administração, mantive o mesmo plano de melhoramentos e dei forte incremento aos trabalhos, fazendo, para eles, convergir o melhor dos meus esforços, no intuito de terminar, quanto antes, o incômodo período de demolições e construções.”

“Procurando atenuar tais incômodos, sem agravar a escassez de habitações, executei, simultaneamente, as demolições, a parte do contrato de 1º de setembro de 1922, em que o Estado se comprometeu a fazer casas para funcionários e operários.”

“Foi muito maior o número das construções novas do que o das velhas casas demolidas.”

“O plano geral de melhoramentos visou não somente à ampliação da cidade, com a criação de vários bairros e as obras de salubridade, como também, a trabalhos de embelezamento e conforto, que viessem dar à cidade aspecto compatível com sua beleza natural.”

“Ficou formado, desde 1924, o bairro de Jucutuquara; tornando-se mais acessíveis os de Praia Comprida, Suá, Bomba, Maruípe, Ilha de Santa Maria e Santo Antônio.”

“Adquiridas as chácaras Moniz Freire e Mulundum, e reunidas à nova Rua da Várzea, vieram constituir um agrupamento de ruas.”

“Em benefício da salubridade, demoli velhas casas detestáveis, construí serviços de esgotos, remodelei e ampliei o serviço de água e melhorei o dos esgotos pluviais. Alarguei e calcei várias ruas, fazendo escadarias, corrigi alinhamentos extravagantes, dando realce a novas fachadas e aspecto elegante à nossa praia, com ruas de contorno e construção de edifícios públicos modernos, que vão mencionados no decorrer deste relatório . . .”

Picaretas, pás e enxadas foram empunhadas por milhares de trabalhadores. Pardieiros, entulhos, matacões, maciço de terra, velhos alicerces foram resolvidos. A mão de obra rareava. Agenciadores, nos portos do Norte, recrutavam famílias inteiras em legiões de centenas e centenas de operários. Vitória se tornou verdadeira Babel.

O governo indenizou o lucro cessante das casas de comércio, recuadas ou avançadas no período das obras. O tempo de execução era fator importante. O autor desta notícia, de maio a dezembro de 1924, trabalhou dia e noite no recuo da Rua Jerônimo Monteiro, da esquina da Ladeira da Misericórdia à Praça 8 de Setembro. Viu-se verdadeira parada de material e mão de obra à luz de gambiarras feericamente iluminadas.

 

Fonte: Biografia de uma ilha, Rio de Janeiro, Editora Pongetti, 1965.
Autor: Luiz Serafim Derenzi
Compilação: Walter de Aguiar Filho, setembro/2004



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