Segunda metade do Século XVII – Por Mário Freire
No início da segunda metade do século XVII tomou posse, na Bahia, o conde de Castelo Melhor, novo Governador Geral. Revelou tantas e tão grandes preocupações militares, para maior defesa da colônia, que embora o, governo do sucessor, o conde de Atouguia, houvesse tido cuidados idênticos, conforme se lê, por exemplo, nos seus dois conhecidos regimentos para novos Capitães-mores do Espírito Santo, este seguido período ficou assinalado mais como "sertanista".
Durante o primeiro, foram logo requisitados 20 soldados para esta Capitania; cuidou-se também, para melhor defesa de Vitória, de fortificar uma laje próxima: contra as invasões dessa época a vila estava guardada pela "cadeia da barra". Projetou-se, todavia, uma nova tentativa às esmeraldas, em Maio de 1652.
Um modesto "correio" transitava por terra, entre Vitória e a Bahia, sede do governo geral, embora Saint-Hilaire, em 1818, tivesse julgado intransponíveis, antes do estabelecimento dos célebres "quartéis" ou postos militares do século passado, as dificuldades que observou na região do rio Doce.
Os jesuítas, cuja rivalidade com os franciscanos era indisfarçável, tentaram apossar-se judicialmente do Santuário da Penha. Mantido o direito dos franciscanos, estes, na Junta de 1650, reunida na Bahia, aprovaram um projeto de Fr. Sebastião do Espírito Santo, para anexar ao templo um convento com onze celas. A obra logo iniciada, demorou oito anos. Durante a construção os holandeses assaltaram e saquearam o Santuário. Constitui um anacronismo a conhecida tela que representa uma anterior invasão, frustrada, vendo-se ao alto já o convento.
Ao findar o ano de 1653, o Rei outorgou uma "ordinária", isto é, um auxílio anual de uma pipa de vinho, um quarto de azeite, outro de farinha do Reino e duas arrobas de cera, para o convento de N. S. da Penha, um dos que haviam sido "fabricados" de novo, ou recentemente, no dizer da respectiva resolução.
Duas importantes questões agitaram, a esse tempo, a administração.
O tráfico e o comércio com as colônias espanholas do sul, facilitado e favorecido ao tempo em que o Brasil estivera sujeito ao mesmo domínio, introduzira grande quantidade de moedas de prata do Peru. Proibido esse comércio depois da Restauração de Portugal, as moedas dos "peruleiros", geralmente de prata, foram contra marcadas, do que resultou grande vantagem para a Fazenda Real, beneficiada com a diferença do valor. Antes que, por último, fosse vedada a circulação dos patacos peruanos, apareceram falsas, no Espírito Santo, numerosas dessas moedas. Preso um estrangeiro acusado por esse crime, mandado para a Bahia, foi julgado e punido.
Vindo de Buenos Aires, carregado de courama, entrou em Vitória um patacho com uma carta de prego para o Rei de Castela. Apreendido e também encaminhado para a sede do governo geral, não obstante a régia proibição de qualquer comércio com estrangeiros, poude a tripulação, entretanto, depois de ouvidos os prelados, ministros e Câmara, negociar largamente...
Vitória crescia e os Capitães-mores já procuravam fortificar o que se denominava "a praia", o centro comercial de nossos dias.
Desde 1643, os donatários nenhum interesse demonstraram pela Capitania. Somente em 1656, D. Felipa de Menezes, mãe e tutora de Antônio Luiz Coutinho da Câmara como figura o nome na patente, propôs, e o Rei nomeou, Capitão-mór. Empossado, mostrou-se apreensivo com a inquietação em que veio encontrar a vila pela "descompostura" dos oficiais da Câmara e de outras pessoas, entre as quais o próprio Ouvidor.
Por ocasião da eleição de Vereadores, prevenido e apaixonado, suspendeu o Provedor, e chegou mesmo a afastar o Ouvidor, do cargo. Por isso o Governador Geral advertiu-o, bem como à Câmara. Nesta, como em outras Capitanias, os Ouvidores, por vezes, sofreram violências, algumas muito graves. Os Capitães-mores não trepidavam em contrariar o que as Ordenações dispunham a respeito dessas altas autoridades. No Espírito Santo, não foi essa a única violência cometida contra a Ouvidoria. Ao tempo de Atouguia, houve um Ouvidor suspenso também pelo Capitão-mór, porque desobedecera a um "mando", a espalhafatosa forma de divulgação dos éditos baixados pelos governos daqueles dias.
Essas autoridades, parece, não se limitavam a intervir somente nas matérias de suas difíceis funções. Em 1651, o do Espírito Santo pretendia também chefiar uma "jornada" ao sertão. Não lhe foi permitido fazê-lo porque, autorizados pelo próprio Rei, os famosos capitães Domingos e Antônio de Azeredo aguardavam apenas o fim de abril ou o começo de maio do próximo ano, como a época mais propícia para tais expedições.
Fonte: A Capitania do Espírito Santo, ano 1945
Autor: Mário Aristides Freire
Compilação: Walter de Aguiar Filho/ maio/2015
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