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Vitória Colonial – Por Mário Freire

Convento do Carmo, 1860

Vitória, no dizer dos que a visitaram pouco antes da Independência, era uma vila mais de quatro mil habitantes, graciosa, limpa e bonita, com alguns edifícios bons, no velho estilo ou gosto português, dotados de balcões ou rótulas de madeira; muitos de dois pavimentos ostentavam vidraças e varandas trabalhadas na Europa. Rubim, acentua o filho, muito se esforçara pela supressão dos "caixões", que afeiavam os prédios. A Casa da Câmara, ao fundo do atual edifício do Fórum, onde em 1889 foi ainda empossado o primeiro Governador republicano, pareceu ao Príncipe de Neuwied razoavelmente grande.

Ruas estreitas e mal calçadas. Além da pequena praça, fronteira ao Palácio do Governo, Saint-Hilaire não viu outra, pois assim não considerou a "encruzilhada" enlameada, em frente à igreja de N. S S. da Conceição da Prainha moderna Praça da Independência. Subia-se para o Palácio, por uma escadaria ladeada de palmeiras e de árvores copadas.

Aportava-se com facilidade, em escaleres ou canoas, nos pontos onde as casas não avançavam até a baía, o que fez Saint-Hilaire afirmar a inexistência de cais, quando a informação de Rubim, ao contrário, enumera seis: — O Cais Novo das Colunas, abaixo do antigo Colégio dos Jesuítas, sede do governo; o Cais Grande, onde até sumacas atracavam: o dos antigos jesuítas, vulgarmente denominado "dos Padres"; além dos pequenos: — do Batalha, Santíssimo e Azambuja . Não aludiu ao de S. Francisco.

A Fonte Grande assim como as da Lapa e Capixaba abasteciam a população: modestas e sem arte, observa Saint-Hilaire, forneciam excelente água.

Quando enumera as igrejas, o cientista achou os conventos de S. Francisco e do Carmo quase fora da Vila: o pavimento térreo do segundo já estava ocupado por soldados pedestres.

Além de uma aula régia de Latim, funcionava uma de primeiras letras, sendo o ensino primário ministrado apenas por dois ou três mestres.

Rubim encareceu a Força Militar. Duas fortalezas — a de S. João, com 3 baterias; e a do Carmo, no local onde se ergue o Hotel-Sagres (Edifício-Mansur) . Nesta encontrou aquarteladas 116 praças. E estendeu-se na descrição dos Corpos da tropa, seus regimentos e companhias. Neuwied faz supor mais um forte acima do de S. João, na colina. Esclareceu ainda que o forte do Carmo tinha 17 canhões, alguns de bronze; e o primeiro apenas 8. Os "pedestres", que não pertenciam à tropa de linha, percebiam 80 réis por dia, sem sustento, além de quatro mil réis, por ano, para fardamento que, entretanto, haviam deixado de usar.

Continuava funcionando um Hospital Real Militar. Na ilha do Príncipe ficava o depósito de pólvora.

Durante a curta permanência no Espírito Santo, duas vezes Neuwied recebeu correspondência trazida do Rio pelo correio terrestre; não ia, entretanto, além de Vitória.

Na exportação de cabotagem, por este porto, predominavam milho, arroz, feijão, algodão, açúcar, farinha e madeira. Saint-Hilaire veiculou ainda uma acusação contra o Governador Tovar, ao explicar a ausência de exportação para Portugal. Registrou o preço, no interior, de alguns produtos; e forneceu, ao mesmo tempo, a equivalência em francos: assim, o alqueire de feijão custava em Aldeia-Velha, hoje (Aracruz), como em Benevente, cinco patacas, isto é, 10 francos, a arroba de algodão 3 patacas; a quarta de farinha, medida diferente da do Rio e correspondente a dez litros, dois tostões; e o alqueire, até três patacas. Em Benevente vira pedir duas patacas, por alqueire de arroz em casca, e o mesmo preço pelo de milho.

Em vereança realizada no penúltimo ano do governo de Rubim, na qual a Câmara resolveu doar à Santa Casa um mangal, no Porto dos Padres, para uma ponte e aterro a fim de se construírem casas que proporcionassem renda para manutenção do hospital, ficou também registrada a preocupação de regular o comércio ambulante pois estavam sendo vendidos, em tabuleiros, vidro, louça, queijo, biscoito, tudo sem licença. Os ambulantes deviam pagar, anualmente, quatro mil reis. Os negociantes estabelecidos ou com porta aberta, para venda dos mesmos artigos, pagavam 12$800 por ano. A Câmara resolveu impor, aos infratores, a multa de 6$000.

No último ano do governo de Rubim, o conselheiro Velozo de Oliveira, sugerindo uma nova divisão dos bispados do Brasil, propôs o estabelecimento de um em Vitória — "capital dos Campos de Goitacases e Capitania do Espírito Santo". A côngrua dos bispos era, naquele tempo, de 2:400$000 anuais. Muito mais custava a manutenção de um regimento; e um bispo, salientava, era mais necessário que um Ouvidor ou um regimento. O autor da conhecida memória "A Igreja do Brasil" reconhecida ainda pequenos muitos dos lugares, que indicava, para sede e habitação dos novos bispos; acrescentava entretanto: — "é grande o número de habitantes, e os bispos não são destinados às pompas das cidades, mas para educação dos povos onde existem"...

Neuwied não teve dúvida em afirmar a fazenda de Araçatiba, onde viu quatrocentos escravos trabalhando, com um grande prédio de dois pavimentos, igreja, engenho, casas de trabalho e acomodação para os trabalhadores, a maior das que lhe fora dado admirar. Outra muito próspera, nas redondezas de Vitória, era a de Coroaba, para o lado de Viana. Em Pedra d'Agua havia uma casa solitária: em frente ficavam as fazendas do Romão e do Capitão-mór Francisco Pinto Homem de Azevedo; e, nesta, a casa onde ele, como Saint-Hilaire, também esteve, o histórico solar Monjardim, Ultimamente restaurado pelo Serviço de Patrimônio Histórico e Artístico Nacional.

 

Fonte: A Capitania do Espírito Santo, ano 1945
Autor: Mário Aristides Freire
Compilação: Walter de Aguiar Filho, junho/2015

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